O Brasil – quarto país com mais inscrições no D&AD este ano – torna-se cada vez mais estratégico para o futuro da premiação inglesa. Segundo Pablo Brandão, brasileiro responsável pela expansão internacional do D&AD, o objetivo agora é estabelecer uma parceria com o Brasil inicialmente por meio do projeto New Blood – seja levando-o para o Brasil, ou trazendo jovens brasileiros para participar dele aqui. Uma parceria com o CCSP (Clube de Criação de São Paulo), por exemplo, está sendo conversada.
O New Blood é um programa de formação de jovens na indústria criativa inglesa hoje apoiado pelo grupo WPP e que inclui estágios remunerados em agências e o “New Blood Academy”, um intenso treinamento de duas semanas realizado no mês de julho. “O New Blood foi muito importante para a indústria britânica nos últimos 30 anos. A meta agora é criar parcerias internacionais com instituições que tenham a mesma cultura que o D&AD, sem fins lucrativos, que devolvam os investimentos para a comunidade criativa”, observou Brandão.
Luiz Sanches, presidente do júri de Press e que vem acompanhando de perto as mudanças no D&AD, diz que definitivamente o festival se internacionalizou. “Eles se preocuparam em convidar mais jurados internacionais e entregar a presidência para mais pessoas de fora. É interessante observar que no meu grupo, de oito pessoas, há somente dois ingleses, sendo que um deles representa Singapura, pois trabalha lá. É uma grande evolução. Eles estão mais preocupados com o que acontece fora da Inglaterra”, disse Sanches.
Prêmio muda de lugar
A partir do ano que vem o prêmio D&AD transfere-se do Olympia – estação de trem desativada nos anos 30, em Kensington – para a charmosa região em East London chamada Shoreditch, bairro onde fica o escritório do D&AD. A intenção é realizá-lo em uma antiga cervejaria na Brick Lane. O CEO do D&AD, Tim Lindsey, diz que a mudança será boa para o evento, já que aquela é “a região onde as coisas estão acontecendo”. Estão nesse “hub cultural” diversas agências, como W+K e R/GA, e vários estúdios de design.
Embora tenha o desejo de tornar o D&AD global, Lindsay diz que jamais cresceria nas proporções de um Cannes Lions, por exemplo. A ideia é que as diferentes áreas do festival cresçam como número de associados – inclusive pelo mundo –, programas de treinamento, eventos, parcerias, patrocínios. “Queremos realmente manter o padrão de qualidade, e crescer demais impossibilita isso”, diz o presidente.
Ele destaca que a maior diferença entre o D&AD e Cannes é para onde vai o dinheiro arrecadado com a premiação. No caso do D&AD, o montante é todo aplicado em programas que beneficiam a própria indústria do design e da propaganda. “Fazemos bastante dinheiro, mas aplicamos no nosso programa New Blood, que identifica e forma novos talentos do mundo criativo – o que faz com que as pessoas mais importantes da indústria sempre encontrem tempo para participar do evento nos júris, e assim por diante”, diz Lindsay.
Tensão entre propaganda e design eleva a qualidade
Há uma “tensão positiva”, como diz Lindsay, entre a propaganda e o design no D&AD. É justamente essa tensão que torna a premiação interessante, na opinião de Lindsay, e torna o “craft”, lado artesanal e artístico dos trabalhos, o seu foco principal – a ponto de julgar, por exemplo, apenas o texto em si em peças de publicidade ou design.
“Há diferenças importantes entre o design e a propaganda. Os designers se veem primariamente como solucionadores de problemas. Mas a propaganda é mais orientada para vendas e resultados. O fato de ambas as áreas terem crescido juntas no D&AD foi o que tornou a premiação o que ela é, com grande foco em craft e execução. É algo fantástico: bom para os negócios e para manter o seu padrão de qualidade”, diz Lindsay.
O presidente do festival destaca também o crescimento do número de categorias – hoje 24. É possível que no ano que vem haja mais uma ou duas. Tudo depende das sugestões dos jurados. A categoria de “Music Videos”, por exemplo, voltou na edição de 2014 depois de um intervalo de um ano. Há também várias novas subcategorias este ano, como Tactical Advertising (propaganda tática) nos júris de Press, Rádio, Outdoor e Digital. A subcategoria Inovação também foi inserida nos júris de Integrated, Digital Marketing e Digital Design.
Júris “peneiram” os trabalhos, em busca do premiável
O primeiro dia realmente movimentado no pavilhão Olympia, onde é realizado o D&AD, foi marcado pela missão de peneirar o melhor e criar uma lista de finalistas – de onde será retirado primeiro aquilo que vai para o In-Book – o equivalente a um bronze –, depois as Nominations – o equivalente a prata – e por último os Yellow Pencils – que equivalem ao ouro.
Luiz Sanches, sócio e diretor-geral de criação da AlmapBBDO, que preside o júri de Press, encerrou o dia relativamente cedo, às 15 horas, depois de escolher uma espécie de shortlist do que será In-book e depois Nominations. Segundo ele, a qualidade do trabalho é visível. “Houve um aumento em inscrições – mais de mil em Press. Inicialmente achei que os responsáveis por isso eram novos mercados, mas de uma maneira geral estão todos colocando energia nessa categoria. Vi muitas coisas da Inglaterra.”, diz.
Sanches acredita que o trabalho inscrito no D&AD tem qualidade superior ao que vai para o Cannes Lions, por exemplo. Até porque as chances de ganhar são menores. Ele considera que o Brasil irá bem nessa categoria. “A tendência aqui em Press é, como há mídias mais interativas, buscar-se essencialmente a síntese. Isso dá um novo frescor a essa mídia, síntese na forma de pensar. Está tudo mais simples”, analisa Sanches.
Fernando Campos, sócio e diretor de criação da Santa Clara, jurado da nova categoria Integrated & Earned Media, está entusiasmado e diz que viu coisas muito boas do Brasil. “É uma categoria muito interessante e com poucas peças: começamos com 350, chegamos a 55. Vi pelo menos três coisas muito boas do Brasil”, comentou. Há também a clássica sensação de que uma mesma campanha foi inscrita em categorias demais, como destacou Rui Branquinho, vice-presidente de criação da Y&R e jurado brasileiro em Outdoor. “A partir de um certo momento decidimos esquecer o que de Outdoor estava inscrito em outras categorias, pois atrapalharia muito a performance das peças”, disse.
Existe, ainda, uma certa confusão devido a peças com características muito diferentes entre si inscritas numa mesma categoria. Isso parece ser a tônica de festivais de criatividade que se tornam grandiosos. Foi o que comentaram, por exemplo, Gustavo Piqueira (Casa Rex), jurado brasileiro em Graphic Design e Guilherme Jahara (F.biz), jurado em Direct. “Há cartazes, peças de mídia impressa e inúmeros outros formatos inscritos em Direct, por exemplo. Fomos orientados a buscar peças que de fato atinjam uma pessoa de maneira certeira, mas não é fácil. E há as subcategorias em Direct, também, como direção de arte e redação. Devem surgir boas discussões, porque não é fácil definir o que é bom em um ou outro aspecto”, comentou Jahara.
Um dos destaques do D&AD é, segundo os jurados, a possibilidade de ver e tocar os materiais físicos, expostos ao longo de mesas espalhadas confortavelmente por todo o pavilhão e sob constante supervisão do staff do evento, para que nada desapareça. A circulação no imenso pavilhão Olympia é altamente controlada. “Ver a peça em si, sua textura e impressão, é muito diferente. O craft é muito valorizado”, comentou Jahara.
O desafio é grande especialmente para categorias tão específicas como “Writing for design”. O escritor inglês Tim Rich, por exemplo, jurado da categoria – que teve apenas 85 inscrições –, diz que procura separar o talento da escrita nas peças, que vão desde filmes, websites e livros a posters e produtos. “Procuro analisar se o texto me faz sentir algo diferente ou se valoriza a peça, se faz sentido no contexto”, explica.
Há um critério geral para os jurados, no entanto, que lhes dá um norte e garante o rigor da competição: premiar ideias originais e inspiradoras, com execução excepcional e relevantes ao seu contexto. Menos de 20% do material inscrito se encaixará nesses critérios. No ano passado foram distribuídos apenas 55 Yellow Pencils e quatro Black Pencils. Com o aumento do volume geral de inscrições em 10%, esse número tende a aumentar. Mas só um pouco.