Harry Potter foi rejeitado por uma determinada editora, pois os editores achavam que era longo demais para o público infantil. O livro foi ignorado por mais de uma dezena de editoras por vários outros motivos. O piloto da série Seinfeld foi considerado “muito nova-iorquino” para dar certo numa audiência mais ampla. Numa pesquisa com 100 pessoas, foi marcado como fraco. Depois, numa pesquisa com 600 pessoas, não foi compreendido. Foi ao ar e não aconteceu. Ficou cancelado por um ano. Só depois foram feitos mais seis episódios. Essa encomenda foi considerada um desperdício e um péssimo investimento no estúdio. A impressora com tecnologia laser quase foi descontinuada pela Xerox por ser pouco versátil para o dia a dia. O Xbox também passou pelo mesmo movimento, antes do sucesso quase foi descontinuado pela Microsoft.

Star Wars foi rejeitado várias vezes. Grandes estúdios deixaram passar o roteiro de Pulp Fiction. A lista não para. O que é original não é bem aceito de cara. Demora um pouco para acontecer. Mas como e por que acaba acontecendo? Fracassos e originalidade caminham juntos pela mesma estrada estreita, íngreme e sinuosa. Nossa indústria fala muito sobre sucesso. E a maioria mensurável, pois está atrelada a bônus. Mas o fracasso quando está ligado à originalidade tem seu valor como parte do processo. Assim como é comum ver imagens em nuvens, e cada um percebe uma imagem diferente, ao vermos um conteúdo inédito, procuramos desesperadamente, dentro do que conhecemos, alguma referência que nos permita “entender” aquilo que vemos. A explicação para isso é emocional, como animais sociais somos ávidos pela aceitação em grupo de nossos semelhantes e evitamos ser os primeiros a aceitar algo que nunca foi visto, ou discutido. Ao julgar ideias realmente originais, podemos cometer erros decisivos. Parte desses questionamentos estão no livro Originais, de Adam Grant. Uma das histórias contadas, que achei mais interessante, foi sobre o que levou o executivo do estúdio de Seinfeld a levar adiante o projeto, sendo que tudo indicava que a série deveria ser cancelada. “Tecnicamente”, ela deveria ser cancelada. As frases são interessantes: “foi uma facada no coração” e “ ficamos receosos de seguir em frente com algo que havia sido rejeitado com tanta veemência nas pesquisas”. Algo que poucos dizem, mas trabalhar com criação é mais sobre frustração, medo e pânico do que euforia e sucesso. Sentimentos como esses fazem parte da indústria da comunicação que busca originalidade.

Ainda sobre Seinfeld, o livro conta sobre um personagem muito interessante, um executivo chamado Rick Ludwin que apostou e tornou a série um sucesso. Um trecho: “Jerry Seinfeld e Larry David nunca haviam escrito uma sitcom e meu departamento na NBC nunca tinha desenvolvido uma sitcom também”. “Combinávamos bem, pois não sabíamos quais eram as regras que não deveríamos quebrar”. “Seinfeld, ainda conta Adam, era um seriado que quebrava todas as regras confortáveis de produção e audiência e era extremamente desconfortável para quem estava no mundo das sitcoms.” A única qualidade em comum entre Rick Ludwin e a série era que ele amava o humor e havia tido experiência quando revisava roteiros do programa Saturday Night Live. Essa proximidade com a essência e sua inclinação pessoal sobre o tema foram os sentimentos por trás do sucesso. Mas sentimentos hoje podem ser pessimamente interpretados. Porém, não existe nada realmente marcante no mundo. Nem arte ou negócios que não haja um sentimento profundo marcado nele.

Originalidade, medo, drama, amor, coragem, perseverança e sucesso comercial. Essa trilha é muito 4x4, por isso é para poucos. O business precisa de gente que ame mais o core do que o resultado. Compositores melhores virão de uma indústria que ame a música de fato. Mais do que aquilo que se atinge com ela. Escritores de sucesso vão aparecer quando o sucesso não for a intenção da primeira frase do livro. A criatividade como expressão, a originalidade como caminho são mais possíveis quando a comunicação é feita por quem realmente ama se comunicar e acredita que isso pode fazer a diferença no mundo.

Flavio Waiteman é CCO-founder da Tech and Soul
flavio.waiteman@techandsoul.com.br