Os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Tóquio 2020 têm nova data: 23 de julho a 8 de agosto de 2021. A decisão anunciada nesta segunda-feira (30) foi aprovada pelas federações de forma unânime. O adiamento já havia sido anunciado na semana passada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI).

Exceto em três períodos de guerra, quando os Jogos foram cancelados – em 1916, 1940 e 1944 -, jamais uma edição havia mudado de data. A decisão anunciada pelo presidente do COI, Thomas Bach, teve como objetivo garantir a segurança dos envolvidos na organização.

Cerimônia na Grécia com a Tocha Olímpica foi feita sem plateia como forma de segurança em relação ao novo coronavírus; adiamento dos Jogos teve apoio do governo japonês

“Diante das circunstâncias atuais e baseado nas informações dadas pela Organização Mundial da Saúde, o COI e o primeiro-ministro do Japão concluem que a 32ª. edição dos Jogos Olímpicos do Japão precisa ser reagendada para uma data após 2020, mas não depois do verão de 2021, para garantir a segurança e a saúde dos atletas e todos envolvidos nos Jogos, bem como a comunidade internacional”.

O adiamento não surpreendeu o mercado, diante das recentes pressões e questionamentos de comitês, confederações e atletas, mas sua confirmação trouxe reflexos diretos, incertezas e mudanças de rumo nos negócios de comunicação e marketing. Como a realização do evento em uma nova data envolve contratos de empresas de mídia que  detêm os direitos de transmissão, acordos com patrocinadores e toda uma cadeia de agências e fornecedores, houve um efeito cascata de readequações entre os players globalmente. No Brasil, desde a semana passada, os canais começam oficialmente a redesenhar sua estratégia comercial e de conteúdo para mitigar inevitáveis prejuízos.

Para José Colagrossi, diretor-executivo da consultoria esportiva Ibope Repucom, o desafio será negociar os pacotes
de patrocínio com as mesmas condições e valores em um cenário pós-pandemia. “O grande ponto de negociação é a questão econômica. Os pacotes de patrocínio foram negociados em um ambiente econômico estável, o que não está acontecendo agora. O desafio das emissoras de mídia será negociar o pacote para 2021 em condições iguais ou semelhantes, quando o ambiente econômico estará mais desfavorável. Mas isso vai depender de caso a caso, não há uma regra aplicável a todos”.

No Brasil, os canais Band- Sports, Globo e SporTV já começaram a redesenhar suas estratégias de negócios. Segundo Alexandre Barsotti, diretor-comercial da BandSports, já haviam sido negociadas cotas para a SulAmérica e Toyota.  Em outubro de 2019, a emissora colocou no mercado seu pacote de patrocínios para a cobertura in loco no Japão. Estavam disponíveis seis cotas no valor de R$s 11,3 milhões cada.

“Vamos dar prioridade para esses anunciantes quando retomarmos as negociações para os Jogos do ano que vem”, explica. “Ainda é muito cedo e não sabemos quanto tempo vai durar a quarentena. Estamos avaliando todas as consequências que a pandemia vai trazer. É difícil planejar, mas acreditamos que no segundo semestre tenhamos isso mais claro. A decisão impacta o negócio como um todo, já tínhamos investido em passagens, hotel, tecnologia para transmissão, satélites etc.”, completou.

Na Globo, o cenário de renegociação se repete. Seu pacote comercial integrado com SporTV e digital estava sendo comercializado por R$ 96,9 milhões por cada uma das seis cotas, totalizando receita de mais de R$ 580 milhões. Informações obtidas pelo PROPMARK indicam que Bradesco, Claro e Fiat já haviam fechado contrato com a emissora.

Em nota, a Globo deu detalhes de como será a negociação com parceiros: “Tivemos conhecimento do adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio pelo anúncio oficial, não fomos consultados previamente sobre o assunto. […]. O que podemos afirmar é que, diante do atual cenário e da relação histórica de respeito que temos com os nossos patrocinadores, os planos e projetos relacionados à cobertura dos Jogos Olímpicos serão discutidos individualmente com cada um deles após a pandemia”.

Presidente do COI, Thomas Bach, anunciou o adiamento dos Jogos na semana passada

Para Rafael Plastina, advogado e CEO da consultoria Sports Track, são inúmeras as condições desses reacordos comerciais, já que dependem de cláusulas específicas. “Quando há uma ruptura de entrega comercial, os veículos podem compensar com outras veiculações. O contrato pode ainda ser suspenso, ou pode prever um pagamento de seguro. Há uma série de variáveis. Se houve pagamento parcial de receita, quais cláusulas dispõem sobre a devolução do dinheiro? Ou a suspensão do acordo? Tudo depende de cada contrato individualmente”.

Alinhamento global

Os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Tóquio 2020 serão realizados apenas no ano que vem, mas a sua nomenclatura e  as logomarcas serão mantidas. Segundo especialistas ouvidos pelo PROPMARK, a decisão é estratégica, uma vez que boa parte dos materiais de comunicação do COI e de patrocinadores já havia sido produzida. Questões contratuais também tendem a ser resolvidas com a manutenção do nome. Os acordos de patrocínio da P&G e GE com o COI, por exemplo, terminam no fim de 2020, causando uma brecha jurídica, já que a competição não vai acontecer dentro do acordo previsto.

Durante conferência com a imprensa, no entanto, Bach defendeu a extensão do patrocínio desses anunciantes para 2021. “Nós contactamos todos os nossos patrocinadores. Temos seu completo apoio a respeito da decisão [pelo adiamento]. (…) Estes Jogos são chamados de Jogos Olímpicos de Tóquio 2020. Portanto, para mim, é consequência lógica que os patrocinadores do evento mantenham os seus direitos, ainda que os Jogos sejam organizados em 2021”.

A decisão amigável de fazer adaptações nos acordos parece ser a mais acertada para a manutenção do bom relacionamento com os 14 patrocinadores globais do COI. Juntos, Coca-Cola, airbnb, Alibaba Group, Atos, Bridgestone, Dow, GE, Intel, Omega, Panasonic, P&G, Samsung, Toyota e Visa investiram algo em torno de US$ 1 bilhão, ou 18% da receita total do COI no último ciclo olímpico (2013-2016), como divulgado pela entidade. Não há informações sobre valores globais para os Jogos de Tóquio. Já entre as marcas patrocinadoras domésticas da edição no Japão, o COI teve faturamento histórico. Foram negociados mais de US$ 3 bilhões de dólares, segundo o jornal Financial Times. 

Comunicação visual e nomenclatura do evento serão mantidos para o ano que vem

Apesar dos números astronômicos e incertezas em relação a 2021, por enquanto, boa parte dos anunciantes mostram-se favoráveis e colaborativos. Oito dos 14 patrocinadores responderam ao PROPMARK demonstrando otimismo e conformidade com as mudanças. “Respeitamos plenamente a decisão do Comitê Olímpico Internacional (COI) e do Comitê Organizador de Tóquio (TOCOG) de adiar os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020 para 2021. Sabemos que essa decisão foi tomada no melhor interesse da saúde, segurança e proteção de todos. Como patrocinador mais antigo dos Jogos Olímpicos, continuamos comprometidos em trabalhar em conjunto com o COI e o TOCOG para criar um evento bem-sucedido e seguro”, declarou a Coca-Cola.

A P&G também aprovou o adiamento e mostrou-se aberta para renegociações. “É a ação responsável a ser tomada para garantir que os atletas que trabalharam tanto para alcançar seus sonhos olímpicos tenham a oportunidade de competir com confiança e segurança. Continuamos sendo parceiros do COI e do Movimento Olímpico e trabalharemos para ajustar nossos planos de acordo com a situação”.

Sem ainda nova data definida para o evento, o próximo passo do COI é ajustar-se ao concorrido calendário esportivo em 2021, que prevê torneios como o Mundial de Esportes Aquáticos, o de Atletismo, além das tradicionais competições de futebol. A final da Champions League, por exemplo, costuma ocorrer em junho, perto do limite estipulado pelo COI. Os players do mercado esportivo seguem atentos às novas decisões.