Este ano não acompanhei presencialmente o Cannes Lions. Fiquei por aqui, mas não me desliguei do festival. Fiz a minha inscrição online e tive acesso aos materiais restritos à imprensa.

Isso e mais a excelente cobertura habitual do propmark, a informal de amigos (destaque para os reports diários da Binder) e os wrap-ups pós-Cannes (destaque para o da Ampfy), que me fizeram me sentir “presente” no festival.

Preciso esclarecer que já estive em Cannes por mais de 20 vezes, participando, cobrindo e até palestrando (por duas vezes) no Cannes Lions. Isso ajuda a gente a se sentir lá, mesmo não estando fisicamente. Claro que não é a mesma coisa.

As interações extra-festival, tanto nos corredores do Palais e nos espaços distribuídos pela região da Croisette, são superinteressantes. Vivenciar Cannes é sempre especial.

Posso dizer então que curti o Cannes Lions 2023 pela metade. E nesse espírito de encontrar a metade mais bacana de Cannes fiz uma reflexão, que divido com você neste artigo.

Primeiro, a metade mais diversa e inclusiva do festival. É notável a preocupação da organização em ter uma representatividade equilibrada de pessoas pretas, por exemplo, tanto na composição dos júris, como no casting de palestrantes e painelistas.

Essa representatividade beirando 50% apareceu também no conteúdo, com metade discutindo AI e outra metade discutindo diversidade, equidade e inclusão, além das questões ambientais.

Li a respeito da preocupação do festival em ter ainda a informação da pegada de carbono por trás dos cases, além da diversidade no time nos bastidores da produção de cada trabalho. E não é que esse 50 x 50 aconteceu também nos cases mais premiados.

Tive a pachorra de analisar todos os Grand Prix e posso afirmar: a metade deles é formada por cases carregados de propósito, expressões de diversidade e responsabilidade socioambiental.

Um exemplo é o belíssimo case da nossa AlmapBBDO, “EART4”, para a B3 e o Pacto Global Brasil, apresentando a Terra como uma empresa de capital aberto, não escondendo sua fragilidade, mas ressaltando seu potencial, estimulando que “investidores” apostem nessa “empresa” para garantir seu futuro.

Foi Grand Prix em Creative B2B. E o que dizer do emocionante case vencedor de Grand Prix na categoria Direct, pelo qual a Adidas garantiu a reserva o número 321 para corredores de maratona com síndrome de Down, fazendo uma alusão ao cromossomo 321, que é o que define a anomalia da síndrome.

Iniciativa seguida por seus concorrentes, também patrocinadores de corridas pelo mundo. Ainda nessa linha de dar visibilidade à síndrome de Down, vale destacar a iniciativa da Fondation Anne de Gaulle, por meio da Havas Paris, de mudar o nome do aeroporto Charles de Gaulle para Anne de Gaulle, filha de Charles com a mesma síndrome.

Na categoria Innovation, foi vencedora de Grand Prix a criação do MouthPad. Isso mesmo, não está escrito errado, é mouth mesmo. Um mouse que é usado na boca, como se fosse um tipo de placa protetora de dentes, por pessoas com lesão espinhal, tetraplégicas.

Uma invenção da Augmental, de San Francisco, EUA, que permite que essas pessoas ganhem novos recursos para navegar em computadores e se movimentar em cadeiras motorizadas com muito mais facilidade.

E há ainda diversos outros cases vencedores de Leões este ano dedicados a melhorar a vida das pessoas. É ou não é o lado mais bacana do festival?

Dentre os cases mais premiados nas 30 categorias, há peças geniais, muitas delas envolvendo recursos tecnológicos impressionantes, outras com a pureza de uma ideia brilhante simples.

Essa é a riqueza de um festival que completou 70 anos em 2023 e continua sendo a meca da criatividade. É onde o Brasil continua brilhando no pódio da criatividade, trazendo 92 Leões para casa.

Mas o lado mais bacana de tudo isso é a criatividade voltada para o bem, destacando a metade mais bonita da humanidade.

Alexis Thuller Pagliarini é sócio-fundador da ESG4
alexis@criativista.com.br