Um prato à base de parmesão para reaproveitar todo o queijo despedaçado por um terremoto e impossibilitado de ser comercializado.
Uma charge em que Trump esbraveja usando megafone em forma de gorro da Ku Klux Klan, mostrando que seu discurso amplifica o ódio.
Uma tinta invisível que faz objetos brilharem no escuro para proteger ciclistas de atropelamentos.
Um sabonete de glicerina com um brinquedo dentro. Para acessá-lo, crianças são obrigadas a lavar as mãos com frequência.
Uma obra de arte pitoresca: um vídeo de 24 horas de duração, em looping, só com cenas de relógios que aparecem em filmes e programas de TV, criando um relógio funcional sincronizado com o horário real.
Faixas de pedestres pintadas em 3D, para criar uma ilusão de ótica e forçar motoristas a respeitarem a sinalização.
A história de uma mulher que entra em um hospício para dar um telefonema e fica presa lá porque, não importa o que diga, é tida como louca.
Ou de um mundo de monstros que fabricam energia a partir dos gritos das crianças que eles assustam à noite.
Um perfil de Twitter criado para identificar nazistas a partir de fotos em manifestações. E os denuncia às suas empresas para que sejam demitidos.
Um easter egg musical: duas notas que reproduzem o canto do pássaro Matita Perê, tocadas no exato momento em que a letra da música cita a ave.
Ideias, ideias, ideias.
Artísticas, sociológicas, tecnológicas, inovadoras, de negócios, de comunicação, de novos produtos e serviços. Ideias formatadas, desformatadas e inclassificáveis.
As grandes ideias são minha verdadeira fonte de inspiração.
Aquelas ideias que tocam, emocionam, provocam e desafiam.
Que mudam o comportamento humano.
Solucionam problemas antes insolúveis.
Abrem mentes e corações de forma irreversível.
Tornam a vida mais fácil, mais justa, mais leve, melhor.
Empurram a humanidade para frente.
São elas que me tiram da cama e me levam à agência, todos os dias.
Mas também são elas que me derrubam, me nocauteiam.
Explico: para quem trabalha em criação, grandes ideias são paradoxais.
São deliciosas e cruéis, na mesma medida.
E comigo não é diferente.
As grandes ideias me matam de admiração e de ódio.
Chutam-me impiedosamente para fora da zona de conforto.
Fazem-me sentir miseravelmente incompetente, porque são a prova de tudo o que eu poderia ter feito e não fiz.
Fazem-me sentir gloriosamente capaz, porque são a prova de tudo o que ainda posso fazer.
Grandes ideias são cachaça. Dão barato e dor de cabeça. Levam à loucura e à ressaca.
Mas sobretudo levam à incansável busca por novas ideias.
Porque cutucam o ego, abrem a cabeça, fertilizam o inconsciente, expandem as perspectivas.
“Se eu vi mais longe foi por estar nos ombros de gigantes”, reconheceu Newton.
Nos ombros de gigantes como do chef Massimo Bottura; do ilustrador irlandês Jon Berkeley; dos criativos da Grey Londres e da Y&R África do Sul; do artista Christian Marclay; do ministro dos Transportes da Índia, Nitin Gadkari; de Gabriel García Márquez; dos roteiristas da Pixar Andrew Stanton e Daniel Gerson; dos criadores do perfil @yesyouareracist; do mestre Tom Jobim e de tantos e tantos outros, enxerguei além.
Entre dores e delícias, angústias e êxtases, as grandes ideias me levaram mais longe.
Adriano Matos é diretor de criação executivo da Grey Brasil