Demorei anos para perceber o quanto me masculinizei para sobreviver nos departamentos de criação e agências por onde passei, todos liderados por homens brancos. No jeito de falar, de me vestir, de não demostrar emoções e, consequentemente, no trabalho criativo que eu produzia.
Quando fecho os olhos e volto no tempo para alguma das tantas mesas de almoço ou happy hours com meus colegas homens, lembro que participei e reproduzi piadas e comentários que tantas vezes objetificavam ou estereotipavam mulheres e, portanto, a mim mesma.
Durante muitos anos também acreditei que era uma vantagem ser a única ou uma das pouquíssimas na criação onde eu trabalhava. "Vejam, sou tão talentosa e especial que me deixaram ser um deles."
Quase duas décadas depois, cá estamos na semana do Dia da Mulher lembrando o quanto o mercado publicitário ainda é masculino, principalmente nos cargos de liderança.
Quando falamos de presidência então, as mulheres são em torno de 10%.
Existe uma expressão para quando há equidade de gênero na base, mas não no topo: degrau quebrado. É tentando me equilibrar no nosso, que é enorme, que desloco o assunto dos fatos para um dos efeitos.
Na Publicis atualmente 62% do time é feminino. Nossa liderança também é feminina, com elas ocupando 61% dos cargos de gestão - imagino e espero que todas as agências estejam evoluindo nos seus números. Mas tão importante quanto uma mulher ocupando um destes cargos, é ela poder exercê-lo na sua inteireza e individualidade. Conseguir fugir da padronização da liderança, trazendo para estes espaços e atuações pluralidade, empatia e sensibilidade. Ouvir de outras mulheres que sou inspiradora quando me coloco de forma autêntica, defendo meus pontos de vista com paixão e que minha gestão reflete o quanto gosto da vida e de gente me enche de orgulho, mesmo não sendo critério em nenhuma das avaliações de performance que já preenchi na vida.
Acredito que dos maiores impactos da presença e liderança feminina no nosso mercado hoje seja garantir que nenhuma mulher - negra, branca, trans e representantes de demais interseccionalidades - sinta que precisa deixar de ser quem é para participar dos projetos mais disputados e crescer como profissional. Garantir que uma candidata não seja questionada na entrevista se pretende engravidar nos próximos anos. Garantir que mais subirão, principalmente mulheres pretas. Que haja outras referências de gestão que não a masculina. Afinal, como bem pontua bell hooks, “como você pode se tornar o que você não consegue imaginar?”.
Se o feminismo é uma construção diária, a liderança feminina também é, e eu fico feliz de olhar para os lados e finalmente enxergar tantas mulheres incríveis nessa jornada junto comigo. Há alguns dias me emocionei apresentando um trabalho a ponto da minha voz embargar. Não só não disfarcei para o time e clientes, como pensei comigo: que bela oportunidade de ser a líder que eu tanto quis ter.
Dani Ribeiro, ECD da Publicis Brasil