A publicidade pode se tornar música. Pode assumir a forma de um texto inteligente e provocativo e informar alguém desatento. Para encantar e entreter, a publicidade pode se transformar em comerciais de 30 segundos ou até virar um filme de cinema mesmo. Publicidade vira poema. E se torna livro, série, documentário.

A publicidade pode ser metamorfosear em um depoimento tocante, uma piada ou em um objeto. Uma carta. Uma estátua de uma menina em frente ao símbolo máximo da indiferença global. Ela pode muito, a publicidade. Remodela-se em vitamina para negócios anêmicos. Diversifica-se na engrenagem que estava faltando no sistema de uma empresa em apuros. Que, de repente, faz tudo funcionar perfeitamente gerando empregos, riqueza, dividendos e alegria. Ela vira onda sonora, sinal de satélite, garrafa com mensagem e o que você criar.

Entre esses superpoderes da publicidade está o de se tornar o maior advogado da empresa que precisa se defender de um mal-entendido, acidente ou de um erro que pode lhe custar a existência. A publicidade fala para a opinião pública de jeito que ela entende. Salva vidas quando conscientiza e estimula mudanças de comportamento, como foi na ocasião da luta contra Aids e tabagismo. Ela consegue explicar o inexplicável, emocionar o cínico, agregar as commodities.

Através dela, instituições e empresas conseguem mostrar sua responsabilidade social e a sua importância para o dia a dia das pessoas. Ela promove riquezas, empregos, movimentos de vida, como promoções. Ela segue por e-mail, na rua, no rádio enquanto dirige, no podcast enquanto aprende e na TV enquanto assiste a um jogo ao vivo ou ao jornal do dia. A publicidade mexe com a química do corpo. Estimula emoções quando as mensagens são bem-criadas e bem-feitas.

Capaz de distribuir endorfina quando você ri de uma ideia bem encenada e produzida. Adrenalina ao empolgar você e ocitocina quando inspira ternura. A publicidade tem a capacidade de produzir uma mensagem que supere a força descomunal do negacionismo e isso pode ser a diferença entre sobreviver a teorias da conspiração ou do radicalismo religioso. Quem já perdeu amigos e familiares na pandemia sabe sobre o que estou falando.

A publicidade move a indústria do cinema nos intervalos vagos de produção dos filmes. Quando diretores de sucesso testam linguagens para usar depois em suas obras. Patrocina ousadias artísticas. Ela faz a garota ou garoto de periferia conhecer o mundo. Graças à ideia que produzem. Não há lugar mais diverso para as ideias do que a publicidade. Transforma o carinha da Lapa, num dos mais famosos empresários corintianos do planeta. Não importa de onde você venha, da Cohab ou dos Jardins, vai te dar voz na mesa. E você será ouvido.

A publicidade consegue ser o divisor de águas na biografia pessoal de quem não tinha talento para quase nada porque sabia um pouco de tudo. Onde os TDHAs poderiam ter sucesso? Os desatentos, os preguiçosos com talento. Aqueles com menos talento, mas muita disciplina. Onde mais, numa sociedade como a que vivemos aconteceria esse despertar. Essa consagração dos nerds do fundão. Que remunera dignamente quem preenche uma folha em papel em branco com coisas que saem da própria cabeça?

Mas, entre todas as formas e possibilidades, é preciso também cuidarmos da publicidade para que ela não se transforme em algo que não queremos. Em publicidade invisível, das fazendas de clicks, dos bots que engajam audiências de relatório, mas não consomem nada. Em campanhas sem ideias e desinteressantes, mas perfeitamente fáceis de aprovar e sem ousadia. A publicidade pode se transformar em economia inútil, quando clientes se recusam a remunerar uma ótima agência e preferem fazer tudo internamente. A publicidade e seu fluxo financeiro podem também financiar redes sociais que monetizam conteúdos de ódio, notícias falsas, negacionismos e mensagens antidemocráticas. A publicidade vai ser o que fizermos dela. Que todos os dias a gente acorde e trabalhe para que ela se transforme numa ideia legal, que emocione, surpreenda, traga orgulho e prosperidade a nossa vida e a nossa indústria.

Flavio Waiteman é CCO-founder da Tech and Soul
flavio.waiteman@techandsoul.com.br