Quem assistiu, durante o Cannes Lions 2011, à participação de James Murdoch, vice-diretor operacional da News Corporation, do tradicional debate liderado por Sir Martin Sorrell, presidente do Grupo WPP, não sonharia que a reputação de seu pai, o mais poderoso dono de mídia da Grã-Bretanha, Rupert Murdoch, entraria numa linha descendente e que, a essa altura, não se sabe onde irá parar, pois já envolve a polícia federal norte-americana (FBI). O magnata da mídia e seu filho James, de 38 anos, terão de depor esta semana no Parlamento Britânico e terão os grampos de seu – agora extinto – tabloide britânico News of the World investigados pelo FBI. Os escândalos envolvendo a conduta ética do News of the World levaram Murdoch a desistir, recentemente, da aquisição do controle total da British Sky Broadcasting Group PLC.

Os ventos políticos – mais próximos de um verdadeiro tornado – influenciaram a decisão de não fechar o negócio com a BSkyB, da qual já detém 39,1% e vem a ser a maior rede de TV por assinaturas do Reino Unido, com 10 milhões de clientes. Ela foi formada nos anos 90 após a fusão da Sky Television, de Murdoch, com a British Satelite Broadcasting, consórcio formado por empresas de mídia do Reino Unido. O negócio seria fechado, especula-se, por cerca de US$ 12 bilhões. Era James Murdoch, que é presidente do conselho da BSkyB, quem vinha negociando a compra.

Ele, seu pai e Chase Carey, diretor operacional da News Corporation, decidiram abandonar a oferta pela BSkyB numa reunião em Londres, com medo que respingos negativos do processo criminal contra o centenário News of the World se abatessem sobre seu promissor negócio de TV via satélite. O movimento de aquisição do restante da BSkyB era estratégico pois representaria a posse majoritária do mercado de TV comercial na sexta maior economia do mundo. O investimento seria, também, uma resposta às quedas de faturamento dos jornais da empresa. Comenta-se que, a partir de agora, a News Corp deve repensar seu núcleo de jornais, especialmente no Reino Unido.

Durante o debate, em Cannes, James Murdoch comemorava o sucesso de seu jornal digital The Times, bem como a força da edição digital do Wall Street Journal. Mas, perto dos grandiosos números do conglomerado Murdoch, os jornais digitais ainda representam uma fatia muito pequena do negócio – menos de 20% das empresas do conglomerado de Murdoch no Reino Unido. Especula-se que a News Corporation estaria disposta a vender seus demais títulos no Reino Unido: o The Sun, o Times e sua edição dominical Sunday Times. Embora não representem grande fonte de receita, os jornais permanecem como plataformas influentes nos Estados Unidos e no Reino Unido.

Enquanto isso, a reputação de Murdoch torna-se cada vez mais frágil – e é claro que seus concorrentes estão tendo um forte papel nesse sentido. O Daily Telegraph, por exemplo, ajuda a promover um boicote a Murdoch no Twitter, o #BoycottMurdoch, que tornou-se popular na Inglaterra, nos Estados Unidos, na Suécia, na África do Sul e na Austrália. Já no Facebook, a página com o mesmo nome aparecia com 8.900 fãs até o fechamento desta reportagem. O escândalo em torno do News of the World, por sua vez, tem bombado no Twitter com vários hashtags diferentes. A ONG avaaz.org vem fazendo uma forte campanha contra Murdoch e sua atuação teria ajudado a fazer com que o executivo desistisse do restante da BskyB, segundo comenta a imprensa britânica.

É uma verdadeira caça às bruxas que desencavou diversos crimes e escândalos que levaram o premier David Cameron a solicitar que Murdoch comparecesse ao Parlamento para testemunhar. Ele e seu filho James testemunharão diante de uma comissão do Parlamento Britânico que investiga as acusações de grampos telefônicos e corrupção. Já o FBI entra na investigação para apurar suspeitas de que o grupo de mídia violou o sigilo telefônico de vítimas do 11 de setembro.

News Corporation é o segundo maior do mundo

A News Corporation é o segundo maior conglomerado de mídia do mundo, atrás apenas da The Walt Disney Company – e também o segundo maior no mundo no ramo de entretenimento. Seus principais lucros vêm dos Estados Unidos e do Reino Unido, onde tem como subsidiária a News International. Atua também na Austrália, Itália, Índia e Nova Zelândia. No Brasil, os estúdios Fox, do grupo, fazem parte do grupo de empresas de cinema que detém 50% da rede Telecine. O restante pertence às Organizações Globo.

O negócio de TV a cabo inclui os canais Fox News Channel, Fox Business Network, FX, Star e vários outros canais por assinatura populares. A empresa Fox Filmed Entertainment é líder global na produção e distribuição de filmes e foi responsável por alguns sucessos estrondosos como “Titanic” e “Avatar”. Estão no grupo a 20th Century Fox e seus vários braços – 20th Century Fox Espanol, 20th Century Fox Home Entertainment, 20th Century Fox International, 20th Century Fox Television, Fox Searchlight Pictures, Fox Studios Australia, Fox Studios LA, Fox Television Studios, Blue Sky Studios e Shine Group. Os negócios em televisão incluem a Fox Broadcasting Company e suas operações Fox Sports, Fox Sports Australia, Fox Television Stations e MyNetworkTV.

Na TV por satélite, a News Corporation tem, por exemplo, a Sky Itália, a maior operação do segmento no país, com 4 milhões de assinantes. Também tem participação na BSkyB, a maior plataforma de TV por assinatura digital da Inglaterra, que chega a um terço dos lares, a líder na Alemanha Sky Deutschland e a Tata Asky e Foxtel, respectivamente, na Austrália e na Nova Zelândia.

A área de publicações é gigantesca. Entre os títulos que fazem parte do grupo hoje estão: Daily Telegraph, Harper Collins Publishers, New York Post, Sunday Herald Sun, Sunday Mail, The Daily, The Sunday Mail, The Sunday Times, The Sunday Telegraph, The Sun, entre outros. O grupo também é proprietário de diversas projetos na web e marcas por meio de joint-ventures com a NBC Universal e a Disney, além da operação de propaganda out-of-home  News Outdoor. Estes são os demais negócios do grupo: AmericanIdol.com, AskMen, careerone.com.au, carsguide.com.au, Fox.com, foxsports.com, foxsports.com.au, hulu.com, IGN Entertainment, Milkround, National Rugby League, NDS, News.com.au, News Digital Media, Scout, Spring Widgets, truelocal.com.au e Whatifsports.

A repercussão negativa dos negócios de Murdoch levou suas ações a perderem cerca de US$ 8 bilhões do valor. Murdoch anunciou a recompra de US$ 5 bilhões para tentar evitar estragos maiores.

Grupo pede desculpas na mídia

Na semana passada, James Murdoch afirmou que a News International pediria desculpas à imprensa, seus funcionários e parceiros comerciais em uma campanha publicitária a ser veiculada em jornais concorrentes a partir do último final de semana. Uma carta assinada por James traz informações a respeito de tudo o que está sendo feito em relação à crise que acomete o grupo.

Na carta, James comenta a saída da ceo da News International, Rebekah Brooks, dizendo que entendeu o movimento para limpar seu nome, e reconhece a saída de vários outros executivos. James disse que criou internamente um comitê independente de Administração & Padrões para direcionar o trabalho do grupo daqui para frente. James também declarou que a decisão de não adquirir a parcela restante da BSkyB tem a ver com o fato de que a empresa quer dirigir todo o seu foco à crise da News International. James anuncia a escolha de Tom Mockridge, que foi presidente da Sky Italia, para o lugar de Rebekah. “A empresa cometeu erros. Mas estamos recebendo punições adequadas, como também respondendo a ataques injustos”, afirmou James.

A saída de Rebekah Brooks, a principal executiva e editora da News International, foi a perda mais dramática para o grupo desde o início da crise. Ela pediu demissão no final da semana passada, depois de muita pressão ao longo das duas semanas anteriores a respeito dos grampos e propinas pagas à polícia. Rebekah tinha 22 anos de casa. Em um comunicado interno, ela pediu desculpas por estar abandonando o barco no meio da crise, mas alegou que sua saída facilitaria o andamento do processo.

Os escândalos em torno da conduta ética do periódico de Murdoch começaram com acusações de grampear telefones de celebridades, políticos e familiares de soldados mortos no Iraque e no Afeganistão, além de subornar policiais em troca de informações. O empresário logo decidiu fechar o jornal, deixando cerca de 200 profissionais desempregados. Seriam cerca de 4 mil supostas vítimas de grampos, que constam no arquivo de Glenn Mulcaire, o detetive contratado pelo News of the World. Entre os principais estão o ator Hugh Grant, que teria sido grampeado com conhecimento do editor do jornal na época, Andy Coulson. Outro caso seria o dos telefones do príncipe Charles e de sua mulher, Camilla Parker Bowles, assim como um ex-advogado da família da princesa Diana.

O caso de Milly Dowler, a menina de 13 anos que desapareceu em 2002, é um dos mais graves: o detetive Mulcaire é acusado de grampear o telefone de Milly, a pedido do News of the World. Houve manipulação de mensagens de texto que fizeram com que a polícia e a família da adolescente acreditassem que ela ainda estava viva, mas posteriormente seu corpo foi encontrado.E há ainda o caso do brasileiro  Jean Charles, assassinado em Londres há cerca de seis anos pela Scotland Yard. Seu primo Alex Pereira poderia estar entre as vítimas dos grampos telefônicos do News of the World, fato que está sendo investigado, pois um número de telefone celular usado por Alex foi encontrado nos arquivos do detetive Mulcaire.

Logo outros jornais de Murdoch entraram no escândalo. Gordon Brown, o ex-premier britânico, teria sido grampeado pelo jornal The Sun, e dados bancários seus, além de registros médicos, teriam sido interceptados pelo Sunday Times. Neil Wallis, ex-executivo da News International, braço de operações do conglomerado de mídia do Reino Unido, foi preso no final da semana passada. Wallis trabalhou como conselheiro para os principais funcionários da Scotland Yard no ano passado, e trabalhou na News International no mesmo período de Andy Coulson, ex-porta-voz do primeiro ministro e que foi detido e liberado há cerca de duas semanas. A Scotland Yard também está tendo sua conduta ética questionada: é acusada de ter tido vários de seus membros na folha de pagamento do News of the World.

por Claudia Penteado