Apesar da curva ascendente, mercado de embalagens enfrenta questões ligadas a preços e abastecimento, mas os novos hábitos de compras indicam caminhos de crescimento (Freepik)

O poder de sedução das embalagens é um conhecido aliado do marketing para influenciar a decisão de compra dos consumidores no ponto de venda. Mas um novo cenário se formou com a pandemia da Covid-19. O distanciamento social acelerou a explosão do e-commerce e, longe das gôndolas, as pessoas passaram a escolher das telas, onde os produtos aparecem in natura, sem invólucro. O surto do coronavírus trouxe ainda o receio de contaminação por meio das embalagens.

E o que dizer do meio ambiente? Plásticos, vidros, papel e alumínio se amontoam na natureza exigindo investimentos em reciclagem, prática com representatividade pífia no mercado nacional. De acordo com estudos do WWF feitos com base em dados do Banco Mundial, o Brasil é o quarto país que mais gera plástico no mundo, porém recicla menos de 2% do total de 11,3 milhões de toneladas. A média mundial é de 9%.

Representantes do setor se posicionam sobre os principais entraves vivenciados por uma atividade tradicionalmente conhecida por aferir o avanço da economia. O valor bruto da produção física de embalagens é estimado em cerca de R$ 92,9 bilhões em 2020, alta de 22,3% em relação aos R$ 75,9 bilhões atingidos em 2019. O aumento foi de 0,5% no ano passado, seguindo a tendência verificada nos exercícios anteriores, com crescimento de 3,1% em 2019, de 2,6% em 2018 e de 1,9% em 2017.

A perspectiva é de que a produção de embalagens cresça entre 4,4% e 5,9% neste ano ante 2020, segundo projeções do Estudo Abre Macroeconômico da Embalagem, elaborado pela FGV para a Associação Brasileira de Embalagem (Abre). Apesar da curva ascendente, o cenário guarda desafios para manter margens adequadas mesmo com a disparada do dólar, cotação usada para a compra de matérias-primas como petróleo e celulose. “Os repasses, de toda forma, deverão acontecer”, sinaliza Marcos Barros, presidente da Abre. O impacto vem também da escassez de insumos em decorrência do aumento no consumo mundial, especialmente da China.

Roberto Kanter, da FGV: “Surge um novo conceito” (Divulgação)

Já o abastecimento busca um fluxo regular. Apesar da estabilidade, o ajuste entre suprimento e demanda do ecossistema da embalagem só deve voltar ao equilíbrio no fim do terceiro trimestre de 2021. “O setor continuará crescendo, porém não nos níveis experienciados até o momento”, prevê Barros.

Um dos principais players do setor, a multinacional de origem sueca Tetra Pak não enfrenta problemas para o recebimento de matérias-primas e produção das embalagens, mas admite que “algumas empresas têm relatado dificuldades, principalmente no caso de insumos importados que dependem da variação cambial, o que encarece o produto”, comenta Vivian Haag Leite, diretora de marketing da empresa presente no Brasil desde 1957. Hoje, a companhia sediada na Suíça fabrica mais de 11,7 bilhões de caixinhas no mercado nacional, feitas majoritariamente de materiais renováveis e recicláveis, mantendo desempenho similar ao registrado em 2019.

Pacote verde
A indústria intensifica a busca por soluções em prol da natureza. “Uma embalagem sustentável deve ser feita principalmente de materiais renováveis, e ser totalmente reciclável”, defende Vivian. A Tetra Pak não recomenda a reutilização para assegurar a proteção dos alimentos, e sim a reciclagem para que as caixinhas sejam transformadas em outros objetos após o descarte. Podem ser produzidos telhas ecológicas, cadernos, canetas e até partes de bicicletas. Entre os projetos encampados pela Tetra Pak estão o Rota da Reciclagem e o Recicla Cidade.

O posicionamento da Abre cabe no mesmo pacote. O trabalho pretende conscientizar o consumidor sobre o descarte adequado, além de incentivar a economia circular a fim de que “toda embalagem volte para a indústria e sirva de matéria-prima para a produção de novas embalagens”, diz Barros. Segundo o executivo, o problema não está na embalagem e sim na forma como ela é utilizada e descartada.

Vivian Haag Leite, diretora de marketing da Tetra Pak Brasil: “Uma embalagem sustentável deve ser feita principalmente de materiais renováveis, e ser totalmente reciclável” (Divulgação)

“O processo de circularidade é uma iniciativa de toda a sociedade”, alerta Barros. Não só os convertedores, que são os fabricantes, mas também as marcas são orientados a pensarem nas embalagens desde a conceitualização do produto. “A indústria já vem inovando para manter a sua relevância”, crava a diretora de marketing da Tetra Pak Brasil. A companhia estuda diferentes materiais.

Desde 2011, usa o plástico verde obtido a partir da cana-de-açúcar, incorporando recursos renováveis na caixinha, em adição ao papel, que representa cerca de 70% da embalagem. “Iniciamos testes na Europa para a introdução de polímeros reciclados às nossas embalagens, que deverá ser expandido para outros mercados conforme avançarmos no projeto”, revela Vivian.

A Tetra Pak ainda está atenta às oportunidades trazidas pela digitalização. As embalagens conectadas são um exemplo. Códigos impressos nas laterais das caixas podem ser escaneados, abrindo a possibilidade de rastreamento para melhorias pelos produtores, maior visibilidade e controle de estoque para insights pelos varejistas, e interações por meio de realidade aumentada pelos consumidores.

“No último ano, mais de 600 mil embalagens de leites e sucos foram escaneadas durante a ação de Ad on Pack”, relata Vivian. Gamificação e conscientização transformam as caixinhas em plataformas de marketing, mas o professor Roberto Kanter, especialista em marketing e professor dos MBAs da FGV, lembra que as potencialidades do setor ainda não foram completamente exploradas.

Cena de filme da campanha Escolha Natureza. Escolha Caixinha, veiculada globalmente pela Tetra Pak neste ano (Reprodução)

“A lógica ainda parte do varejo físico. As empresas precisam começar a pensar a partir do digital. O peso das embalagens mudou”, destaca Kanter. O futuro aponta para experiências capazes de tornar as embalagens tão desejadas quanto no mundo físico. “Um novo conceito surge, inclusive trazendo alternativas de redução de custos”, indica.

Pandemia e comunicação
Um dos receios causados pela Covid-19 foi a contaminação das embalagens. De acordo com a Abre, a transmissão era praticamente inexistente nas fábricas devido aos protocolos de segurança adotados. “Conforme hoje as estatísticas mostram, não há contaminação desse tipo”, comenta Barros.

Apesar da perda de poder aquisitivo e de novos hábitos impostos pelo distanciamento social, as empresas conseguiram se adaptar. Com a centralização do consumo nos lares, houve um aumento expressivo na utilização de embalagens para alimentos. “O porcionamento das unidades exige uma necessidade maior de embalagens”, confirma Barros, da Abre.

A crise sanitária ainda reforçou a importância da segurança alimentar. “Mantivemos abertos nossos canais para esclarecer sobre a higienização”, conta Vivian. A Tetra Pak ainda apostou em novos formatos de comunicação, como o podcast Caixas de Ideias. Extensão de blog homônimo, o programa fala sobre o impacto de transformações sociais na produção e consumo de alimentos e bebidas.

Campanhas sobre sustentabilidade são lançadas anualmente pela empresa. Neste ano, foi a vez do projeto global Escolha Natureza. Escolha Caixinha, que convoca a sociedade a assumir um papel proativo na preservação dos recursos naturais. A ação integra landing page, videomanifesto, webinar, anúncios em veículos de mídia especializada, conteúdo de marca e plano de mídia nos canais-proprietários da Tetra Pak. Atualmente, a companhia trabalha com diferentes agências, dependendo do projeto realizado e escopo definido.