Historicamente a de melhor resultado brasileiro, sobretudo na última década, a área de Press do Cannes Lions terá, em 2013, dois representantes do país no júri – sendo um deles como presidente: Marcello Serpa, sócio e codiretor do board da AlmapBBDO. Ricardo John, CCO da JWT, completa o time sem prever se a presença de dois nomes do Brasil no grupo de avaliadores será benéfico ou não para o resultado do país, porém, tem a certeza: “é impossível o Brasil ir mal em Press”. Indo pela primeira vez ao festival como jurado, John pretende aproveitar a experiência para afinar critérios, fazer networking e principalmente ter contato direto com o que de melhor está acontecendo com a indústria mundialmente. “Sempre é possível se surpreender”, ressalta, mesmo lamentando não ser mais possível acompanhar tudo que o evento oferece.
Ligação
“Quando eu estava em Florianópolis, de onde eu vim, Cannes era um fetiche, um sonho, algo quase inatingível. Tinha um ar glamoroso, parecido com o que tem o festival de cinema. Quando eu vim para São Paulo, na Ogilvy, comecei a perceber que existia uma possibilidade real para aquilo, mas que era preciso correr muito atrás da cenoura, trabalhar muito para aquilo virar realidade. À medida que eu fui vendo que aquilo se tornava possível, ia me empolgando mais – querendo mandar mais peças, aumentar a possibilidade de ganhar algo no festival.”
Mudanças
“Uma coisa muito clara para mim é que, quando eu comecei a ir para Cannes, era um festival de publicitários para publicitários. Hoje ele é um festival de comunicação para todo mundo que trabalha com comunicação. O leque dele está muito maior. Antes via Cannes como uma espécie de clube, onde só redatores, diretores de arte e diretores de criação participavam, onde passávamos o dia inteiro em uma sala, entocados, vendo um monte de filmes e alguns anúncios. Hoje ele é muito mais complexo, a ponto de uma semana parecer pouco para tudo que acontece, fazendo você sair de lá com a sensação de que você viu 10% da coisa, sem foco nenhum. Os seminários estão cada vez mais interessantes, o currículo das pessoas que se apresentam durante o evento é cada vez melhor, tornando-o relevante para todo mundo que trabalha com comunicação e que, de alguma maneira, gosta de criatividade. Ele é um TED com pranchas na parede.”
Jurado
“Antes eu ia para Cannes para ser um observador, um voyeur, para me divertir. Este ano virou um job. O que muda indo como jurado, basicamente, é a pressão, a responsabilidade, essa coisa de representar o Brasil. Esses elementos fazem com que você tenha uma postura mais profissional que romântica do festival, não ficando mais apenas focado em trazer bons resultados para a agência, como alguém que apenas inscreve as peças, mas passando a ter também a pressão de trazer resultados para a rede JWT, para o país. Você coloca mais itens no check-list.”
Previsões
“Eu procuro nem pensar nessa possível responsabilidade por ajudar no resultado do Brasil na área. O parâmetro sempre será a qualidade das peças. Então, se a gente não trouxer 18 Leões, como no ano passado (foram um de ouro, seis de prata e 11 de bronze), é porque não tínhamos trabalhos bons para conquistar 18 Leões. Não existe jurado para defender peça ruim. Você só defende o que você acredita, o que acha bom e o que é consenso entre 18 pessoas. Não sei se vamos trazer 18 Leões de novo, ou 12, ou 20, mas tenho uma certeza: é impossível o Brasil ir mal em Press – especialmente pela paixão que os profissionais do país têm nessa área, pelo nosso histórico e pela importância que damos a ela, acima de outros mercados. Nós somos mais artesanais no lidar com a mídia impressa, levamos ela mais a sério.”
Presidente brasileiro
“Não dá para saber como vai ser. O festival está fazendo 60 anos, a pressão por trabalhos bons vai ser muito maior, então ter dois jurados brasileiros, sendo um o presidente do júri (Marcello Serpa, sócio e codiretor do board da AlmapBBDO), ainda mais sendo um dos ícones maiores da publicidade, é uma incógnita. Se essa combinação vai ser boa ou ruim para o Brasil, a gente só vai saber depois do fim do julgamento.”
Trabalhos do país
“Tenho visto bastante coisa, sim. Isso se intensificou na última semana, comecei a receber mais peças e já vi muita coisa legal. Eu ainda não tive tempo para ver tudo com maior profundidade, mas dá para ver que há um bom nível e, sobretudo, trabalhos diferentes de agências diferentes, muito além daquelas já consagradas e normalmente premiadas. Tem coisas de agências regionais do Rio Grande do Sul, de Belo Horizonte, de Curitiba. Acho que será algo bem diversificado – o que é muito bom para o mercado.”
Mídia impressa
“Para mim, independentemente de quanto ela pode ter enfraquecido ou não, perdido share ou não para outras mídias, ela continua sendo uma fonte de criatividade. O que é um bom post de redes sociais, que acaba recebendo um monte de likes, se não um belo anúncio? Se você reparar, os posts mais compartilhados nas redes sociais são bons anúncios, frases bacanas com uma boa direção de arte. É a mídia impressa adaptada ao digital. Para mim, aliás, a mídia impressa é a melhor forma de você trabalhar o visual e o texto para que você tenha a melhor mensagem, a mais divertida, a mais lúdica possível. Não podemos olhar a mídia impressa com a ótica de que ‘ela está perdendo relevância’. Ela é um playground das grandes ideias. Se você consegue ser sintético a ponto de explicar algo em uma página, imagina o que você pode fazer em 30 segundos. Ela é uma mostra de como o brasileiro é versátil criativamente, de como somos cuidadosos, minuciosos e capazes de sintetizar todo o conceito de uma marca em uma página.”
Fantasmas
“Acho que fantasma tem ‘cheiro’. É claramente perceptível. Se você trabalha para grandes marcas, principalmente, você sabe qual o intuito delas, o propósito, a missão, sabe o que está dentro e fora do que aquela marca está construindo. É fato que a área de Press sofre com esse tipo de trabalho, mas não acho que é a única. Hoje em dia você consegue criar histórias mentirosas em todas as categorias. É só uma questão de escala. Porém, considero que no Brasil e no mundo esse problema já foi pior. E digo, categoricamente: do que eu vi aqui, vi gente que se esforçou para criar e vender coisas muito boas aos clientes e que, de alguma maneira, fez um trabalho criativamente extraordinário. Muitas vezes há trabalhos ótimos que, se não ganharam larga escala, foi porque o cliente não teve a sabedoria – e às vezes colhões – para colocar ela no ar. Para mim existe a criatividade irresponsável, aquela que leva o criativo a fazer um anúncio ‘porque é legal pra cacete’, pura e simplesmente, e tem aquela que é uma pena não ter ganhado vida, porque seria bom para o cliente e para a agência. Às vezes o olhar é incentivado pelo pensamento de que ‘essa peça merecia ter um alcance maior’. Não quero ter um preconceito. Se a peça tem o potencial de ter uma vida maior e só não teve grande escala porque o cliente não comprou a ideia, eu acho válido premiar a criatividade. É só saber balancear o que é um trabalho criativo e o que é um trabalho irresponsável.”
Experiência
“Ir para Cannes, especialmente como jurado, é uma oportunidade única de afinar critérios, de fazer um excelente networking, de conhecer pessoas interessantes dentro daquilo que você faz – até por ficar enclausurado como um monge budista por quatro dias com esse grupo de pessoas de todos os cantos do mundo –, de entrar em contato com opiniões divergentes e de refinar suas referências. Obviamente você sempre volta diferente depois de uma experiência como essa, especialmente julgando uma área com tamanha intensidade como é Press. Acho que voltarei com um critério melhor, sabendo um pouco mais qual é o rumo que essa mídia vai tomar no mundo e, principalmente, derrubando alguns preconceitos e vendo que sempre é possível se surpreender.”
Evolução
“Se houver alguma evolução dentro da mídia impressa, será baseada em encontrar formas de adicionar algum outro sentido a ela. Tato, olfato, audição, tudo pode fazer parte. O anúncio pode ser ponto de partida para algo maior, para se fazer uma estratégia transmídia. Temos aqui na JWT, por exemplo, um case para Coca-Cola em que transformamos uma revista em um amplificador. Tudo vale quando o foco é fazer com efeito, fazer bonito e fazer com ideia.”
Quem é?
“Eu sou um ‘workaholic preguiçoso’, que adora trabalhar, mas não gosta de ficar na agência o dia inteiro. Sou um cara que devia estar correndo mais e bebendo menos, que tem três filhos, que é de Florianópolis e que se ressente de não passar mais tempo por lá. Aliás, eu sou ‘o outro’ torcedor do Avaí.”