Nesses mais de dois anos de trabalho em casa, muitas coisas passaram pela cabeça de todos: preocupações com o bem-estar pessoal e de familiares, questionamentos profissionais e de estilo de vida, reorganização de metas e prioridades. E, com a volta (ou não) ao trabalho presencial, obviamente isso não é diferente quando aplicamos à vida empresarial.

Muitas pessoas que são contra o retorno presencial justificam que as empresas querem voltar para ter controle sobre as equipes. Pessoalmente – com ênfase no “pessoalmente”, pois isso é um valor pessoal que divido com meu sócio e aplicável apenas à nossa realidade –, acredito que controle é uma ilusão.

Não tenho como garantir que um profissional esteja na frente da tela trabalhando e de fato nem quero ter que fazer esse tipo de microgestão. O que consigo e me interessa é olhar para a entrega – quantitativa ou qualitativa – naquele período de tempo. Essa é uma métrica que posso aplicar tanto no trabalho em home office como no presencial, e é a métrica a que estamos atentos.

Outra vantagem do home office para as empresas é a diminuição do custo fixo. Nesses mais de dois anos, mantivemos toda a estrutura física da agência, mas poderíamos ter facilmente questionado. Água, luz, depreciação de espaço físico, vale-transporte? As empresas que optaram por não voltar podem abrir mão desse custo ou aplicá-lo como outro benefício que gere valor na relação com a equipe.

Mais um ponto positivo do home office é a capilaridade de contratação. Poder ter a liberdade de contratar quem quiser, sem limitações geográficas, é uma vantagem gigantesca e tentadora. Trabalhar com pessoas diversas do mundo, que possuem as mais diferentes experiências, é uma tremenda vantagem – tanto de expertise quanto de custo.

Sendo assim, por que nós (lembrando novamente que isso tudo é sobre nossa realidade) voltaremos ao trabalho presencial?

Estamos falando de cultura. Em primeiro lugar, toda empresa quer ser desejada como um lugar em que as pessoas queiram trabalhar e o modelo de trabalho pode e deve fazer parte dessa equação.

Subestimamos as relações pessoais de trabalho. Por mais que existam piadas, memes e textões sobre trabalhar como apenas uma forma para pagar boletos (e ninguém tá discordando disso), o fato é que passamos a maior parte do nosso tempo no trabalho. As relações com chefes, colegas e pessoas que conhecemos impacta positivamente em nossa vida, assim como nossa experiência de vida pessoal impacta no trabalho.

Estamos cansados de telas. Respondemos nosso WhatsApp cada vez mais devagar, preferimos o lazer fora de casa e mesmo aquela palestra que parecia interessante ver apenas no computador agora parece uma boa ideia ver pessoalmente e compartilhar a experiência com outras pessoas interessadas. A propósito, aposto que você deixou de comparecer em palestras online simplesmente porque estava cansado, e eu não o julgo.

O trabalho em equipe funciona muito bem pessoalmente. É claro, existem os atrasos e os impactos da vida na cidade, mas o lado positivo da troca feita pessoalmente ou a troca de referências instantânea que não dependa de você ter que ir até o Slack para compartilhar fazem a diferença no dia a dia do trabalho.

É difícil se sentir fazendo parte de algo apenas na frente da tela do computador. Isso não tem nada a ver com o cargo e, na melhor das hipóteses, uma gestão supereficiente no modelo online vai aliviar apenas parte desse sentimento. O isolamento do período pandêmico nos afetou de formas muito profundas.

Muita gente simplesmente não gosta de trabalhar em casa. Seja porque não tem uma estrutura específica (que vai muito além do computador/cadeira), seja porque a rotina em casa dificulta ou simplesmente porque não gosta mesmo.

Não acho que as pessoas vão simplesmente querer trabalhar no modelo híbrido ou em home office, isso faz parte do valor pessoal de cada um. Nem as empresas poderão simplesmente se tornar híbridas ou home office, cada empresa tem a sua cultura. Caberá a cada um fazer uma análise mais ampla e entender se aquele projeto (que é a soma de pessoas, valores, estilo e, também, modelo de trabalho) combina com o que você acredita.

Hércules Pereira é head of culture da Purple Cow