Que 2014 vai ser um ano atípico para o mercado publicitário brasileiro é notícia antiga. Entretanto, as variações na demanda pela compra de mídia e mesmo pelo trabalho das agências ainda são nebulosas, já que essa temporada deve ter flutuações também nos períodos de pico de lançamento e veiculação de campanhas.
De modo geral, o pensamento predominante no mercado é de que os patrocinadores da Copa do Mundo e de sua transmissão pela TV devem incrementar consideravelmente a verba destinada a publicidade, especialmente no período de junho e julho, que é de fato quando ocorre o Mundial da Fifa. No entanto, as companhias que não possuem propriedades ou parceria em nenhuma das frentes possivelmente irão olhar as oportunidades de investimento com mais cautela.
“Os anunciantes não patrocinadores da Copa devem puxar o freio de mão o ano todo, uma vez que não devem conseguir atenção”, explica Clarisse Setyon, coordenadora do núcleo de Estudos e Negócios do Esporte e do MBA de Marketing Esportivo da ESPM (SP). A especialista também reitera que esse fenômeno deve inflacionar os preços para a compra de mídia. “A Globo [detentora dos direitos de transmissão da Copa] e os demais veículos, sabendo disso, tendem a compensar a falta de anunciantes puxando para cima a tabela de preço para os patrocinadores”, diz.
De acordo com estimativas do mercado, a Globo irá faturar US$ 600 milhões no total de seu pacote para a Copa do Mundo. Especulando uma divisão igualitária entre os oito cotistas da transmissão (Ambev, Coca-Cola, Itaú, Johnson & Johnson, Hyundai e Oi), chegamos ao valor de US$ 75 milhões por anunciante, pelo período de um mês entre junho e julho. “Depois disso, vai ser a ‘ressaca’ de sempre. Deve haver um desembolso maior durante a época, e a tendência é que o consumidor retraia gastos nos meses seguintes e depois volte aos padrões normais”, comenta Clarisse.
Pela ótica das agências, a perspectiva deve mesmo se confirmar. “Esse ano devemos inverter o fluxo normal de investimentos, que é de 55% a 60% no segundo semestre e 45% a 40% no primeiro. Além da Copa, outra coisa que altera o cronograma são as eleições, mas este semestre deve ter muita concentração de investimentos”, diz Paulo Stephan, diretor-geral de mídia da Talent. Entretanto, Stephan não crê que os anunciantes não ligados ao evento irão “tirar o pé”, mas sim mudar de estratégia. “Não devemos ter redução em função da Copa ou da concorrência (anunciar na transmissão), as marcas estão seguindo normalmente. Os que não são ligados ao Mundial fogem do período (junho/julho), mas mudam o plano de trabalho”, explica.
Momento
Sobre o investimento de marcas estrangeiras no Brasil, Clarisse Setyon acredita que não era apenas a proximidade de um grande evento esportivo que estava animando os anunciantes. “Acho que o fato do país ser a ‘bola da vez’ não está atrelado à Copa e à Olimpíada, tinha mais a ver com o momento econômico, a estabilidade política, o crescimento das classes C e D”, diz Clarisse, que também acredita que a expectativa brasileira de faturamento pré-Copa estava incorreta. “É interessante lembrar das previsões e ver que elas estavam totalmente superestimadas. Hoje estamos cada vez mais com os pés no chão e cada vez menos com a ideia de que vamos explodir o PIB. Não vamos ter três milhões de turistas, se houver 500 mil já está ótimo. Acho que essa retomada de consciência é central”.
Ainda assim, haverá investimento estrangeiro. A Coca-Cola comunicou que investirá R$ 14,1 bilhões entre 2012 e 2016. Pela perspectiva de anunciantes e parceiros da Copa, o torneio em solo nacional é uma oportunidade única. “Houve um aumento em todos os sentidos no custo para os patrocinadores, uma ‘inflação worldcupiana’. Mas é normal acontecer isso, devido ao momento único e histórico no Brasil. Quando teremos de novo uma Copa do Mundo aqui?”, analisa Mariana Nadruz, diretora de marketing da Visa no Brasil. “Então é um pouco esperado que esse aumento aconteça, e acho que todo mundo estava se preparando, com incremento de budget”.
Mariana também crê que os maiores esforços em publicidade devem ocorrer entre junho e julho, durante o período da Copa do Mundo, mas não atrela diretamente esse incremento apenas a verba de mídia. “Na Copa da África do Sul, tivemos um aumento de 82% em gasto com Visa, e não necessariamente colocamos um caminhão de dinheiro em mídia. Vai muito da estratégia do anunciante, da criação e de um insight verdadeiro”, comenta. A própria rede de cartões “virou” a campanha para o Mundial durante o sorteio, onde veiculou peças com alusão ao futebol e tendo Paolo Rossi e Zinedine Zidane como protagonistas. Além da Visa, os outros patrocinadores do Mundial (e muitas marcas que não possuem direitos, apesar das restrições da Fifa) irão apostar em estratégias criativas vinculadas ao futebol e à brasilidade.