Recentemente, pesquisas vêm mostrando o aumento no número de mulheres em cargos de liderança no Brasil. Dados como os do levantamento realizado pela consultoria e auditoria Grant Thornton, que apontam que 38% dos postos de gestão são ocupados por mulheres, mostram uma mudança muito positiva no cenário do mercado de trabalho, especialmente quando comparados com os números de 2019, apenas três anos atrás, quando apenas 25% do C-Level era composto por mulheres. O salto de mais de 10% é um sinal de que, além da mentalidade das empresas estar se alterando e o mercado estar proporcionando mais espaço para as profissionais, cada vez mais as mulheres estão crescendo em suas áreas de trabalho e se profissionalizando a ponto de ocuparem cargos de gestão e liderança.

Contudo, por trás disso, ainda há muitos desafios que nós, mulheres, precisamos combater, mesmo quando alcançamos os espaços de gestão. Além do machismo, ainda muito forte na sociedade brasileira e no mercado de trabalho, as mulheres são as profissionais que mais sofrem com estresse ligado ao trabalho, síndrome de burnout, sentimentos de frustração e insegurança. A pesquisa Women in the Workplace 2021, realizada pela consultoria McKinsey & Company e pela organização LeanIn, mostrou que muitas mulheres sentem diariamente o peso da fadiga e da pressão causada pelo trabalho.

Destaco “as mulheres” não porque elas sejam as únicas afetadas pelo burnout, mas por elas serem as mais afetadas: 42% das mulheres sofrem com sintomas como insônia, estresse, fortes dores de cabeça, ansiedade e esgotamento físico e mental, contra 35% dos homens. Por que isso acontece?

Um dos motivos, se não o principal, é porque, dentre outras coisas, carregamos um peso histórico da responsabilidade por cuidar da casa, das obrigações do dia a dia e por mais que atualmente essas tarefas estejam muito mais equilibradas, ainda paira um sentimento do inconsciente coletivo de que é "nossa obrigação". Fora isso, ainda existe uma sensibilidade e intuição feminina que nos faz reviver muitos assuntos do próprio trabalho mesmo depois de desligar a tela. Nos preocupamos com ressentimentos, sensações que causamos nas pessoas, impressões que as pessoas têm sobre nós.

Outro fator que acompanha grande parte das mulheres, independentemente da idade, área de expertise ou do cargo que ocupem, é a chamada “síndrome de impostora”. O sentimento de ser uma fraude, a subvalorização das conquistas e capacidades, bem como a autoexclusão de espaços que poderiam ocupar são exemplos de como esse padrão de pensamento e comportamento se mostram. A mulher que nunca se sentiu incapaz de assumir certas responsabilidades ou como se não pertencesse a determinados espaços que atire a primeira pedra!

Essa tendência à autossabotagem e a externalizar os sucessos é comum às mulheres, e é um problema sistêmico, resultante do modelo de sociedade patriarcal em que vivemos. Por muito tempo, as mulheres foram excluídas de espaços como o mercado de trabalho, a política e até mesmo da educação; hoje, cada vez mais, podemos ocupar esses ambientes, nos desenvolver e crescer profissionalmente, mas não faltam obstáculos externos e internos nessa jornada.

Um exemplo muito simples que mostra como o mercado de trabalho não é verdadeiramente inclusivo é que nós, mulheres cis, menstruamos. Os hormônios femininos seguem um ciclo de cerca de 28 dias, o que afeta nossa criatividade, produtividade e, logicamente, com o bem-estar físico. Isso significa que nós não seguimos o mesmo ciclo de 24 horas que o corpo masculino segue. Temos semanas em que estamos muito ativas, semanas em que precisamos nos recolher. Há dias em que estamos tranquilas e “zen”, e dias em que, por mais que tentemos, não conseguimos segurar o mau-humor. Isso é absolutamente natural e faz parte do nosso corpo; mas quantas de nós já não fomos chamadas de histéricas, grosseiras ou outros adjetivos simplesmente por estarmos vivenciando uma fase específica do nosso ciclo, algo que está fora do nosso controle?

Alcançar cargos de liderança nunca foi tão possível para as mulheres quanto é hoje em dia. Mas, enquanto o mercado não for composto por pessoas e empresas dispostas a realmente abraçar as mulheres e entender as diferenças e desafios que enfrentamos, muitos deles internos e bastante difíceis de superar, ainda veremos mulheres questionando suas capacidades e se mantendo fora dos espaços de gestão por simplesmente terem sido levadas a acreditar que não pertencem àqueles cargos.

Marina Fais é head de marketing na Raccoon.Monks