A pauta econômica está nos bastidores do Cannes Lions. Claro, a razão do festival é o prêmio e as transformações que a indústria criativa está consolidando nos últimos anos.
Mas os bastidores desse evento embutem um volume de negócios cujo teor fica restrito aos CMOs que se unem para alinhar projetos, estratégias e aprendizados que empresas estão promovendo nesta 72ª edição. Alguns exprimem suas ideias nas palestras. E tiramos muito proveito.
Sim, a pauta econômica é essencial. A discussão por margens é recorrente, mas ela afeta diretamente todas as indústrias. Essa fragilização fragmenta ganhos e reduz investimentos, mas não as prioridades que são ditadas por cenários que se abrem a todo instante.
Por isso mesmo, a transformação é chave para a compreensão dos agentes envolvidos no ecossistema do marketing. Porém, em todas as agendas, não há como fugir do que realmente importa: a criatividade.
Nesse caso, o Cannes Lions propõe um leque para que essa expressão seja conjugada em todas as disciplinas do negócio, especialmente a criatividade em mídia.
Que hoje transcende, e muito, ao tamanho da pizza tradicional. Hoje, essa disciplina é um lego do tamanho da rede Domino’s com TVs deixando de ser o que eram e se adaptando ao streaming, canais específicos, conteúdos sob demanda e ofertas de mídia omnichannel.
E a TV conectada? Ela está trazendo novas possibilidades para esse meio que precisa estar online para disputar o precioso tempo das pessoas, esse sim cada vez mais caro. E disputado.
Matt Green, que assim como eu integra a WFA (World Federation of Advertisers), é um estudioso da complexidade da mídia. Em sua opinião, não dá para fugir da régua que mede alcance e frequência. E, com tantos pontos de contato, essa dupla precisa estar afiada para que os investimentos sejam justificados. E diminuir as cobranças. Percebeu como a criatividade é o segredo?
Nesta terça-feira (17), o executivo Marc Pritchard, da P&G, disse para uma plateia atenta na palestra ‘Timeless creativity: lessons on bulding brands’ que a construção de marcas confiáveis requer que os anunciantes tenham um conhecimento mais do que eficaz dos seus clientes, mesmo com tantos dados disponíveis.
A solução, em suas palavras, é alimentar paixão pela arte e investimentos consistentes em ciência cerebral. “Ainda é possível construir marcas que duram a vida toda se você investir em criatividade.”
A opinião de Pritchard, que dirige a divisão de branding da P&G, o 3° maior anunciante do mundo, com mais de US$ 12,7 bilhões em compra de mídia, é essencial porque a criatividade, em todos os vetores da comunicação, vai ser cada vez mais cobrada.
E não se trata de ganhar prêmios. Eles podem massagear o ego, mas é no crescimento de receitas que a conta realmente fecha.
A Unilever também sabe usar a criatividade para fazer a diferença. No seu caso, ficou com o Grand Prix da competição Health & Wellness do Cannes Lions com o case ‘Vaseline verified’. Mas, como esse anunciante usou o asset criativo para se destacar no festival nessa competitiva área?
Simplesmente, a Unilever ouviu a voz dos seus consumidores, que já usavam a vaselina de formas diferentes, até mesmo como hidratante labial. Foi assim que surgiu o selo Verified com o aval da sua comunidade digital.
A Ogilvy de Singapura, com liderança criativa do brasileiro Marco Versolato, que coordenou o projeto, trouxe essa simplicidade criativa para o tabuleiro estratégico do marketing da Unilever.
Impasses econômicos, impactados pela tensão e empurrões entre países, que interferem nos preços e inflação, não podem subtrair da economia criativa esse potencial que as marcas tanto precisam: fazer a diferença por meio da criatividade que une num mesmo Squad os profissionais de marketing dos anunciantes, das suas agências, das produtoras, dos creators, dos agentes de retail, de live marketing e de todas as disciplinas.
Não é por outro motivo que o Cannes Lions faz a diferença. O festival estabelece critérios para que em todas as cadeias da indústria existam reconhecimentos específicos para a criatividade.
Que não é mais a exuberância estética de um filme, que mantém seu lugar intacto, mas a assertividade para o growth e a fidelização dos consumidores.
Sandra Martinelli é CEO da ABA e membro do Executive Committee da WFA