O que Jeremy Rifkin levou cinco anos para pesquisar e escrever no livro ‘Sociedade de custo marginal zero’, Léa Valle da Costa, dona do Salão Pé, Mão e Muito Mais, em Laranjeiras, na Zona Sul do Rio, traduziu de forma precisa e irretocável: “Ninguém mais faz escova no cabelo”. Em matéria mais que reveladora no O Globo de fim de semana, assinada pela sensibilidade e competência  da jornalista Cássia Almeida.

Depois de cinco anos Rifkin concluiu que, pelo tsunami tecnológico e todas as decorrências, os preços de produtos e serviços tendiam a zero. Claro, não chegariam a ser de graça, mas despencariam. E é o que vem acontecendo nas últimas décadas.

O problema é que à medida que os preços vão despencando, a receita das empresas idem, e com isso começam os cortes de salário, inicialmente, e de empregos, depois. E, cá entre nós, o mundo não se preparou para esse momento, por mais que sejamos adeptos e usuários de todas essas fantásticas novidades.

Na espetacular matéria de Cássia Almeida, contando o que aconteceu com Léa Valle da Costa, e seu Salão Pé, Mão e Muito Mais, a luz que, de um lado esclarece quase tudo que muitos estamos sentindo, e adverte sobre o que nos aguarda. A história é a seguinte.

Antes da pandemia, Léa faturava R$ 20 mil todo mês. E retirava R$ 10 mil. Hoje fatura 25 mil e retira, quando retira, 3 mil. Explica Léa, “Costumava fazer um reajuste significativo uma vez por ano. Agora, faço dois por ano, insignificantes, para não afastar os clientes... Tive de demitir empregados com carteira assinada... Contraí um empréstimo na pandemia para arcar com os custos da rescisão... Os que aceitaram continuar hoje são parceiros... A demanda voltou, mas não mais para todos os serviços... para os cuidados com os cabelos o movimento está em 30% do que era antes da pandemia... hoje ninguém mais faz escova, e maquiagem diminuiu muito...”.

Retrato perfeito, irretocável, do que vem acontecendo com a maioria dos negócios. Que as pessoas sentem, mas têm uma dificuldade compreensível e humana de reconhecer e se adequar, desde que possível, a essa nova realidade, decorrente do tsunami tecnológico, da tal da ‘Sociedade de custo marginal zero’, de Jeremy Rifkin... Simultaneamente, pessoas deixando de ir ao Méqui...

O cenário, se não chega a ser desesperador, é tétrico. Nas principias cidades do mundo, milhares de imóveis comerciais que, anos atrás, valiam uma fortuna, cobravam luvas elevadíssimas, abandonados. Mais ou menos o que aconteceu com os telefones, lembram.

Famílias investiam em telefones, investidores chegaram a ter uma carteira entre 200 a 500 linhas, uma linha em Alphaville custava US$ 20 mil, e, poucos anos depois, zero...

De certa forma, é o que vem acontecendo com o comércio. E assim não surpreende mais ninguém, apenas os desatentos e insensíveis, quando abriram O Globo do domingo, 25 de fevereiro, e deram de cara com Rogério Barreira, CEO da Arcos Dourados No Brasil, leia-se McDonald’s, afirmando, apenas, que, “as vendas digitais já representam 61% do total”!!!

Ficou perplexo? É de ficar. O impacto do tsunami tecnológico, aditivado pela pandemia, é, simplesmente, apoteótico em alguns setores de atividades.

Rogério entrou no Mc há 40 anos como atendente. Hoje comanda a operação. E revelou-se, também, surpreso:

“Nós achávamos que, depois da pandemia, os pedidos via delivery fossem cair, mas não foi isso que aconteceu. Em verdade, é onde registram-se os maiores crescimentos. Mesmo podendo optar pelo drive-thru, pelo balcão dos Mcs, usar o totem, ou adiantar o pedido pelo smartphone e passar para retirar, vai adensando a quantidade dos que preferem pedir de e receber em casa”...

Lembram do tempo que era um programa ir com a família ao Mc... E de fazer escova nos cabelos.

Acorda, amigo, o mundo velho vai ficando para trás... Está esperando o que para iniciar a travessia? Sua e de sua empresa?

Francisco Alberto  Madia de Souza é consultor de marketing
fmadia@madiamm.com.br