A história vivida no passado por gigantes do mundo empresarial vai se repetindo com as megaorganizações tecnológicas, que vinham vivendo um período de franca e descontrolada expansão, acreditando que nada poderia fazer frente a seus interesses próprios. Aconteceu com o petróleo, as telecomunicações e algumas commodities no século 20, que foram forçadas a se enquadrar. Por governos, os próprios consumidores/cidadãos e alguns concorrentes.

Agora parece que os laços em volta dos “cachorros grandes” da tecnologia estão se apertando e eles, que não brigavam muito entre si, começam a se pegar, pois o estoque de alimentos para seu espetacular crescimento já se rarefaz.

Um deles é o capital especulativo, que sustentou a falta de rentabilidade de alguns por anos ou serviu para uma acumulação extraordinária de capital de outros. O sinal mais evidente ocorreu em 20 de novembro, quando os principais índices da bolsa de Nova York (Dow Jones, S&P 500 e Nasdaq) baixaram a ponto de zerar todos os seus ganhos obtidos em 2018. O movimento foi puxado pela queda das ações dos gigantes da tecnologia e acabou contaminando outros setores.

Também veio a público que o Facebook havia contratado uma firma oriunda do pesado marketing político americano, a Definers Public Affairs, para fazer o mesmo jogo sujo de desinformação e geração de comentários depreciativos em relação a seus críticos e concorrentes. Exposta por um artigo no New York Times, essa relação foi rompida e os dois principais executivos do Facebook, Zuckerberg e Sheryl Sandberg, se apressaram a dizer que não tinham nada com isso. Mas alguns dias depois, com o vazamento de emails comprometedores, Sandberg já disse que “fora informada” de alguma coisa…

Ainda em relação ao Facebook, que parece viver uma crise por semana, ele foi pego de calças curtas no Sudão do Sul, onde o leilão de uma jovem de 16 anos foi realizado através dessa mídia social. E em Londres, um policial armado a serviço do Parlamento confiscou, sob risco de prisão, o laptop do CEO de um ex-parceiro do FB, a Six4Three, onde parece haver mais uma enorme quantidade de munição contra a organização. Com a divulgação desse fato, um tribunal da Califórnia se apressou a solicitar o “compartilhamento dos dados” com os britânicos. São os benefícios – ou agruras – de um mundo globalizado…

O Google, que não fica atrás em seus métodos, mas tem sido menos exposto, passou a enfrentar um processo aberto em sete países europeus por estar violando a nova lei do bloco continental de proteção de dados pessoais, que a empresa alega estar cumprindo, a seu modo, mas de fato não está levando suficientemente a sério.

Um outro fio do novelo, que pode puxar muita coisa, foi pego pelas autoridades francesas, que julgaram o caso de uma pequena adtech, a Vectaury, e definiram que os seus métodos de leilão na mídia programática estão fora da lei.

Olhando de fora, mas prontos a entrar nessa briga bilionária, estão a Amazon e os gigantes chineses, cujo megamercado e amarras ainda mais soltas ainda vão transformá-las no maior pesadelo dos que inventaram o jogo techdigital e achavam que estavam acima de tudo e de todos.

Está mais do que na hora deles olharem o exemplo histórico de gigantes que precisaram se enquadrar e mudarem de atitude, passando a considerar mais tanto seus consumidores, como concorrentes diretos e indiretos e até os governos nacionais, passando para a fase colaborativa e com maior solidez deontológica.

Alguns não vão fazer e começarão a sangrar aos poucos; outros, menos arrogantes e mais inteligentes, vão passar a conversar.

Rafael Sampaio é consultor em propaganda (rafael.sampaio@uol.com.br)