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País com o maior investimento publicitário da América Latina, uma média de R$ 120 bilhões por ano, pela métrica de investimentos brutos em mídia do Kantar Ibope Media, o Brasil não contempla no seu modelo a remuneração de agências convidadas para participar de processos de seleção.

Uma pesquisa da Scopen, ex-Grupo Consultores, mostra que apenas 10,2% das concorrências (ver tabela) realizadas pelos anunciantes têm algum tipo de incentivo financeiro. Das análises de fornecedores de serviços de comunicação, 84,5% não estabelecem nenhum tipo de pagamento às agências envolvidas. Para 5,3% da amostra, não há nenhum tipo de budget para empresas interessadas em prestar serviços de comunicação. Segundo a Scopen, a média destinada às agências no mercado brasileiro é de US$ 2,7 mil. A média global de remuneração de agências chega a 16,9%. Em países como Espanha e Reino Unido, ela chega a 32,7% e 24,6%, respectivamente (veja tabela abaixo).

O comportamento dos anunciantes brasileiros difere do mercado argentino, em que 29,5% das agências têm um budget para participar de concorrências. Mas 59,6% ignoram esse aspecto. Na Colômbia, mercado que vem ganhando reputação com sua evolução econômica, a situação é pior do que no Brasil: apenas 3,2% recebem uma bonificação para elaborar estratégias com base em um briefing. No Chile são 4,7% que pagam às agências convidadas.

“O pitch continua sendo o processo mais habitual. O problema no Brasil e na região é que poucos anunciantes remuneram as agências participantes no processo. A Argentina é o país onde os anunciantes mais remuneram nas concorrências”, explica Cesar Vacchiano, presidente e CEO da Scopen, responsável pelo estudo Agency Scope. “O nível de excelência do serviço prestado pelas agências fica refletido nos elevados níveis de satisfação, uma média de 84%, e na baixa predisposição a mudança: só 11,7% dos anunciantes estão dispostos a trocar de agência”, ele acrescenta.

Vacchiano também ressalta outro dado do estudo, sobre como os anunciantes brasileiros consideram as suas agências parceiros estratégicos. “As empresas reconhecem que as agências ajudam em mais de 50% no volume de acréscimo de negócios. Isto é muito relevante e reflete que elas estão convencidas do talento, inovação e ideias que as agências aportam e ajudam a incrementar as vendas e o seu valor de mercado. O segundo país da América Latina em que há maior valorização de agências é a Colômbia (33%), seguida da Argentina (32%)”, argumenta.

A consultoria SPGA, que orienta anunciantes em processos seletivos para contratação de agência, acredita que há um novo momento e não recomenda a seus clientes remunerar agências em concorrências. “Sugerimos a apresentação de ideias com base em um briefing. O anunciante precisa conhecer as linhas de pensamento estratégico da agência. Não há mais necessidade de se fazer uma apresentação espetaculosa, com campanhas produzidas. Ter de pagar para uma agência mostrar a sua capacidade é um desperdício”, observa Luciana Salles Tabith, sócia e diretora da SPGA.

Orlando Marques, presidente da Abap (Associação Brasileira das Agências de Publicidade), acredita que a remuneração só é necessária quando o anunciante prescreve os procedimentos. “Mas se for só o custo interno, não há necessidade. Tenho visto anunciantes perdidos em concorrências. Se convidam 25 agências é porque não são seguros”.

Alexis Pagliarini, superintendente da Fenapro, afirma que a entidade, em parceria com a Associação Brasileira de Anunciantes, lançou um guia de boas práticas para seleção de agência que prevê remuneração. “São poucas as concorrências que preveem remuneração. Uma remuneração adequada faria os clientes serem mais criteriosos numa pré-seleção de agências para uma concorrência e minimizaria os custos decorrentes de uma apresentação mais elaborada”, atesta Pagliarini.

O Brasil exerce influência no Cone Sul. “O que ocorre no país influi muito em outros mercados pela sua importância econômica. Os anunciantes e as agências de outros países da região estão muito dependentes do que acontece no Brasil. As desvalorizações ocorridas na Argentina, Brasil, Colômbia e México no último ano estão afetando investimentos em marketing e publicidade das multinacionais, que não têm visto suas previsões de lucro cumpridas devido às perdas cambiais”, detalha Vacchiano.

Os acontecimentos políticos e a conjuntura econômica no Brasil, segundo as palavras de Vacchiano, estão sendo observadas com atenção. “A imagem do Brasil no mundo foi afetada pelos casos de corrupção política e as manifestações públicas dos cidadãos pró e contra o governo. É importante que os Jogos Olímpicos estão aportando um balanço positivo pela imagem do país e, finalmente, estão sendo uma boa ação de relações públicas para o Brasil ante o resto do mundo”.

Vacchiano acrescenta: “Lamentavelmente a crise econômica também interfere nas relações entre anunciantes e agências. Os anunciantes buscam a redução de todos os seus custos, inclusive de comunicação e marketing. Eles estão reduzindo os budgets com a intenção de reduzir os fees de suas agências. Como consequência, alguns convocam concorrências, muitas vezes buscando renegociação dos fees. Uma loucura porque se perde tempo e, irremediavelmente, talento e motivação dos partners. As agências se defendem oferecendo serviços adicionais em disciplinas que não têm expertise, para não perder negócios, mas que geram insatisfações posteriores dos clientes”.

O CEO da Scopen afirma ainda que a crise é problemática porque provocou o fechamento de empresas. “Mas ela pode trazer oportunidades e fortalecer a posição das agências. Em épocas de crise é importante propor uma comunicação que fortaleça as marcas para proporcionar ganhos futuros. É mais importante manter conversas honestas e transparentes com as agências, para, de forma conjunta, buscar soluções para os problemas do que simples e comodamente buscar redução dos fees. A agência, com seu talento, experiência e visão, poderá ajudar os seus clientes, fazendo coisas diferentes e com custos menores para enfrentar esses tempos mais difíceis”.

O Agency Scope também apontou que o investimento em marketing digital no Brasil era de 22%, em 2014. “Estamos seguros de que esta cifra será acrescentada nos resultados da edição 2016 do estudo, estando seguramente próximo aos 30%, como ocorre no Reino Unido”, diz Vacchiano, que promete apresentar em novembro o resultado da pesquisa que teve campo no segundo trimestre deste ano para ouvir as impressões de CEOs, executivos de marketing e profissionais de agências sobre sua visão aos serviços prestados por empresas de publicidade, live marketing e relações públicas”.

“Os anunciantes brasileiros também desejam trabalhar com agências integradas mais do que com agências especializadas por disciplinas (publicidade, digital e live marketing). Esta é uma tendência mundial. A importância do planejamento estratégico cresceu muito no Brasil nos últimos anos, igualando-se, em muitos casos, à criatividade. Vemos isto claramente nas análises de definição da agência ideal, fatores para selecionar agência ou importância dos atributos de serviço. Os anunciantes que estão procurando uma nova agência dão muita importância ao trabalho desenvolvido pelas agências no passado. Esses cases são um fator-chave na hora de produzir a long list. Cada vez mais os cases são fundamentais para que os anunciantes possam avaliar o talento e a eficácia das agências”, finaliza Vacchiano.