Em outubro de 2016, comecei a dividir meu tempo entre Londres, São Paulo e Rio de Janeiro. As noites e fins de semana que passei sozinho em Londres, no período em que minha família ainda estava no Brasil, me motivaram a começar a escrever a autobiografia que os meus amigos da editora Estação Brasil/Sextante, Marcos Pereira e Pascoal Soto, vinham me cobrando há algum tempo e deve sair agora em abril.
Depois daquele outubro recordei coisas, fiz muitas anotações e escrevi páginas e mais páginas, mas só tive a certeza de que estava no caminho certo quase um ano depois, no início de agosto de 2017.
Foi quando fui ver a exposição Matisse in the Studio, no Museu da Royal Academy de Londres.
Essa exposição, que não tinha nenhuma obra do Matisse, mas tinha os livros que ele lia, os discos que ele ouvia, os objetos que compunham o seu ambiente de trabalho e as obras de outros artistas que ele pendurava nas paredes, me deu a certeza – obviamente sem nenhuma comparação, o que seria ridículo da minha parte – de que eu estava no caminho certo, contando a minha história a partir das coisas que me cercaram e me influenciaram nesses anos todos – a maioria delas ligada à vida no seu sentido pleno – e não apenas à publicidade.
Matisse in the Studio, pra mim, foi inspiração e me deu segurança pra ir em frente com o livro Direto de Washington. W. Olivetto por ele mesmo.
Lugares que me inspiram não faltam em Londres.
Comprei pra mim e pro meu filho, Theo, todos os jogos do Tottenham, em Wembley, na temporada 2017/2018, incluindo partidas contra o Manchester United e o Chelsea, pela Premier League, e jogos contra o Real Madrid e a Juventus de Turim, pela UEFA Champions League.
O material que recebo por email antes e depois de cada uma dessas partidas, os impecáveis programas impressos de todos os jogos, os almoços e jantares acompanhados de um bom vinho no Wembley Club, a poucos metros dos nossos assentos, e as partidas intensamente disputadas até o último segundo, com lealdade e sem simulações de faltas, me inspiram a imaginar como poderia ser o futebol brasileiro se, além do talento natural dos nossos jogadores, tivéssemos também uma estrutura verdadeiramente profissional dentro e fora de campo.
Outra inspiração que me faz pensar no Brasil ocorre quando vou à Tate Modern ver uma retrospectiva do David Hockney, as esculturas do Giacometti, ou a coleção de fotos do Elton John, que, para quem não sabe, além de pop star, é um dos maiores colecionadores de fotografias do mundo.
Quando vejo o espetacular prédio da Tate Modern, boa parte pago pela Unilever, que percebeu que uma nova Tate poderia revitalizar aquela área de Londres onde ficava a sua matriz, me inspiro em pensar nas muitas coisas que as mais bem-sucedidas empresas brasileiras poderiam fazer pelas artes no Brasil.
Ou quando me surpreendo por não ter a mínima vontade de comprar um carro devido à qualidade dos undergrounds, ônibus, barcos e bicicletas londrinos, interligados num só cartão Oyster, que me inspiram a imaginar como seria bom se cidades como São Paulo e Rio de Janeiro tivessem transportes públicos de qualidade e interligados.
A verdade é que Londres me inspira a pensar no que falta no Brasil, mas me inspira também a pensar no que sobra no Brasil, e eu não estou pensando nos políticos corruptos. Estou pensando no que sobra de talento.
Quando vou ao Barbican Centre ver Gilberto Gil & Cortejo Afro, ou quando ouço as canções do Celso Fonseca, do Marcos Valle e da Bebel Gilberto tocando repetidas vezes no bar do Claridge Hotel, em Mayfair, ou no Estiatorio Milos, da Regent Street, me inspiro em pensar que o Brasil já fazia World Music muito antes da expressão World Music ser inventada. Assim como já fazia World Advertising escrita em português há muitos e muitos anos e precisa continuar fazendo.
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