Pagliarini: “A sociedade está cobrando uma atitude mais fair de empresas, de instituições e de governantes” (Unsplash)

O Brasil é assim mesmo… Só podia ser no Brasil… Esse país não tem jeito… Infelizmente, a sucessão de fatos atuais e a convivência com líderes medíocres (para dizer o mínimo) nos faz seres ranzinzas e pessimistas, incapazes de retomar o posto de um dos povos mais alegres e esperançosos do mundo. De fato, não está fácil.

Conviver com as barbaridades geradas por aqueles que deveriam ser condutores de processos de melhoria inibe sorrisos e o bom humor, tão presentes historicamente na sociedade brasileira. E tudo isso potencializado por uma pandemia que parece ter sido gerada nos livros de ficção.

Mas não podemos deixar de sonhar e de nos mobilizarmos na busca do melhor para nós, brasileiros, e a sociedade, como um todo. Na semana passada, entre uma cervejinha e outra (com as devidas precauções) com dois amigos, um deles, diretor-geral de uma empresa internacional no Brasil, apresentou uma ideia ao outro, VP de um grande time de futebol (não o meu time, mas vá lá…).

Ex-atleta e admirador do rúgbi, esse amigo lembrou a forma disciplinada e respeitosa com a qual os atletas desse esporte se comportam nas competições.

Sim, o rúgbi é um esporte de muito contato e pode parecer violento aos que o assistem, mas há uma total disciplina e um ambiente de fair-play entre os adversários e juízes. Por exemplo, somente o capitão do time se dirige ao árbitro, e o faz de forma respeitosa, sem “peitar” ostensivamente sua decisão.

Ao término do jogo, os atletas se cumprimentam educadamente, mesmo que o resultado tenha sido desastroso para um dos times. Comparando essa atitude com o nosso principal esporte, o futebol, temos uma visão antagônica, onde prevalece a malandragem e o xororô explícito a cada decisão do árbitro.

Jogadores vão ameaçadoramente na direção do juiz, com dedo em riste, questionando cada decisão. Tendo esse mau exemplo como padrão, jovens talentos do futebol, na primeira oportunidade profissional, reproduzem esse comportamento no mínimo questionável. Se o futebol é um espelho da sociedade brasileira, estamos mal… E aí veio a proposta: e se um grande time de futebol tomasse a iniciativa de mudar esse jogo?

Convoque-se diretores, técnico e atletas e estabeleça-se um novo padrão de comportamento. O juiz se equivocou em algum lance? Deixe o capitão se dirigir a ele.

Terminou o jogo? Não importa o resultado, vá cumprimentar o adversário respeitosamente. Trate o adversário como um competidor, não um inimigo. Assuma posicionamentos de fair-play durante todo o jogo – antes, durante e depois.

Você poderá estar pensando: não vai dar certo. Futebol é guerra. A torcida cobra uma atitude de guerreiro e aplaude a entrada faltosa e o desrespeito ao juiz. Isso é utópico. Pois é… Pode até ser. Mas você não está cansado dessa distopia?

Será que não é hora de sermos um tanto quanto utópicos? Parecia utopia empresas concorrentes deixarem a competição de lado e se unirem em projetos sociais. Mas está acontecendo.

Parecia utopia as empresas deixarem de lado o capitalismo selvagem e partirem para um modelo mais consciente e empático, procurando o bem, não só dos seus shareholders, mas de todos os stakeholders e da sociedade, como um todo.

Parecia utopia ter equilíbrio de gêneros e respeito total às diferenças entre funcionários de uma empresa. Mas o fato é que a sociedade está cobrando uma atitude mais fair de empresas, de instituições e de governantes. Uma atitude mais amigável, mas não menos firme.

Uma atitude propositiva. Se esse comportamento positivo não aparece nas mais altas esferas do poder, quem sabe não podemos fazê-lo prevalecer por intermédio das expressões mais populares.

Via futebol, por exemplo. Não sei se a conversa desses dois amigos vai desaguar em alguma iniciativa concreta. Mas fico aqui torcendo. Posso ser utópico, mas sei que não sou o único.