Purquá, mecê, purquá?
Toda vez que vou ao Festival de Cannes, desembarco em Nice, com uma esperança: este ano arraso no meu francês! Afinal, após tantos anos frequentando a Croisette, talvez eles nem cheguem a perceber o meu “pequeno” sotaque. Arrisco, então, o meu primeiro “bonjour, monsieur”. E o que ouço como resposta? “Good morning!”. É sempre assim! E olha que francês, como todos sabem, fica ainda mais mal-humorado ao ter que falar a língua daquela “ilhazinha” que fica do outro lado do Canal da Mancha. (Mesmo assim eles insistem em responder good morning!).
Desanimaux? Jamé! Um dia ainda eu falo francês tal e qual Marcello Queiroz! Quem sabe como o Marcel Proust! Ou, no mínimo, como o Marcel Marceau! Serve como conforto perceber que o mesmo acontece a muita gente. Inclusive, àqueles que vêm cursando a Aliança Francesa desde, digamos assim: petit!
Ir a Cannes é e sempre será um grande prazer. Mesmo que você chegue 48 horas antes de sua “inseparável” bagagem. Por mais que você pegue uma gripe daquelas, logo no primeiro dia, e fique derrubado, sem forças nem para sair da cama do Carlton. E para que mesmo sair da cama do Carlton? Melhor ficar pensando em quem antes teria deitado seu lindo corpinho naquele mesmo colchão. Scarlet? Penelope? Angelina? Brigitte? Gina? Sofia? Vule vu cuchê avec muá, ce suá? Puro delírio!
Mais do que um festival de publicidade, antes, Festival de Criatividade, agora, Cannes é sempre um festival de emoções, sensações e experiências. Da frustração de não constar no shortlist à consagração de subir ao palco e domar um Leão. E, no ano seguinte, talvez outro. E, quem sabe, mais outro. Posso não voltar com um Leão, mas, jamé, sem uma caixinha de música para a minha coleção, comprada naquela simpática lojinha de brinquedos, atrás do Majestic.
Você não perde em Cannes, só ganha! Ela sacode, provoca, desafia, injeta ânimo, tesão pela profissão. Vai dizer que você nunca voltou para casa querendo mudar o mundo, na sua agência?
Cannes é transformação. E, para minha surpresa, a maior delas aconteceu com a exibição dos filmes concorrentes. Agora, praticamente relegados a algumas salinhas do terceiro andar, com baixíssima audiência. Tempos modernos!
Em 2007, graças a um convite irrecusável, me transformei de delegado em colunista do propmark. No “Petit Comitê”, uma série de vídeos no formato de bate-papo, fiz críticas, comentários, mostrei curiosidades. E conheci a sala de imprensa, onde constatei a loucura que é fazer a cobertura do evento. Verdadeiros guerreiros, esses jornalistas, correndo atrás do furo. E do fuso. É dose pra leão, monami! Obrigado, Fernando Palermo e Rita Elisa, pela paciência, dicas e coleguismo. Obrigado, Armando Ferrentini e Marcello Queiroz, pela oportunidade tão enriquecedora.
Ao escrever estas linhas e resgatar as minhas histórias me deu uma vontade louca de ir para casa, fazer as malas e esperar a hora do check-in para mais um festival. Se Deus quiser, lá estarei em breve, desembarcando para mais uma vez praticar meu perfeito francês: Purquá mecê vous mange les oiseaux?**
*diretor de criação da Tônica Projetos de Consumo
**extraído, para quem não conhece, de uma composição de “Os Mulheres Negras”, banda de Maurício Pereira e André Abujamra