Frederico Reder: "o melhor negócio é fazer o que se ama"

Aos 31 anos, Frederico Reder é um dos mais bem-sucedidos empreendedores culturais do país. Dono do Theatro Net (antigo Tereza Raquel), no Rio de Janeiro, e do Theatro Net do Shopping Vila Olímpia (SP), ambos em acordo de naming rights com a operadora de TV paga, toca também a Brainstorm Entretenimento, focada em projetos que unem marcas à cultura. Ator desde os 9 anos, aprendeu a fazer tudo em um teatro e dirigiu um circo na Arábia Saudita. Reder torna o teatro um bom negócio no Brasil a partir de um modelo de gestão que vem sendo considerado inovador. Ele costuma dizer que, para gerir um negócio desses, é preciso ser artista. A seguir, a entrevista com o empresário e produtor cultural.

Quando você começou no teatro?

Eu tinha 9 anos, era garoto. Nasci em São Gonçalo, no subúrbio do Rio, e isso faz toda a diferença na minha trajetória: a conquista. Minha mãe tinha uma escola de ensino infantil e fundamental e ali entrei em contato com cultura, arte e teatro. Certa vez um grupo de teatro foi à escola e fui chamado para um teste. Comecei a fazer peças. Passei a produzir por necessidade e desejo de ver as coisas realizadas. Montei uma companhia de teatro e, aos 15 anos, tinha um espetáculo em que eu atuava, dirigia e havia feito praticamente tudo no Shopping da Gávea, na Zona Sul do Rio. Fiz o Circo Reder, também no Shopping da Gávea. Sempre fui apaixonado por circo e me envolvi com ele diversas vezes. Em 2002, a Cíntia Abravanel, que é minha madrinha, me convidou para morar em São Paulo e levar minha peça – “Cantarolando” – para o Teatro Imprensa. Lá fui convidado a dirigir um circo na Arábia Saudita, em Gedah, cidade onde nasceu Bin Laden. Fui em 2004 e fiquei três meses. Em 2006, voltei com uma companhia de 40 artistas para mais quatro meses.

Como você se tornou dono de teatro?

Nunca tive esse sonho. Eu não frequentei o Tereza Raquel, por exemplo. Quando passei lá pela primeira vez, era uma igreja. Entrei, olhei e saí. Dez anos depois, isso faz três anos, me tornei dono do espaço.

A possibilidade de parceria com uma marca viabilizou essa compra?

Os naming rights ainda são relativamente novos no Brasil. Isso viabiliza os diferenciais que temos de operação. Só com patrocínio consigo dar desconto de 50% para até quatro ingressos do cliente da Net. Só com patrocínio consigo ser uma casa que não cobra um mínimo que é a locação por dia da produção. Por isso fui indicado ao Prêmio Shell, ao Prêmio ABTR de teatro. Por conta do nosso modelo de gestão, da reinvenção desse negócio. Não temos papel no teatro, só TVs de led. Ninguém tem de fazer banner. Nós oferecemos tudo. O chão é de madeira de demolição. Em São Paulo, é feito de cruzetas, de postes da Eletropaulo. Eu preciso de um teatro sustentável, que gire, que seja saudável.

É bom negócio ser dono de teatro?

O melhor negócio é fazer o que se ama. A criatividade torna o negócio sustentável. É a economia criativa. Somos o primeiro teatro dessa nova geração a trabalhar de domingo a domingo. Ocupamos todos os dias com shows, eventos, dança e teatro. Temos o conceito de ser “palco para todas as artes, para todos”. Atendemos todos os públicos. E fomentamos isso. É um palco para a cultura e o artista brasileiro.

Como as marcas entram?

Quando eu convido uma pessoa para ir ao teatro não digo: “Vamos assistir Noviças Rebeldes, com patrocínio da Sul América”, e sim: “Vamos assistir Noviças Rebeldes, no Theatro Net”. Existe uma pesquisa de uma professora da Unirio com números dos naming rights, que provou o quanto a estratégia traz ganhos para a marca. O projeto proprietário traz muito retorno para a marca porque batiza um feito. Há um ano e meio o nome do nosso palco é Palco Petrobras Premmia. Neste momento, o desafio é nos tornarmos o primeiro teatro do mundo 100% acessível. Na prática, isso significa que todas as sessões têm intérprete de libras, legendas, audiodescrição, programação em braile, em todas as TVs de led um fone com áudio, intérprete de libras em todos os vídeos do teatro. Tudo isso em qualquer atividade nas duas salas do Theatro Net. A casa vai ser 100% acessível. Esse é nosso novo conceito, é o que queremos para o Rio e para São Paulo. Buscamos uma empresa que queira essa propriedade. Se Reder fosse uma empresa, ficaria “Reder Acessibilidade”. Trabalhamos, executamos e a empresa se apropria desse feito. Juntos, podemos entregar mais para a população. Por meio dessas ideias inovadoras, e até do resgate de grandes ideias, conseguimos inovar, nos manter vivos. Precisamos ser para todos.

Como você fechou a parceria com a Net?

Ofereci à Net – com quem já trabalhava em outros projetos – ser mantenedora do teatro no Rio. Eles quiseram dar nome ao teatro. O sucesso foi muito grande. Nos dois primeiros anos, foram mais de R$ 70 milhões em mídia mensurada e entregue em relatório para a operadora. Fizemos, em dois anos, 149 espetáculos diferentes. Trouxemos mais de 500 mil pessoas e fizemos 926 sessões em 750 dias. Quase 1,2 por dia. É uma programação enorme, democrática, sustentável e diversificada.

Como é o processo de compra de um teatro?

No Shopping Tatuapé, onde iremos inaugurar um espaço mais popular, recebemos o convite dos empreendedores do local. Somos convidados como loja-âncora. O teatro é como uma Casas Bahia. É atrativo para o complexo, mas é caro. O orçamento pode chegar a R$ 30 milhões. Por isso colocamos patrocínios, além do nosso talento de fazer dinheiro e, principalmente, de economizar e trazer parceiros. Temos ainda como parceiros, além de Net e Petrobras, a Rede D’Or e a Kimberly-Clark. Empresas que acreditam e se beneficiam, sem as quais eu não teria crescido. E, em vez de gastar R$ 30 milhões, gastamos R$ 15 milhões. É nosso dom fazer mais com menos. Precisamos, neste mundo tão desigual, respeitar o dinheiro. Quando recebo um patrocínio, entrego para ele em retorno sete vezes o valor que investiu. Temos tudo mensurado. E, acima de tudo, precisamos sempre ter um bom serviço, um bom atendimento e um grande espetáculo. Teatro vazio não bate palmas. Estamos aqui para lotar os teatros e para promover junto às marcas experiências de público. Temos certeza de que esse investimento é importante para a Net.

A conta fecha?

É muito apertado. Lá fora, um ingresso custa, em média, US$ 100. O meu ticket médio, hoje, por conta da meia entrada, é R$ 70. A conta fecha sambando, dançando, fazendo malabares.Para gerir um negócio como esse, é preciso ser artista. É preciso ser muito criativo para achar soluções, criar parceiros, fidelizar o público.

Na crise se vai mais ou menos ao teatro?

O teatro é quase uma sessão de terapia, uma válvula de escape. É uma necessidade básica. Com crise se cresce, se cria, se reinventa. A crise tem seu lado positivo.Na crise as pessoas bebem mais – tanto cerveja quanto cultura. Quando a coisa não está boa, é preciso escapar. Afogar as mágoas. A arte, a cultura e o entretenimento estão a serviço da crise, da emoção, da evolução das pessoas. Eu acho que antigamente, na crise, o Brasil era outro. As pessoas ficavam sem dinheiro mesmo. Hoje as pessoas ficam sem dinheiro para comprar um imóvel, mas não para viver, fazer uma viagem. O Brasil mudou. A crise de hoje é diferente da crise da era Collor.

O que faz a Brainstorm Entretenimento?

Abri com esse nome em 2008. Antes chamava-se Amaralina, em São Paulo. Temos vários espetáculos como “Qualquer gato viralata tem uma vida sexual mais sadia do que a nossa”, com texto de Juca de Oliveira e direção de Bibi Ferreira. Ficou em cartaz no shopping da Gávea e está indo para São Paulo. O espetáculo “E aí, comeu?” de Marcelo Rubens Paiva também está indo para São Paulo. É nosso o musical “Constellation”, em cartaz no Teatro Vanucci, no shopping da Gávea. Já editamos livros, lançamos filmes e shows, fazemos de tudo. Conteúdo é o nosso negócio. Vamos do brainstorming à realização. Agora faremos um musical com o produtor Tadeu Aguiar, chamado “Full Monty” (“Ou tudo ou nada”). A parceria é a alma de um negócio. Ter bons parceiros é o que fertiliza o nosso negócio. Sempre que entro numa empresa para falar de algum projeto pergunto “Qual o seu desafio neste ano? Você tem algum problema com a marca? Quero saber os seus problemas e ser uma ferramenta para você.”

Como a cultura entra no marketing?

Cultura é cultura independentemente de qualquer coisa. E você usa este caminho para contribuir para a evolução de uma marca, das pessoas. A mecânica de investimento na economia criativa é uma ferramenta. Não posso dar detalhes, mas muitas coisas que faço hoje, como espetáculos com temáticas específicas, são encomendas de algumas empresas. Que precisam falar de algum assunto. Ser solução mercadológica, institucional e corporativa já é algo que vem sendo feito. Tive uma empresa que vendia um produto muito “discutível” por ser proibido para menores de 18 anos e queria falar de liberdade de expressão e de escolha. Fui provocado e fizemos um projeto que falava de liberdade de expressão. Outra empresa tinha antipatia pela marca numa determinada região ou no entorno de suas fábricas. Desde sempre, no mundo inteiro, a cultura influencia, forma opinião. A arte é esclarecedora, amplia horizontes.

Você acha que as marcas poderiam investir mais em cultura?

As marcas podem cada vez mais. É uma grande solução. A maior ação que a Net fez no Rio foi justamente a abertura do Theatro Net. Tanto que, depois, abriu o Estação Net e foi um case de sucesso. Ao investir em cultura, muitas vezes parte do investimento vem pelo incentivo fiscal e consegue-se fazer muito barulho com ele. É preciso saber fazer. Num ano de tanta crise, quando não se tem muito dinheiro, é preciso fazer mágica. E o teatro é mágico, as artes permitem, de forma lúdica, entreter, divertir e informar. Muitas empresas nos procuram por falta de dinheiro no departamento de marketing, para trabalhar com incentivo fiscal. Criamos soluções de todas as maneiras. As empresas têm o poder de escolher seus projetos. A parceria tem de ser saudável. Precisa, de fato, ser sustentável. E a reciprocidade para a empresa tem de ser muito bem avaliada. Uma parceria assim pode durar anos. Se o projeto for bom para a empresa e a empresa for boa para o projeto, eles andam de mãos dadas e vão ser felizes.

Quais são seus novos projetos?

Faremos novas casas. Vamos fazer duas salas de espetáculos nos shoppings Tatuapé – uma no Boulevard Tatuapé e outra no Metrô Tatuapé. Região populosa e com um público que cresceu economicamente, mas carente dessa oferta de entretenimento e cultura. Estamos com algumas negociações abertas em outros lugares do Brasil. Também vamos fazer no Shopping Bangu, que tem o mesmo perfil do Tatuapé. Buscamos uma marca que queira estar próxima a esses públicos. Conceituando, elaborando, criando e beneficiando quem merece se divertir, principalmente em um momento de tanta crise.