Você já deve ter ouvido falar de clube do trilhão, sobre empresas que atingiram essa marca em valor de mercado, como a Apple e a Amazon. No entanto, há um “novo” clube tão importante quanto, o de segmentos de pessoas que vão liderar o consumo: mulheres, negros e adultos com 50 anos ou mais.

Esse é um dos indicativos da pesquisa “O varejo pelo olhar do consumidor”, do Instituto Locomotiva. O levantamento nacional foi realizado de 15 a 28 de junho de 2019, com 1.500 brasileiros de 18 anos ou mais, e aponta que o gasto estimado das famílias brasileiras para 2019 será de R$ 4,4 trilhões.

Os resultados mostram ainda que as mulheres com renda própria movimentam R$ 1,9 tri na economia brasileira. Já o “Grey Power” movimenta R$ 2,1 tri por ano, e os negros são responsáveis por R$ 1,9 tri. Apesar do potencial, são os três que lideram a não identificação com a publicidade.

No caso das mulheres, 69% afirmam que não são retratadas de forma adequada. No Grey Power (hoje 59 milhões de brasileiros e estimados em 98 mi até 2050), 77% afirmam que as pessoas nas propagandas costumam ser “muito diferentes de mim” e 91% que as empresas deveriam “respeitar melhor” a diversidade. Já entre os negros, mais de 90% afirma que os protagonistas das campanhas publicitárias são em sua maioria brancos e 65% acreditam que as propagandas não representam bem a população negra.

Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, acrescenta que, além da falta de identificação, 88% acreditam que empresas não se importam com os consumidores, apenas com lucros. “O Brasil tem 157 milhões de consumidores e 67,9 mi não se identificam com nenhuma marca de empresas varejistas. São 43%. E a insatisfação é maior no clube do trilhão”, diz.

Cadê o prazer de comprar?
Outro ponto ressaltado é o descolamento entre o consumidor e o varejo, como reflexo da crise. Enquanto o brasileiro se considera, por exemplo, muito mais confiável, honesto, trabalhador que as empresas, ele avalia as empresas mais ricas do que si mesmos. Para os respondentes, 90% se considera mais confiável e apenas 10% acredita que são as empresas. Na outra ponta, o inverso: 10% se consideram mais ricos e 74% considera as empresas.
“O comportamento do varejo na crise contribuiu para um afastamento dos consumidores das marcas, aumentando a relação funcional, diminuindo o encantamento no momento da compra e, em última análise, contribuindo para o achatamento das margens”, diz Meirelles. Ele vê uma radicalização na demanda por custo-benefício com 81% das pessoas mais atentas à qualidade.

A pesquisa também indica as categorias de produtos que os brasileiros pretendem comprar no próximo ano. Móveis, eletrodomésticos e carro aparecem com 33% cada. Em seguida estão o smartphone (27%), casa/apartamento (22%), notebook (21%), smart TV (19%), tablet (12%), moto (11%) e bicicleta (10%). Já nos serviços, destaque para viagem de avião nacional (37%) e internacional (23%), seguidas por TV fechada (12%), assinaturas de plataformas de streaming de vídeo (11%) e música (6%).

Para Meirelles, só sobreviverão os formatos de loja e as marcas que tiverem clara proposta de valor para o consumidor. “As marcas terão de se reapresentar para os consumidores, com uma visão além do transacional”, diz.

A ideia é que o mercado dê argumentos racionais, sim, mas volte a oferecer para o consumidor o prazer de comprar. Para o executivo, há três pilares para essa mudança e há bons exemplos neles. Do ponto de vista de negócios estão os mecanismos financeiros, com destaque para varejistas que começam a criar um banco digital e programas de relacionamentos contínuos (Casas Bahia e o BanQi). Outra peça no quebra-cabeça é o fortalecimento do online e esquecer a divisão entre on e off (Magazine Luiza). A terceira tem a ver com políticas claras de relacionamento, com os algoritmos ofertando produtos que fazem parte do dia a dia daquele cliente (Pão de Açúcar). “É uma somatória da inteligência de negócios, do relacionamento, parceria, integração clara de canais. Quem estiver com isso pronto quando a economia voltar a crescer vai sair na frente.”