O bordão impulsiona a propaganda ou é a propaganda que impulsiona o bordão? Não é de hoje que as expressões populares e a publicidade caminham juntas. Utilizar bordões na publicidade é um recurso bastante utilizado para aproximar a marca do público, mas na opinião de especialistas, mais relevante ainda é quando a propaganda cria um bordão que acaba virando um dito popular. Quem não se lembra, por exemplo, da famosa frase “Não é assim uma Brastemp”? Criado pela Talent há mais de 20 anos, o slogan passou a fazer parte do dicionário do brasileiro e virou um clássico da propaganda no país.
“O case da Brastemp é um clássico. Tem também o ‘Folha. Não dá pra não ler’. E o Número 1 da Brahma, utilizado como sinal de liderança. Quando um slogan vira uma expressão popular, é o maior referencial de sucesso para a marca”, avalia Marcelo Pontes, líder da Área de Marketing, Pesquisa e Economia da ESPM-SP.
Também não é surpresa o uso ilimitado de músicas populares e de linguagens que tenham a ver com o consumidor na publicidade. “Os movimentos culturais sempre tiveram bastante força na comunicação. A propaganda deitou e rolou em cima de ondas como a bossa nova, movimento hippie, rock, sertanejo e axé. Essa é uma forma de mostrar a proximidade das marcas, dos produtos, com o universo do consumidor. Quanto mais empatia, identificação a marca tiver com as pessoas, melhor o resultado”, ressalta Pontes.
O fato é que toda marca quer ter um bordão. “Criar um bordão para uma marca e ele cair no gosto do público é um golaço. É o que toda agência busca”, conta Philippe Degen, diretor de criação da Talent.
Um dos responsáveis por campanhas como “Upalelê” (Santander) e “Tá Calor pra Kawaka” (Kaiser Radler) – famosas pela utilização/adaptação de expressões populares – , o criativo diz que o mais importante é criar uma situação em que o consumidor se identifica. “Por outro lado, não é uma ciência exata. No caso de ‘Tá calor pra Kawaka’, a gente mostrou um jeito mais divertido de as pessoas falarem que tá muito quente e pegou”, destaca.
No entanto, o uso de expressões populares na propaganda não pode ser “forçado”, pois neste caso, acaba criando o efeito contrário. “As pessoas ficam com raiva quando percebem que uma marca está tentando empurrar um bordão”, completa Degen.
Não se discute
Outro exemplo de expressão popular adaptada para a propaganda é a campanha “Posto não se discute. Tem que ser Shell” – uma espécie de adaptação para ‘gosto não se discute’. Gustavo Soares, diretor de criação da J.Walter Thompson, diz que o insight surgiu durante um brainstorming com os redatores da campanha,Sleyman Khodor e Lucas Tristão. “Sempre brincávamos com a palavra posto durante a criação da campanha. Escrevemos um manifesto, para exorcizar todos os trocadilhos.. De tanto conjugar essas palavras, o Sleyman vira e manda: posto não se discute”, relata Soares.
O criativo também afirma que o uso de expressão popular na comunicação funciona desde que tenha conexão. “Se ficar forçado, não funciona”. “A marca Shell está na cabeça das pessoas como excelência em postos de combustível. A Raízen queria uma assinatura que representasse isso. O que nós fizemos foi evidenciar por meio de uma expressão popular o que já sabemos”, observa. “A repercussão foi ótima. No Top of Mind, por exemplo, a Shell retomou esse espaço e teve seu melhor número dos últimos 10 anos”, conta Soares.
Para os criativos da Talent e da J. Walter Thompson, o bordão “Não é assim uma Brastemp” é o clássico dos clássicos de todos os tempos. “É muito relevante porque transformou a marca num adjetivo e a inseriu no próprio bordão. Mostra que Brastemp é sinônimo de perfeição. Foi realmente um golaço. Gostaria de ter feito”, ressalta Degen. “Eu confesso uma certa inveja do Ricardo Freire [criador do bordão], que fez a marca virar meme uma década antes dessa palavra existir”, finaliza Soares.
Relembre alguns desses comerciais.