Com as dimensões de um país continental, o Brasil é considerado um dos principais mercados de consumo de vídeo no mundo. O streaming, porém, é visto ainda como um serviço para poucos diante da realidade socioeconômica. Afinal, os serviços por demanda requerem o pagamento de assinatura. Já a TV linear é para todos e chega a alcançar 93% da população brasileira.

O fato é que não faz sentido colocar a TV aberta e o streaming como concorrentes. Trata-se de uma estratégia de complementaridade de distribuição de conteúdo. Não à toa, os canais lineares já têm a própria plataforma de streaming. Na semana passada, a TV Cultura lançou a sua. Ela é gratuita e dá acesso à programação da emissora e das rádios Cultura FM e Cultura Brasil.

Enquanto o formato linear representa a democratização do entretenimento e informação no país, o streaming representa uma evolução, uma maneira de alcançar novas pessoas, de forma individualizada. A transformação está em andamento, mas ainda parece lenta.

Vale ressaltar também que houve retração da audiência do streaming nos últimos meses. De acordo com pesquisa nacional da Kantar Ibope Media, a audiência do streaming caiu 4% em fevereiro e 5% em março, enquanto a da TV aberta subiu.

Já o mercado de TV por assinatura vem sofrendo quedas sucessivas ano a ano. Segundo dados divulgados pela Anatel, em 2022, o mercado caiu 7,2%, totalizando 12,48 milhões de assinantes - a base de clientes em 2016 chegava a 19 milhões.

Especial nesta edição ouviu vários especialistas sobre o tema. Para Lilian Prado, country manager Brazil da ShowHeroes, a TV paga é a que mais tem perdido audiência e assinantes para os serviços de streaming. Ela acrescenta ainda que, globalmente, verifica-se que o consumo vem migrando da TV linear para as plataformas de streaming. “O público mais jovem é o mais favorável a consumir conteúdo com liberdade de escolha, sem a grade de programação característica da TV linear. No centro da mudança, está o consumidor, que percebeu que as plataformas de streaming oferecem mais variedade e liberdade de escolha”, avalia Lilian.

Ela lembra que, por outro lado, transmissões ao vivo, principalmente esportes, ainda são um desafio para essas plataformas. “O delay, mesmo que de poucos segundos, pode frustrar a experiência dos usuários.”

Outra questão que ainda não está totalmente definida é o modelo de negócios. É como se todos ainda estivessem em formato beta, testando as opções. A líder Netflix, por exemplo, levou anos para incluir publicidade e rever o seu modelo diante da acirrada concorrência. No fim do ano passado, anunciou a criação de um plano básico com anúncios.

Outras plataformas são gratuitas, porém, têm propaganda. Apesar do aumento exponencial da Smart TV, vale lembrar que a venda de anúncios publicitários na TV conectada ainda engatinha no Brasil.

A explosão de serviços de streaming, muitas vezes, também confunde o consumidor e pesa no bolso. Mas, verdade seja dita, a experiência de assistir a um filme, a uma série ou a qualquer outro conteúdo na hora que as pessoas desejam é espetacular.

No entanto, a gratuidade e o alcance da TV aberta são vantagens que nunca devem cair por terra. Por isso, ela tende a se manter soberana e o streaming se fortalecer no sentido de complementar o consumo de conteúdo, que continua sendo o rei. Mas, até mesmo o tipo de conteúdo que a TV e o streaming oferecem vem se misturando. A Netflix acaba de anunciar o lançamento de uma novela, expertise - até então - dos canais de televisão. Vale aguardar.

Armando Ferrentini é publisher do PROPMARK