Não é segredo para ninguém que o Cannes Lions 2024 deixou muita gente surpresa com o resultado do Brasil na categoria Film, em que saímos sem nenhum metal. É uma triste realidade, mas confesso que já esperada observando a evolução do nosso mercado nos últimos anos.

Porém, uma coisa que precisamos exaltar, tanto nesta quanto em edições anteriores do festival - e de outras premiações -, é o reconhecimento que os profissionais brasileiros têm recebido de outros países.

Se por um lado o nosso mercado está reduzindo os investimentos, recursos e prazos na produção audiovisual, por outro, marcas e agências de outros países têm ido na contramão, apostando em narrativas audiovisuais e olhando para o Brasil como um polo de produção e celeiro de talento e criatividade.

Basta olhar os números. Neste ano, dos 34 GPs do Cannes Lions, 16 tiveram a participação de brasileiros (47%) - seja na aprovação, concepção ou produção da ideia -, sendo que 14 deles foram criados por agências do exterior. Ou seja, quase a metade dos cases máximos do festival.

Além disso, a edição ainda teve um número recorde de participantes no júri, com 36 brasileiros entre os nomes que avaliaram as peças publicitárias.

Especificamente no audiovisual, essa tendência vem em uma curva ascendente ao longo dos anos. Entre milhares de profissionais, existe uma nova safra de diretores que estão exportando cada vez mais suas visões criativas e se envolvendo em trabalhos de marcas e agências internacionais.

No Cannes Lions do ano passado, na categoria Film Craft, que é 100% voltada para técnicas de produção, o diretor de cena Vellas conquistou um Leão de Ouro com o filme ‘Shout’, produzido pela Rebolucion México e a Quiet City Music+Sound, para a Movistar. A criação foi da VML mexicana.

Em 2024, nesta mesma categoria, tivemos um Leão de Ouro com a animação ‘Ashe versus’, totalmente produzida por profissionais brasileiros, dirigida pelo coletivo de diretores The Youth. Assinam a ficha técnica a produtora de imagem The Youth & Co e a produtora de áudio Satelite Audio. No entanto, a criação, assim como em ‘Shout’, foi toda feita fora do país pela TBWA\Health de NY para um cliente também norte-americano.

A animação ‘47’, da Zombie para a marca francesa Café Joyeux, levou um Leão de Prata em Film, enquanto o GP de Print & Publishing, ‘Recycle me’, criado pela Ogilvy NY, contou com a produção da Lobo, e o GP for Good, ‘The first speech’, da Innocean Berlim para Repórteres Sem Fronteiras, foi dirigido pelo Giordano Maestrelli, da Stink Films São Paulo.

Esses são apenas alguns exemplos, são aquela pontinha do iceberg que fica à vista, mas que “esconde” muito mais nas profundezas. E todo esse potencial criativo da produção audiovisual brasileira também se reflete em negócios, o qual temos visto uma curva de crescimento nos últimos anos.

Observamos um aumento expressivo no volume de exportações em 2023, em que nossas produtoras associadas, juntas, somaram mais de US$ 50 milhões de projetos internacionais, um crescimento de 50% em relação a 2022. Isso é uma prova a mais do quanto o Brasil é forte. Aqui temos um celeiro de talentos promissores e um polo de produção audiovisual potente. Somado a isso, vemos o país se destacando como importante player na publicidade mundial, o que foi reiterado recentemente com os 92 Leões que conquistamos.

De forma constante, nossos profissionais estão sendo requisitados para projetos internacionais, demonstrando que, mesmo em um cenário interno adverso para o audiovisual, o talento brasileiro continua a brilhar e a influenciar o mercado global. É um reconhecimento merecido, que deve ser motivo de orgulho para todos nós. O caminho pode ser desafiador, mas a criatividade e a competência dos brasileiros na produção audiovisual são inegáveis, e continuarão a abrir portas e a conquistar o mundo.

Marianna Souza é presidente da Apro e gerente-executiva da FilmBrazil
marianna@apro.org.br