Há uns meses, na sequência das reflexões que o evento Marcas Brasileiras Mais Valiosas nos convida a fazer, ficou evidente o quão importante é para as marcas demonstrarem ao público uma visão realista de mundo e quais causas pretendem abraçar. Por outro lado, temos outras questões mais gerais como os desafios climáticos e a vida no pós-pandemia (sempre ela) que nos incentivam a compreender os “próximos passos” não somente como marca, mas também como humanidade, compreendendo sempre as evoluções dos espaços, sejam eles no varejo, corporativo, habitação ou cidade.
Julgo ser correto dizer que esses dois fatos principais, que atingem a todos, ajudaram a enfatizar outras transformações que há muito tempo pairavam por aí: visão sobre sociedade, mundo digital, igualdade e diversidade, entre outras.
Quando falamos de ambientes e marca nos colocamos como agentes de dois universos que se complementam. Aos ambientes, sejam eles habitação, escritórios ou comércio, interessa que sejam funcionais e tecnicamente bons. Às marcas, interessa que esse ambiente reforce a qualidade do seu produto, reflita a sua forma de ver o mundo ou, ainda, que sua experiência ajude a criar uma memória positiva para as pessoas que nele visitam ou trafegam.
Um outro aspecto que é importante ressaltar, está relacionado com a construção de um mundo digital e com uma certa ideia de que haveria uma tendência das marcas em abandonar o ambiente físico estando apenas presentes online. Algum tempo e uma pandemia depois, entendemos a necessidade da natureza humana em se relacionar fisicamente em todos os âmbitos, e de ver nascer com mais força a ideia do Phygital, ou seja, a mistura ou convivência dos meios digitais e físicos para relacionamento e criação de experiência de marca.
Entendemos, portanto, que os ambientes ressignificaram o processo de construção da marca e acabaram por encontrar um novo espaço num contexto que é, simultaneamente, cada vez mais digital e físico.
Nesse sentido, tudo o que decidirmos fazer num ambiente de marca, seja ele de que natureza for, deverá passar uma mensagem clara ao usuário ou cliente, destacando os seguintes aspectos:
Mundo híbrido e conexão com a experiência digital: seja no agendamento de reuniões hibridas (escritórios), no complemento às compras online (lojas) ou num agendamento online de um serviço, cada vez mais os ambientes físico e digital devem estar sincronizados e as soluções arquitetônicas devem refletir essa necessidade.
Escolha de materiais: os materiais que escolhemos nos ajudam a definir a personalidade da marca e o tipo de experiência que queremos oferecer. Um exemplo é: faz sentido termos um ambiente mais arrojado e enérgico ou um ambiente mais calmo e tranquilizador? Ainda sobre este item, o uso de materiais sustentáveis ou renováveis ajuda a organização a dar um sinal claro ao seu público sobre um dos temas atuais mais importantes - a sustentabilidade do mundo, da cidade e da construção em geral.
Pertinência do ambiente no ecossistema da marca: quando decidimos construir um ambiente é importante termos clara a relevância desse ponto de contato e pensarmos sobre todos os aspectos que vão compor a experiência para além do ambiente. O nome do espaço, forma de atendimento, música ambiente ou aroma são recursos que reforçam a construção de marca e ajudam a potenciar tudo o que foi pensado para o ambiente.
No projeto que desenvolvemos para os escritórios da CBA tivemos a oportunidade de colocar em prática todos estes princípios. Num ambiente que passou de 130 posições para 70 posições físicas, foi priorizada a natureza da marca, o bem-estar dos colaboradores e o ambiente híbrido - com salas de reunião preparadas para receber, simultaneamente, participantes remotos e presenciais, além do seu sistema de reservas, que foi sincronizado com a plataforma da empresa.
O espaço também se tornou menos hierárquico, possuindo vários momentos de descompressão ou de pequenas reuniões que são caracterizadas com materiais acolhedores, como a madeira, juntamente com elementos verdes que contribuem para o bem-estar dos seus utilizadores. Tudo pensando para compor um ambiente que relembra a natureza industrial e a identidade da marca.
A verdade é que com a introdução do mundo digital e principalmente na saída da pandemia, a vida e a relação com a cidade e os espaços em geral mudaram de forma definitiva. Assim, ambientes estão se transformando: as habitações ganharam novas divisões para comportar pessoas trabalhando, os escritórios viraram espaços de cultura de marca, colaboração ou concentração e as lojas tornaram-se lugares de extensão do ambiente digital, de experimentação e verdadeiras embaixadas de relacionamento com o cliente.
Desta forma poderíamos dizer que o verdadeiro desafio dos espaços passou a ser claro e simples: se podemos comprar e trabalhar online, que razões temos para sair? A resposta também é clara e simples: aquilo que parecia estar se tornando limitação, tornou-se uma oportunidade. O crescimento do mundo digital obrigou os espaços a propor um novo papel na construção de marca evoluindo de meros pontos de contato, para verdadeiros centros de experiência e aprofundamento de relações - mais potentes, que sempre serão diferentes e complementares a uma interação a distância.
João Matos da Costa é gerente de design de ambientes da Interbrand