Quase cinco anos após o início da pandemia, que transformou radicalmente nossa relação com o trabalho, a discussão sobre o regime presencial, remoto ou híbrido segue gerando debates acalorados. Recentemente, essa questão ganhou ainda mais força no setor de publicidade e propaganda. A WPP, um dos maiores grupos globais da área, anunciou que, a partir de abril, os funcionários deverão comparecer ao escritório quatro vezes por semana. E essa tendência não se restringe à WPP: outras multinacionais, como Goldman Sachs, Tesla e JPMorgan Chase, exigiram o retorno integral ao trabalho presencial para parte de seus colaboradores. Já empresas como Pepsico, Microsoft, Google, Nubank e Natura optaram por modelos híbridos, buscando um meio-termo entre flexibilidade e presença física.
Há argumentos sólidos em ambas as abordagens. Empresas que defendem o modelo presencial afirmam que os custos do trabalho remoto superam seus benefícios. Treinamento, integração, inovação e a consolidação de uma cultura organizacional forte tornam-se mais desafiadores quando as equipes estão dispersas. Por outro lado, os defensores do trabalho remoto destacam vantagens como maior flexibilidade, redução de custos, menor impacto ambiental e um ambiente mais atrativo para reter talentos.
Em muitas áreas, a presença física no ambiente de trabalho é um diferencial. Estar no mesmo espaço facilita a troca de ideias, estimula a colaboração espontânea e impulsiona a inovação. Equipes diversas, compostas por profissionais com diferentes perspectivas e experiências, se beneficiam dessa interação constante, encontrando soluções mais criativas para desafios complexos. Além disso, o contato presencial fortalece habilidades interpessoais essenciais, como comunicação, empatia e negociação — competências que se desenvolvem de forma mais natural no convívio diário.
No entanto, se a presença física favorece a produtividade e a inovação, é preciso também considerar seu impacto na qualidade de vida dos profissionais. O equilíbrio entre trabalho e vida pessoal tem se tornado um desafio crescente. Jornadas exaustivas e deslocamentos demorados consomem energia mental e física, deixando pouco tempo — e disposição — para atividades pessoais. Sem esse espaço para descanso e relações sociais fora do trabalho, o estresse aumenta e a satisfação profissional diminui. Um relatório da American Psychological Association (2025) aponta que 59% dos trabalhadores apresentam sintomas de burnout, condição reconhecida pela OMS como doença ocupacional. Isso não afeta apenas a saúde mental dos indivíduos, mas também o desempenho e a retenção de talentos dentro das empresas. Diante disso, torna-se essencial que as organizações adotem políticas de bem-estar que ajudem seus colaboradores a encontrar um equilíbrio saudável, prevenindo o esgotamento e garantindo equipes mais engajadas e produtivas.
A grande questão, então, não deve ser qual modelo é melhor, mas como conciliar presença e autonomia de forma inteligente. Um estudo da Universidade de Stanford, liderado pelo economista Nicholas Bloom, traz evidências importantes nesse sentido. A pesquisa revelou que um modelo híbrido bem estruturado pode unir o melhor dos dois mundos. Funcionários que trabalham de casa dois dias por semana demonstram produtividade equivalente àqueles que estão no escritório em tempo integral, sem prejuízos nas chances de promoção. Além disso, a taxa de rotatividade caiu 33%, principalmente entre mulheres, não-gestores e profissionais que moram longe da empresa, resultando em uma economia milionária. Os dados reforçam uma ideia que a psicologia já aponta há tempos: equilíbrio gera melhores resultados do que extremos.
Sob a ótica da psicologia sistêmica, essa discussão vai além da produtividade. O ambiente de trabalho é um sistema vivo, onde as interações humanas influenciam diretamente o engajamento, a criatividade e o bem-estar dos profissionais. Modelos rígidos podem gerar desconexão, estresse e menor comprometimento, enquanto a flexibilidade, quando bem gerida, fortalece vínculos, promove pertencimento e contribui para um equilíbrio mais saudável entre vida profissional e pessoal. O verdadeiro desafio, portanto, não está apenas em definir onde se trabalha, mas em criar ambientes que favoreçam conexões humanas genuínas — garantindo não apenas o sucesso organizacional, mas também o desenvolvimento integral dos indivíduos.
Jamille Façanha é psicóloga