Para a atual geração, agências digitais serão absorvidas por grandes grupos de comunicação

 

A geração que de fato compreenderá o ambiente digital e como trabalhar a comunicação e o marketing nele ainda está para chegar. Os jovens profissionais que estão para entrar no mercado não se consideram a chamada “geração digital”, deixando o título para aqueles que ingressarão na indústria na próxima década, segundo a pesquisa “Next Generation of Marcoms” (“A Próxima Geração da Comunicação e do Marketing”, em tradução livre), conduzida pelo MediaSchool Group. O estudo compreende a opinião de dois mil jovens com idades entre 20 e 25 anos e que estudam propaganda, marketing, comunicação, design e eventos no Reino Unido, na França, na Espanha e na Bélgica.

 

O objetivo do levantamento é descobrir o pensamento da geração que está entrando no mercado sobre o marketing digital, sobre o futuro das comunicações e sobre carreira. “A pesquisa mostra algumas percepções fascinantes de jovens estudantes prestes a entrar no mercado e destaca como o digital está se tornando rapidamente parte de tudo o que nós fazemos. Aquilo em que eles acreditam, que é a geração dez anos mais nova que representa os verdadeiros nascidos na era digital, indica também que nem nossos novos talentos devem ser complacentes quando falamos de maneiras novas, emergentes ou já existentes de se conectar com os consumidores”, avaliou Maurice Lévy, CEO do Publicis Groupe, que encomendou o levantamento.

Os dados coletados pelo MediaSchool Group revelam uma geração bastante habituada e confortável com o ambiente digital e, consequentemente, com as redes sociais – plataformas que ganharam força no final da década passada e têm ditado o ritmo da evolução da web, dos dispositivos móveis e dos outros componentes desse universo. Quase 90% dos entrevistados disseram que as mídias sociais são um canal que todos os profissionais do marketing deveriam usar e que o segmento não deve ser visto como um meio capaz de operar independentemente das demais plataformas. Nesse ponto, o Facebook, a maior rede social do mundo, com mais de um bilhão de usuários, é o mais admirado – 77% deles dizem que a rede de Mark Zuckerberg é a ferramenta de mídia social mais eficaz para as marcas se comunicarem com a atual geração.

Mas apesar dessa valorização do ambiente digital, os novos profissionais acreditam que são aqueles que entrarão no mercado daqui a dez anos os verdadeiros especialistas em redes e internet. São 70% os que acham que conheceremos a verdadeira geração nascida numa era digital somente na próxima década, quando essa nova safra estiver prestes a se formar nas escolas de comunicação e, a partir de então, revolucionará o modo como pensamos o marketing digital.

A principal causa para esse pensamento é a concepção desses jovens sobre o que é digital, algo que muda de geração para geração, de acordo com Felipe Wasserman, professor do Centro de Inovação e Criatividade da ESPM. “Essa definição muda de acordo com o que é o mainstream do momento. Eles interpretam isso porque tiveram uma infância que, apesar de digital, não teve mídias sociais, por exemplo, e porque acham que não viveram a vida inteira nesse ambiente. A atual geração é 100% digital em relação à internet, mas não aos subprodutos da rede”, diz.

Como exemplo, Wasserman cita o caso dos smartphones. Esses dispositivos estão no mercado há menos de dez anos e, portanto, não fizeram parte da formação dos profissionais que hoje estão entrando no mercado. Como a atual geração não esteve conectada e imersa no ambiente digital desde o início, acredita que são os mais novos os donos desse rótulo de “geração digital”. Além disso, existe o fator conflito de idade. “Os jovens sempre acham que são mais maduros que os mais novos. Isso é uma realidade normal. Mas pela velocidade que as coisas evoluem, a nova geração vai trazer coisas diferentes sim”, completa.

Futuro das agências

Os entrevistados atestaram a importância dos meios digitais e disseram acreditar que, no futuro, as agências de comunicação atenderão ao modelo full-service, prestando serviços de publicidade, marketing, mídias sociais e relações públicas, além, claro, de soluções digitais. Tal fenômeno, porém, ainda de acordo com os jovens que participaram da pesquisa, culminará no desaparecimento das agências especializadas em mídias sociais e serviços digitais. Segundo o estudo, 85% dos participantes acreditam que, até 2023, essas agências serão integradas a outras empresas.

Para Wasserman, porém, o leque de possibilidades aberto pelas novas tecnologias que já existem, e também pelas que surgirão, faz com que o mercado tenha espaço para agências especializadas, mesmo que pequenas. “Dificilmente esse segmento (digital) vai ser dominado por poucos players. Sempre haverá as pequenas boutiques com especialidades diferentes”, afirma o professor da ESPM.

Insights

Quanto ao futuro das comunicações, os jovens desta geração creem na evolução da indústria e na convergência, com 90% concordando que até a próxima década as agências em que trabalham serão capazes de criar estratégias em todos os segmentos, tornando-se empresas de atendimento full-service. Sobre o que consideram objetivo do marketing, 70% disseram que em dez anos, “entreter” será mais importante que “vender” para a publicidade.

A preocupação com a responsabilidade social também é latente. São 70% os que acreditam que as agências de comunicação e marketing não estão fazendo o bastante pela sustentabilidade, enquanto 86% dizem querer trabalhar em uma agência que se preocupe tanto em promover o bem social quanto em fazer seus clientes ou sua marca lucrarem.

Agências precisarão se reinventar

Executivos não acreditam no fim de agências digitais, mas na reinvenção do modelo clássico de fazer publicidade. “Distinção entre meios irá se extinguir pela razão de que tudo será digital num futuro próximo”, aponta Abel Reis, CEO do Isobar Brasil e da AgênciaClick Isobar.

Planejar o investimento em mídia, por exemplo, não será mais suficiente. As agências precisarão incorporar serviços como inovação em produto e estratégias de experiência de marca. Isso tem impacto profundo na remuneração de agências clássicas, o que forçará essas empresas a repensar o negócio. “A receita não poderá vir do puro e simples planejamento de veiculação de mídia. A agência vencedora será a mais consultiva em serviços, design, experiência de marca, inovação em produto e relacionamento com o consumidor”, indica Reis.

Segundo Gal Barradas, CEO da F.biz, do Grupo WPP, permanecerão no mercado as agências que entenderem a criatividade na comunicação como fator de diferenciação para o valor das marcas, independentemente da tecnologia. “Justamente porque os avanços tecnológicos facilitam as operações é que a diferença de uma agência para a outra estará na inteligência. A inteligência não pensa em canal, pensa em solução. A atuação dos mídias, de um criativo ou de um planner é diferente do que já foi um dia. A tecnologia é a mesma para todo mundo. Como utilizá-la, como alavancar valor de uma mensagem é que fará diferença”, analisa.

Empresas de comunicação também precisam ficar atentas para o que será o digital em dez anos. O lançamento de aparelhos disruptivos, como o Google Glass, e a massificação de dispositivos superpotentes, como o smartphone, adicionarão elementos à publicidade. “Há dois anos, não fazia sentido pensar que óculos poderiam ser uma mídia, mas hoje não é ridículo pensar que o Google Glass possa ser um meio outdoor”, exemplifica Reis. “Não podemos acreditar que os meios dominantes de comunicação digital serão simplesmente evolução dos que já existem. Provavelmente teremos várias rupturas, de forma que haverá meios interagindo com consumidor que hoje não vislumbramos”, afirma.

Primordialmente, as agências precisam antecipar-se à necessidade de inovação do cliente, defendem os executivos. Em dez anos, o cenário para a publicidade é de fragmentação, operação em rede e criatividade emergindo a partir do consumidor. “As agências que dominarão a cena em 2023 são as que se renovam continuadamente, sistematicamente”.

*colaborou Keila Guimarães