Torres: é uma cadeira de alta responsabilidade

 

“O jornalismo me ensinou a ver o mundo. A publicidade me ensinou a contar isso rapidinho. E ambos foram o campo de treinamento para a literatura.” A frase é do escritor e redator Antonio Torres, baiano, autor de 17 livros, que acaba de ingressar na Academia Brasileira de Letras e ocupa a cadeira 23, que foi de Machado de Assis, Jorge Amado e Zélia Gattai. É a primeira vez nos últimos 10 anos que a Academia escolhe um escritor de ficção. “É tudo de bom para um escritor brasileiro ocupar uma cadeira que foi de Machado de Assis, Jorge Amado, Zélia Gattai, todos narradores muito fortes. É uma cadeira de alta responsabilidade”, diz.

Torres tem orgulho de sua longa carreira na publicidade: trabalhou nela 35 anos. Queria ser poeta, depois escritor, e ingressou no jornalismo porque acreditava ser um atalho. Destacou-se aos 20 e poucos anos pelas matérias “com bossa” que escrevia para o jornal Última Hora. Foi convidado para ser redator da agência Interamericana em 1963, antes mesmo da agência ser adquirida por Mauro Salles – por sinal, imortal como Torres. O primeiro job foi para vender assinaturas do jornal O Estado de S.Paulo. “Foi mamão com açúcar para mim”, relembra.

De fato, a campanha ganhou prêmios e rapidamente Torres já era um redator consagrado. Trabalhou no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Portugal. Passou pela Lintas, Almap (no Rio e em São Paulo), Norton, Denison, Salles, Standard, Giovanni, Publinews. Em Portugal trabalhou entre 1965 e 1968 nas agências Exito e Pali. Os primeiros dois livros, “Um cão uivando para a lua” e “Os homens dos pés redondos”, foram lançados enquanto ele trabalhava na Almap, entre 1972 e 1973. Ele lembra que Alex Periscinoto “curtia muito” ter um escritor na sua equipe de criação.

Famosa

A terceira obra – e a mais famosa –, “Essa terra”, foi lançada em 1976, quando Torres estava na Standard, Ogilvy & Mather. O quarto romance, a “Carta ao bispo”, veio em 1979, nos tempos da Denison Rio, onde ainda estava ao lançar o quinto, “Adeus, velho”. “Balada da infância perdida” foi lançado em 1986, quando Torres era redator da Salles e, finalmente, quando colocou nas livrarias “Um táxi para Viena D’Áustria”, ele estava desempregado.

A história de como ficou desempregado é, por sinal, curiosa. “Táxi” era sobre um redator desempregado e, para dar veracidade a seu romance, Torres pediu para ser demitido da Giovanni. “Adilson Xavier concordou com meu pedido e fui então demitido. Mas o problema é que tudo o que eu juntei de dinheiro para levar adiante meu plano de ficar dois anos sem trabalhar foi confiscado pelo ‘Plano Collor’. Fiquei arrasado”, relembra Torres.

O romance tornou-se, então, real demais. O livro foi um sucesso, mas ele acabou retornando à publicidade: tornou-se diretor de criação da Publinews, onde permaneceu por sete anos. Lá estava ao escrever “O centro das nossas desatenções” e “O cachorro e o lobo” – este último o primeiro pela editora Record, que decidiu concentrar toda a sua obra – destacada em 2000 com o “Prêmio Machado de Assis”.

Do nono romance para frente, “O circo no Brasil” (1998), Torres já não estava mais na publicidade. Apesar das propostas recebidas na época, ele não quis disputar cargos com jovens talentos. Decidiu ser escritor em tempo integral. Escreveu ainda “Meninos eu conto” (2000), “Meu querido canibal” (2000), “O nobre sequestrador” (2003), “Pelo fundo da agulha” (2006), o livro infantil “Minu, o gato azul” (2007) e uma coletânea de crônicas, perfis e memórias “Sobre pessoas”. Diz estar “pelejando” em torno de um romance há três anos. Não sabe quando vai terminar. “O romance vem sofrendo muitas interrupções, e há uma certa pressão da editora para que eu o termine, mas não tenho previsão”.