Imagine uma pessoa indo comprar Sprite com uma moto Honda que acabou de adquirir? Algo normal, certo? Porém, é bem provável que tanto a motocicleta quanto a bebida foram sugeridas a este consumidor por meio de publicidade gerada com a ajuda de dados.
Segundo a Kantar, a comparação inteligente de dados é uma das seis resoluções para que as marcas se mantenham inovadoras em 2021. Além disso, de acordo com o relatório Empregos em Alta, do LinkedIn, cargos de análise de dados mantiveram um crescimento constante ao longo dos últimos anos e em 2020 não foi diferente. Tais informações demonstram amadurecimento e fortalecimento do mercado de marketing de dados.
No universo da publicidade, dados podem ser aliados da criatividade, mas também adversários. Isso porque eles só têm valor quando sabemos lê-los e interpretá-los, conforme opina Fernanda Antonelli, managing director da Wieden+Kennedy São Paulo. “Sem uma visão holística do que os dados representam, eles vão se acumulando numa pilha de informações que podem até tirar o foco da criatividade”, alerta.
A W+K tem um modelo recente com Sprite. “Um case que tanto Google quanto Facebook divulgam como bom exemplo de uso de plataformas e dados. Produzimos um grande arsenal de conteúdo, lançamos em todas as plataformas e aprendemos o que funciona melhor e onde. Depois produzimos mais conteúdos, adequados para cada plataforma”, explica Fernanda.
Na Publicis, o uso de dados também é primordial, conforme explica Thiago Cassemiro, head do Brainlab, núcleo de dados da agência. “Hoje existem tantas possibilidades do uso de dados na mão dos marqueteiros que não compete mais exclusivamente aos times de criação entregar uma campanha disruptiva; um formato de mídia pode ser o diferencial, o insight estratégico ou uma proposta de engajamento nas redes sociais. Hoje um patrocínio em reality show pode ser o início de um anúncio que termina no Twitter ou uma oferta na TV aberta pode ser convertida em venda no ecommerce através de QR Code. Tudo isso só é possível porque existe uma camada de dados sendo processada constantemente e gerando inteligência para garantir que tudo que uma marca propõe ao consumidor faça sentido. O importante é que um dado não vai ser criativo, mas o olhar que se coloca sobre ele sim”, ensina.
A agência aplica o uso dos dados para clientes como Honda com atuação totalmente transversal, flutuando entre os times de planejamento, criação, mídia, conteúdo e com o próprio cliente. “Mantemos um monitoramento Always on sobre mobilidade das pessoas nas grandes cidades, mapeando tendências e oportunidades, foco puro em entender como indivíduos se locomovem”, revela Cassemiro.
“Cada vez mais é uma tarefa árdua para as marcas serem relevantes. Vivemos na Economia da Atenção, onde o conteúdo é pulverizado cada vez mais em novas telas e canais de mídia. Muito ruído e pouca retenção do consumidor, que passou a consumir conteúdo de maneira menos linear, decidindo, de forma arbitrária, quando e como se relacionar com pessoas e marcas. Em um cenário tão dinâmico e efêmero, a criatividade deve empoderar-se de dados para requintar suas ideias e torná-las menos perecíveis”, explica Gustavo Macedo, diretor de dados e inovação da Talent Marcel.
As vantagens do uso de dados são diversas. Para Fabio Palma, CTO da Africa, o processo de colher, mensurar e analisar grandes quantidades de dados é o que permite, na maioria das vezes, não só olhar ao passado, como também gerar modelos que podem prever o futuro com grande assertividade. “Isso faz com que as estratégias e táticas sejam desenhadas de forma a otimizar recursos para os objetivos do cliente, bem como a criação seja direcionada para os públicos específicos. Além disso, podemos testar e ajustar rotas e formatos ao mesmo tempo que aprendemos com eles, otimizando campanhas que ressoam de forma mais profunda com o consumidor”, relata, destacando que é impossível que uma campanha da agência saia sem a forte influência de dados e conhecimento gerado a partir deles.
A leitura de dados diminui os “achismos” no planejamento, conforme opina Débora Brauhardt, head de marketing e cofundadora da B.Done. “Quando falamos de números, podemos falar desde dados gerados por meio das redes sociais, websites, como sistemas de CRM e gestão, ou até mesmo da mídia programática e do Digital Out Of Home (DOOH). Esses dados permitem as mais diversas possibilidades: da criação de estratégias robustas baseadas em perfis de consumo, demográfico, comportamental, etc., até ativações de marca em tempo real”.
Marcel Ghiraldini, VP e growth strategy da Math Marketing, reitera a importância do fim dos “achismos”. “Os dados devem ser ponto de partida para todas as ações, do criativo à tática de venda, não cabe mais ao profissional de marketing adivinhar, ele precisa saber”, afirma. “O desafio é que dados estão em todas as partes, não estão organizados, não estão integrados e não estão trabalhados para serem bem utilizados. É preciso ter toda uma gestão baseada em dados para que toda esta cadeia alimente processos e decisões que gerem benefício para os negócios”, completa.
Realmente, é preciso leitura acurada do “novo petróleo do mundo”, definição de Daniel Kaminitz, CEO da Weach Group, para os dados. “Junto com a utilização, é a etapa mais desafiadora, porque aqui existe o fator humano da interpretação. Tirando os insights básicos que podemos encontrar nessa etapa […]. Além de insights úteis para decisões de marketing como logística, por meio de dados de interações e pesquisas nativas na entrega de mídia, um dos desafios dessa etapa é também a divulgação interna desses dados, de forma objetiva, para ajudar, assim, a tomada das decisões”, afirma.
Macedo, da Talent, ressalta que não há apenas um benefício no uso de dados. “Os dados requintam as estratégias de marketing, pois podem dar uma visão preditiva dos resultados da campanha e até mesmo serem utilizados para monitoramento durante a veiculação. Isto nos permite enxergar novas oportunidades ao longo do flight, como por exemplo, interagir com a audiência que comenta a campanha, reagir com velocidade a potenciais crises, e até mesmo redefinir a estratégia quando os números não vão a contento. Os dados podem também nos dar uma visão ultragranular das campanhas, em digital, podemos ter visão do desempenho de todos os touchpoints com o consumidor, e no off podemos medir o impacto das comunicações na segunda-tela, ou até mesmo parametrizar QR-Codes de campanhas de TV ou impressos (jornal, revista) para ampliar o conhecimento sobre audiência que interagiu com o anúncio”, enumera.
Vicente Varela, chief data & media officer da Lew’Lara\TBWA, passamos a euforia de ter grandes bases de dados. “Agora temos listas, clusters e segmentações mais claras e estratégicas, que nos permitem acionar esses dados com mais facilidade e maturidade. Um fato positivo é que cada vez mais vejo essas fontes de dados vindo como first party data dos clientes, dependendo cada vez menos de dados de terceiros ou dados genéricos”, analisa.
Cassemiro, da Publicis, destaca que a cultura de dados nos negócios está diretamente ligada ao desenvolvimento da tecnologia, e como ambos são campos de constante evolução é impossível afirmar quando o ecossistema do marketing vai chegar no ponto ideal de sua evolução. “No entanto, é evidente que a disciplina de inteligência de dados se permeou totalmente no marketing e na comunicação. Se num passado recente as áreas de dados e suas respectivas plataformas estavam concentradas nas agências, hoje o cenário é diferente: anunciantes amadureceram seu conhecimento no marketing digital, o que, consequentemente, alavancou a disciplina de dados entre eles. Os produtos atuais (não finais) dessa curva de desenvolvimento são discussões mais maduras e ricas sobre resultados entre agências e anunciantes”, reflete o head do Brainlab.