O desejo faz parte da natureza humana. Antes do surgimento oficial do marketing e da publicidade, profissionais já faziam vendas e fidelizavam seus clientes. A posse de pedras preciosas, tecidos e temperos faz parte da história humana há muitos séculos, separando os humanos por “classes sociais”.

Essa divisão sempre foi motivo de disputas, guerras, desentendimentos e conflitos de todos os tipos. Logo, quando a publicidade dá seus primeiros passos, por volta do século 16 e 17, a ruptura social já estava montada, fazendo algumas pessoas se sentirem melhores e mais merecedoras do bom e do melhor do que outras.

Essa breve e rasa história da propaganda e do marketing é para falar sobre como a cultura do consumo nos fez chegar até aqui, por exemplo, com montanhas de roupas no Deserto do Atacama, 358 trilhões de partículas plásticas em alto-mar (ou 4,9 milhões de toneladas) e a produção, só no Brasil, de mais de 2 toneladas de lixo eletrônico por ano.

A publicidade não é “culpada” e o marketing não é o vilão. Mas, devemos assumir que ambos se tornaram agentes criadores de uma cultura compulsiva, que domina e adoece a sociedade.

Desconectadas de suas essências, inúmeras pessoas vivem para ter, outras para pagar contas e, muitas, para tentar sobreviver no meio da escassez. Qualidades humanas são deixadas de lado, o tempo virou artigo de luxo e trabalho. O que seria uma porta para a manifestação de talentos e o ponto de encontro para uma experiência significativa, se parece mais com uma prisão.

A cultura antropocêntrica que ainda domina nossos dias nos faz abusar do planeta, sem nos darmos conta que fazemos a mesma coisa com os recursos humanos que atuam profissionalmente em agências e escritórios, de pequeno e grande porte, espalhadas pelo mundo.

Como pedir para uma marca ser sustentável, quando seu nobre propósito ainda é desrespeitado, intencionalmente ou não, por muitos daqueles que deveriam ser “seus grandes aliados”? Como exigir qualidade e criatividade nas entregas, quando os prazos e verbas estão cada vez mais escassos?

Como exigir que uma marca seja coerente em suas mensagens, nas gôndolas, nos materiais promocionais ou nas ações de endomarketing, se suas agências ainda lidam com conceitos de ESG ou com os Objetivos de desenvolvimento sustentável como “perfumaria” ou apenas como estratégia de marketing?

Tenho acompanhado de perto que grandes players da indústria e do mercado publicitário estão se mexendo e isso é louvável. Mas, de acordo com o relatório Sustainable Marketing 2030, da Federação Mundial de Anunciantes e Kantar, esses avanços ainda não são suficientes.

Não basta 90% dos anunciantes concordarem que os programas de sustentabilidade precisam ser mais ambiciosos. São necessárias ações firmes e constantes, evitando flertar com o greenwashing e abrindo brechas para que funcionários e clientes digam: “Não avisei? Era tudo fake. Logo mais as coisas voltam como eram antes”.

Para que o tema sustentabilidade seja posto em prática dentro das organizações, é preciso muito mais que e-mail marketing ou mensagens nas televisões de elevadores e sala de espera. É preciso gerar consciência em todos e essa etapa depende de frequência, congruência e coerência.

Hoje, como um comunicólogo, especialista em felicidade e bem-estar, criador de conteúdo e consultor para agências e produtoras, digo que as marcas precisam de cuidado, de um zelo muito grande por parte dos seus gestores e, para que isso ocorra, precisamos “cuidar de quem cuida”.

Isto é, precisamos cuidar do bem-estar e da saúde mental das equipes de marketing, das equipes de criação, produção e atendimento das agências, do staff dos eventos, sets de filmagem e todos os envolvidos nessa enorme cadeia.

Os profissionais da área de marketing e publicidade, assim como nosso ecossistema, estão devastados. Seus recursos naturais estão cada vez mais escassos e, assim como estão em extinção inúmeros seres da fauna e da flora, os grandes talentos estão sumindo do mercado ou estão suportando seu cotidiano com sua saúde mental debilitada, através de medicamentos ou uso de drogas lícitas ou ilícitas.

De acordo com artigo publicado pela IPSOS em 17 de outubro, mais de 2/3 da população mundial acredita que se as empresas não agirem agora para combater as alterações climáticas, estão falhando com a sociedade, sendo assim:
Profissionais de marketing, ouçam a voz de suas marcas e ofereçam a elas a oportunidade de uma vida longa. Lembrem-se que o papel de um produto ou serviço vai muito além de gerar lucro. Ela satisfaz o desejo de clientes, mas também movimenta a vida de colaboradores, fornecedores e toda a comunidade.

Profissionais de publicidade, ofereçam as marcas que vocês atendem a oportunidade de chegar até o século 22, com ações éticas, sustentáveis e socialmente responsáveis para consumidores que anseiam pelo bem viver dos seus descendentes.

Líderes, o mundo mudou e é tempo de horizontalizar a gestão. Suas equipes são formadas por pais, mães e filhos, pessoas que sofrem os mesmos impactos causados pela crise climática e social que você, mas com menos recursos.

Como diz Raj Sisodia, um dos idealizadores do capitalismo consciente: “Não podemos ter um negócio consciente sem um líder consciente. E você não pode ser um líder se não for um ser humano consciente”. Antes de pensar em gráficos verdes, lucros para os sócios e prêmios, lembre-se que a alma de uma marca está em seu propósito, conceito que também tem extrema importância para a sustentação do bem-estar do ser humano.

O futuro da sua marca está intrinsecamente ligado com o futuro da humanidade e do planeta. Pense nisso de propósito!

Rodrigo Aquino é especialista em psicologia positiva e bem-estar