Da gestação à direção, à política e ao espaço, as mulheres de hoje estão marcando presença graças às conquistas do passado por equidade. Do sufrágio - por volta do século V a.C. - até o Supremo Tribunal Federal, tivemos grandes conquistas históricas como o caso da ex-senadora Kamala Harris empossada como a primeira mulher e primeira vice-presidente dos EUA. O empoderamento e reconhecimento feminino não param por aí, e – em suas mais variadas funções – se consolidam também com a indicação de Joe Biden, o atual presidente norte-americano, de uma juíza negra para a Suprema Corte Americana. De algum modo as meninas de hoje vão poder celebrar uma nova efemeridade daqui alguns anos.

Estes fatos propagandeados ao redor do mundo não são apenas acontecimentos, são resultados de muita luta por igualdade, não apenas de gênero, mas também de consciência, onde a mulher é protagonista da sua própria história. A mulher empreendedora tem um olhar que perpassa crenças limitantes.

Cada conquista é um passo rumo à equidade. No mundo moderno é incalculável a importância da saída da mulher de casa para o mercado de trabalho. Ainda que isso acarrete em tantos outros problemas, sabemos que a carga é dobrada para grande maioria que tem dupla jornada em cuidar da casa, dos filhos e ainda ter que ficar se provando mais que a média dentro de um negócio.

Além desses desafios, no Brasil, as mulheres empreendedoras possuem baixo acesso a capital de risco para investir em suas empresas, além das dificuldades para conseguir empréstimos e para levar seus negócios a estágios mais maduros. As mulheres no ecossistema de startups receberam em 2020, apenas 0,04% de investimentos em suas empresas no Brasil. Esse percentual é totalmente alarmante se levarmos em conta o montante investido: US$ 3,5 bilhões, segundo dados globais divulgados pelo PitchBook, empresa que fornece dados, pesquisa e tecnologia cobrindo os mercados de capital privado, incluindo capital de risco, capital privado e transações de M&A.

Eu tive a oportunidade de atuar com o Sebrae em diversas oportunidades e um levantamento feito pela entidade mostrou que temos cerca de 24 milhões de empreendedoras no país. Quando recortamos para startups, apenas 4,7% são lideradas pelo sexo feminino e isso se comprova com o “Female Founders Report 2021″, estudo divulgado pelo Distrito, em parceria com Endeavor, B2Mamy, Google entre outras associações. Esses são os desafios diários que nós, mulheres, enfrentamos na hora de empreender. Os números são empecilhos para desistir? Não!

Com a intenção de te dar uma coragem extra para enfrentar os perrengues, vou te contar um pouco dos meus, em meio às tantas conquistas. Porque eu acredito muito que falar a real ajuda a gente a chegar onde a gente quer, evitando desperdício de tempo com fantasias miraculosas e estressantes. Quando me formei em 2007, na faculdade de comunicação, eu já tinha algumas experiências por conta de estágios variados desde o primeiro semestre. Eu carregava um sonho de trabalhar com artes ou jornalismo porque queria me envolver com pessoas. Entretanto, eu precisava trabalhar para pagar minha faculdade e as contas do dia a dia. Primeiro perrengue: eu saí da faculdade com um boletão de fazer qualquer um chorar. Mas estava confiante que ia pagar tudinho muito em breve, afinal, eu tinha me dedicado muito a aprender, na prática, como ser uma profissional de marketing. Foram muitos estágios.

Sou responsável pela minha vida financeira desde os 20 anos de idade. Quando eu saí de Sorocaba, interior de São Paulo, em 2009, aos 22 anos, foi paraassumir a gerência de marketing da Babolat e Arena, em Campinas, que distribuía suas marcas não apenas no Brasil, mas para vários outros países ao redor do mundo. Foi neste período que tive um salto de responsabilidade profissional e pessoal.

Nunca mais voltei para casa e comecei a galgar os primeiros passos para um olhar de empreendedorismo, ainda que do lado de dentro de uma empresa. Minha primeira semana de trabalho foi na Polônia, escolhendo uma coleção de produtos que a empresa importava para lançar a marca dos polêmicos supermaiôs que o atleta de natação, César Cielo, usava. Eu sempre tive sonhos altos e estar ali na Europa escolhendo uma coleção, NOSSA MÃE! Nem eu acreditava.

Mas junto com o glamour europeu, logo na viagem, já me deparei com os perrengues. Uma língua que eu ainda não dominava, um time com pessoas mais experientes que eu em suas funções específicas e que me questionavam muito e uma lista infinita de competências técnicas que eu nem sabia como começar a desenvolver. Muito menos no tempo que eu precisava. Mas o principal desafio foi aprender a lidar com o medo constante de errar, de parecer uma farsa e de não saber como ser eu mesma em meio a tantos homens (impressionante como eu demorei pra descobrir que o mundo real contava com muito mais homens na liderança).

Já com 24 anos, e com muita vontade de fazer acontecer, uma bússola moral forte e um desejo genuíno de fazer as coisas do jeito certo, fui para o lado varejista da força. Fui trabalhar na Netshoes. E me apaixonei pelo mundo do comércio eletrônico. De lá pra cá, fui crescendo e agarrando cada oportunidade de me desenvolver e entregar valor para o mundo através de um trabalho dedicado onde tive também a oportunidade de aprender muito sobre marketing e o desenvolvimento de produtos digitais.

Em 2012 co-fundei uma consultoria super mão na massa que ajudava startups e VCs a fazer nascer e crescer negócios em modelos diferentes em tecnologia. E com essa empresa ajudei algumas startups brasileiras bem queridinhas até hoje. Viajei pelo mundo, me sentei à mesa com sócios do Eric Ries (na época Lean Startup era o auge da literatura das startups) e aprendi demais. Sempre fui uma pessoa de muitas perguntas e com elas eu cheguei aos 30 anos com uma carreira executiva que já me permitia ajudar a guiar a agenda de pequenas e grandes empresas para um olhar mais humano, apesar do foco em tecnologia. Sempre foi sobre as pessoas. Então considero que meu objetivo de sensibilizá-las, que eu tinha lá atrás, quando achava que ia trabalhar com arte, está sendo realizado de alguma forma.

Em algum ano durante a consultoria tive a honra de trazer o Bob Dorf, coautor de “O Manual da Startup”, para o Brasil e quando me vi em meio ao trabalho que estávamos fazendo, percebi que poderia dar grandes saltos, às vezes até "maiores que as minhas pernas", porque eu tinha o essencial para correr atrás, a vontade de fazer acontecer e o interesse genuíno nas pessoas. Mas também me fez perceber que empreender era complexo e que para ter sucesso eu precisaria sempre saber alinhar os interesses do negócio, dos clientes e dos colaboradores. Ah! E aprender a lidar com o medo constante de quem tem que assumir riscos - nem sempre tão conhecidos - o tempo todo. Empreender é apaixonante, mas requer muita resistência emocional. Hoje eu faço isso como cofundadora da Favo, um social commerce que vende itens de supermercado quebrando todas as barreiras de entrada do mundo digital e que está presente no Brasil e no Peru, gerando liberdade de renda para milhares de pessoas que empreendem com a gente. Porque empreender é, antes de tudo, um ato de liberdade.

Empreender no mundo real é reconhecer que as coisas não são NECESSARIAMENTE fáceis, que o perrengue é constante. Mas o prazer de ver um negócio resolvendo um problema real, vale o esforço. E a gente sempre acha bons parceiros para nos estender as mãos.

Eu saí de Sorocaba, fui para Polônia e estou a conquistar a América Latina. Você quer empreender? TE PREPARA, minha amiga! Minha mão está super estendida para todas as mulheres que querem passar esses perrengues e fazer a diferença no mundo.

Marina Proença é cofundadora da Favo e especialista em Produto e Marketing