Tantas coisas me inspiram. Os cravos vermelhos de Pina Bausch, os saltos arritmados e precisos de David Parsons, Pavarotti cantando Nessum Dorma, as pinceladas frenéticas de Van Gogh, os beijos de Klimt…
Fui diretora de arte de publicidade durante 15 anos. Fiz vários trabalhos bacanas, conheci pessoas incríveis, que admirei. Pessoas inspiradoras, que brincavam com as ideias. Pessoas que encontravam inspiração em conversas de bar, em adesivos de para-choque, em letras de pagode. Gente que fazia coisas incríveis usando o seu talento, além de muita transpiração. Naquele ambiente, a inspiração passeia livremente todos os dias.
Mas faltava algo. Durante várias madrugadas nunca entendi direito aquela felicidade que existia nas pessoas em busca da ideia perfeita. De comemorar como se fosse um gol de final de Copa do Mundo ter um anúncio publicado na Archive. Via uma alegria e realização verdadeira.
Precisou passar vários anos para entender aquele sensação. Para ter o encontro definitivo que muda tudo. Porque nada é mais inspirador do que quando nos encontramos com nosso dom. Foi quando ele veio. Meu dom. E veio doce, cheio de sabor, em forma de um brownie.
Nesse momento entendi o que via lá nas agências. As minhas madrugadas acordadas se justificaram, os fins de semana e feriados eram celebrados trabalhando. Encarar numa boa uma fila gigantesca em um supermercado para comprar produtos mais baratos fazia parte da minha rotina. Pensar 24 horas em uma nova receita era tão natural como respirar.
Encontrei o dom de criar sabores, de me dedicar a cada produto com carinho e cuidado, tendo a certeza de que em cada um estava o melhor que conseguia fazer.
O dom de me doar a um sonho, de dar asas e pernas a ele para ir cada vez mais longe. O dom que vem acompanhado da certeza e da coragem de dar o próximo passo.
Há sete anos estou nessa grande aventura, chamada Bendito. A minha fantástica fábrica de chocolate, cheia de cores, aromas e texturas. A fábrica é onde continuo sendo diretora de arte, criando para mim mesma, unindo sabor e design.
O que era um passatempo de infância durante a Sessão da Tarde, uma brincadeira na época da faculdade, virou um negócio, uma maneira de passar os dias conseguindo misturar trabalho e prazer, a dupla tão perseguida por todo mundo.
Hoje, meu gol em final de Copa é ver um cliente provar um dos meus produtos e ficar maravilhado, encantado. E pensar nele toda vez que quer se dar um presente, ter um momento especial no seu dia.
Tive a sorte de ter um amigo, companheiro e sócio que embarcou comigo nessa. Coincidentemente, ele foi meu dupla há quase 20 anos. E vamos a cada dia, eu e Alexandre, juntos, desbravando nossos dons.
O caminho só existe quando você passa. Essa é a minha frase de cabeceira. E é com ela que realizo hoje minhas ideias e sigo meus instintos.
É necessária a ação. O primeiro passo. A coragem de sair daquele espaço certo, previsível do cotidiano. Da areia movediça que nos impossibilita andar, realizar.
O dom brota. Está lá. Que tenhamos coragem e inspiração de deixá-lo crescer.