No final da comédia “Os Estagiários” (The Internship, 2013), Billy McMahon, interpretado por Vince Vaughn, usa seu poder de persuasão para convencer o resistente proprietário da pequena Rocky Mountain Pizza a anunciar no Google. “Sempre fizemos as coisas do mesmo jeito: páginas amarelas, folhetos e o jornal San Jose”, responde, cético, o dono da modesta pizzaria de bairro. “Se levantar a cabeça, e tomar fôlego, tem muitas possibilidade por aí”, retruca Billy. “Novos clientes, novas franquias. É só a ponta do iceberg. Tudo isso esperando o clique de um botão”, completa Nick Campbell, personagem de Owen Wilson.

A cena fictícia cai como uma luva para contextualizar o lançamento no início de junho da plataforma SIM, desenvolvida pela Globo ao longo de 2019, e apresentada com a proposta de ajudar pequenos e médios empresários, dos mais variados ramos de negócio, a anunciarem em televisão e alcançarem seus públicos de interesse. A ideia de democratizar não é nova. A internet surgiu e permitiu que negócios fossem desenvolvidos exatamente dessa forma. Mas o acesso democrático aos anúncios na maior emissora do país é sem dúvida um marco. Com alguns cliques, o próprio empreendedor pode definir personas, simular campanhas, estabelecer períodos de veiculação, criar filmes (a partir de templates), comprar espaço e pagar pelo serviço, aguardando, por último, a exibição do anúncio.

O lançamento do SIM assustou. Sobretudo a partir da perspectiva de uma boa parte do mercado que ainda opera em formatos obsoletos. A própria Globo não priorizou as transformações durante muito tempo e só agora se começa a ver o resultado de anos de reestruturação e investimento. “Se a gente, historicamente, acabou não tendo uma ferramenta ou solução para este cliente, ele saiu da mídia tradicional ou adotou alguma estratégia de divulgação que só encontrou um caminho nas mídias digitais. Estamos justamente ajustando isso, para ele ter esta oportunidade olhando para o mundo da TV em suas mais diferentes plataformas”, admitiu Eduardo Schaeffer, diretor de negócios integrados em publicidade da Globo.

Ainda é cedo para avaliar todas as implicações da chegada da nova plataforma , em formato beta e limitada a algumas poucas praças. Contudo, tendo a acreditar que ela será um vetor para a aceleração de mercados locais, contribuindo para o fomento das cadeias publicitárias regionais, como argumenta a própria emissora. Aposto também que novas soluções integradoras surgirão e começaremos a ver daqui para frente empreendedores se conectando ainda mais a esse martech da comunicação. Não podemos deixar de lado o volume potencial que isso pode alcançar. Nos maiores players do mercado digital, por exemplo, mais da metade da sua receita vem dos pequenos e médios negócios.

Em “Os Estagiários”, os dois personagens viviam na zona de conforto até serem obrigados a se mover. O que os fazem “virar a chave” e darem a volta por cima no final? O reconhecimento do quanto o comodismo prejudicou suas vidas e o quão importante é se adaptar e ter abertura para aprender coisas novas. Ao se arriscarem, acabaram desbravando novos horizontes e descobrindo um mundo cheio, repleto de possibilidades. Exatamente como fez o próprio Google, que nasceu numa garagem em Menlo Park, decidido a organizar de forma democrática as informações disponíveis na internet, incluindo os pequenos negócios. O resto é história.

Ricardo Valente é sócio e diretor de negócios da Reamp.