Parecia uma tolice sair daqui e não gostaria de trocar o “tudo à disposição”. Será que temos tempo para aproveitar esse “tudo”?

Já pararam para pensar no quão estávamos acostumados a um ritmo forte e acelerado? Morar em São Paulo, trabalhar com feiras e eventos, tudo para mim passava por uma rotina veloz, com muito pouco tempo de dispersão. Uma normalidade de cadência rápida. Essa era uma realidade comum até 2020.

A mudança repentina na qual caímos, deu outro tom ao compasso das coisas. A atmosfera de imprecisões e novas inconstâncias diárias romperam com muitas das nossas convicções.

Uma dessas grandes certezas que sempre esteve comigo era: São Paulo. Um lugar repleto, onde se pode encontrar de tudo, em qualquer momento. Parecia uma tolice sair daqui e não gostaria de trocar o “tudo à disposição”. Mas será que temos mesmo tempo para aproveitar esse “tudo”?

O confinamento me fez refletir sobre o fato de, apesar de termos tudo, estarmos, na maior parte do tempo, presos em nossos apartamentos e carros. O trânsito, a eterna correria. Em um apartamento com meu filho e minha mulher, com um mundo instável na janela, me dei conta que, por mais convicto que estivesse sobre viver “na cidade que não dorme”, talvez essa não fosse a melhor opção. Ou a mais saudável.

Recorri ao interior, já antes descoberto pelos meus pais – eles já sabiam dos benefícios desse mundo novo. O quintal, o observar meu filho brincando no sol, a tranquilidade de poder compartilhar uma praça na cidade e caminhar para meus compromissos foram algumas das lições doces que aprendi sobre o tempo e o tudo. O que era para ser uma quarentena, se tornou uma nova possibilidade.

Dizem que períodos difíceis nos convidam a refletir sobre o que realmente importa. E me importava bem menos ter o tudo à minha disposição 24h por dia do que a calmaria que me trazia esse meu novo ambiente.

A verdade é que o ritmo frenético nos engole diariamente. Por muitas vezes, nos impede de notar que aquilo não é o normal. Ter tempo, espaço para olhar meu filho brincar na grama, é o normal.

Chegar a um compromisso em menos de 60 minutos é normal. Sair da arritmia da grande metrópole permite meditar sobre a possibilidade de um equilíbrio entre a cidade das oportunidades e a serenidade do interior.

E esse é o balanço positivo entre o pacato e o dinâmico, entre o home office e o presencial. É a nossa nova realidade. Mas, ao contrário do que aconteceu em 2020, estamos voltando a uma rotina gradualmente, com tempo ao nosso favor.

Buscar o equilíbrio entre as coisas que aprendi a observar e a importância de manter velocidade do mundo tem sido um novo desafio. Os ajustes são necessários para todos, mas seguramente existe um caminho no meio que possibilita juntar o melhor dos dois mundos.

E, por mais difícil que possa parecer, posso afirmar que é possível. Dispus-me a vir do interior para São Paulo e ficar aqui durante os dias úteis para voltar a uma casa aconchegante e suave aos fins de semana. A estrada de ida a São Paulo e o saber que estarei longe da família durante dias, aperta o coração.

Mas tem valido a pena, pelos bônus que essa decisão traz. Penso que muitos de nós não imaginávamos as possibilidades que se apresentaram durante este último ano. Muitas delas foram ignoradas, porque estávamos exaustos para refletir e considerávamos que não havia outros cenários. Contudo, essa não é a verdade. Com algumas renúncias, ganha-se muito.

Vejo menos minha família, mas vejo neles uma nova convicção: a de que fiz a escolha certa.

Pedro Luís Torrano é sócio-diretor da Triart