D’Andrea: vender em cima de uma essência de marca já construída

Os publicitários Alexandre Gama, CEO da Neogama/BBH e CCO global da BBH, e Mario D’Andrea, presidente da Dentsu Brasil, participaram na tarde desta segunda-feira (17) do Fórum Direções, encontro promovido pela revista Quadro Rodas, da Abril, em São Paulo.

No evento que também reuniu importantes figuras da indústria automobolística, como Jörg Hofmann, presidente e CEO da Audi Brasil, os dois profissionais, criativos por formação, abordaram o tema “Como falar de carros”, dando uma perspectiva sobre os desafios que as agências e montadoras possuem em um mercado pautado pela transformação. Ambos possuem contas do setor em suas agências. A Neogama, da Renault, enquanto a Dentsu cuida da comunicação da Toyota.

Mediado por Alexandre Caldini, presidente da Abril, o debate começou com D’Andrea lembrando a importância da construção de marca neste mercado, ainda mais em tempos de recessão econômica. “Quando estamos em crise, aquela gordura adquirida lá atrás é que irá fazer sua marca continuar forte mesmo com queda de vendas e chegada de concorrentes, que é o que ocorreu neste setor nos últimos tempos”, diz.

Já para Gama, a palavra crise é algo que faz parte do dia-a-dia do brasileiro há muitos anos. “É por isso que, ao contrário dos países mais desenvolvidos, nossa comunicação é mais tática e menos estratégica”, ressalta.

Para ele, o trabalho de comunicação de uma montadora deveria ser visto como o de uma força aérea dentro de um exército. Ela abre espaço e ajuda a infantaria, que está lá embaixo. Temos que fortalecer a marca para depois ajudar o varejo, que é a infantaria, a vender”, diz. “O problema é quando o varejo quer se sobressair na base do grito, do preço”, afirma.

“Se conseguirmos vender em cima de um pilar já construído, seguindo a essência da marca, aí sim o varejo terá sentido”, completa D’Andrea.

O CEO da Neogama lembra que a ruptura nunca foi tão grande neste mercado. A geração anterior à atual tinha o carro como objeto de desejo, e era preciso tê-lo para encontrar sua “rede social”, os amigos. Hoje, segundo ele, isso não é mais preciso, pois este encontro é feito na internet. “Eu sou um apaixonado por carro, pela tecnologia embarcada nos produtos e pelo próprio poder de locomoção e liberdade que ele te dá. A atual geração não vê mais esta necessidade. A indústria automobilística compete hoje não apenas entre si, mas sim com a mudança de hábito do consumidor”, diz. “Fora que a política pública agora parece que é trocar quatro por dois. Tirar o carro da rua para colocar a bicicleta. É bacana, mas parece que está sendo levado muito a sério e sem tanto critério”, questiona.

D’Andrea, na mesma linha de seu companheiro de profissão, diz que não consegue entender com os jovens de hoje se encantam com a tecnologia embarcada em um tênis, e não em um carro. “A indústria de artigos esportivos consegue fazer os novos consumidores ficar horas à frente de uma vitrine”.

Para ele, o segredo das agências e das montadoras é conseguir tirar do consumidor aquilo que ele não fala. “O cara compra um carro por motivo emocional, mesmo que dê diversas desculpas racionais para ter adquirido o modelo que sempre quis. Tá cheio de gente que compra Hilux (picape da Toyota) para andar em São Paulo e não sua o maior atributo do modelo, que é o 4×4. E este consumidor não vai admitir nunca que comprou uma Hilux por estar sentado em um carro grande, que dá sensação de status e poder. Inventa os tais motivos racionais, mesmo não existindo nenhum”, brinca.

O presidente da Dentsu também lembra que hoje é dever das montadoras saber o que os consumidores querem. Até porque eles vão a uma concessionário sabendo qual modelo comprar. Vão lá para negociar preço, ganhar um acessório, pois já pesquisaram antes sobre o veículo. “Ele chega no ponto-de-venda sabendo mais que o vendedor. E ele quer conforto, pois hoje passa muito mais tempo dentro de um carro, no trânsito. Não falo de conforto como luxo, mas sim praticidade. Tanto que hoje muitos modelos de entrada tem atributos que antes só os carros de luxo tinham”.

Gama diz que nos últimos 10, 15 anos, o papel das agências na comunicação de automóveis pode ter mudado, mas a essência é a mesma. “Existe uma equação humana, que está em nosso cérebro, que nunca mudou. Que pela ordem segue os atributos ‘sentir, pensar e agir’. Toda ação do consumidor segue esta linha. E passando isso para os carros, o sentir seria o design, que é o primeiro contato com o produto; o pensar envolve vários atributos, inclusive a área de engenharia, já que a conectividade do carro com o motorista é cada vez maior; e o agir é o varejo”, compara. “Se agência e anunciantes seguirem esta linha, a comunicação dá certo”, diz.

“Nossa vida ficou mais complicada porque não trabalhamos mais por ‘gavetinhas’. Antes fazíamos duas ou três peças e fazíamos mídia de massa com insistência. Neste mundo pós-digital, você não sabe mais quando o consumidor quer ser analógico ou digital. Temos que pegá-lo no momento oportuno”, conclui D’Andrea.