Uma resolução do Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que considera abusiva a publicidade dirigida ao público infantil, passou pela análise na assessoria jurídica da Secretaria de Direitos Humanos, em Brasília, e causou alguma controvérsia na semana passada, ao ser tratada por parte da imprensa como uma medida que teria força de lei. Na realidade, trata-se de uma recomendação dirigida ao mercado, que considera abusivo o direcionamento de publicidade a menores de 12 anos e, portanto, contrário à Constituição Federal e ao Estatuto da Criança e do Adolescente. A resolução foi publicada no Diário Oficial da União no último dia 4, mas, ainda assim, não tem qualquer força como lei no país.
A publicidade dirigida ao público infantil está na mira de diversos grupos tanto do governo quanto da sociedade civil – como o Instituto Alanda, cujo advogado, Pedro Hartung, também chegou a confundir-se sobre o tema e a afirmar que a medida teria força de lei. Segundo relatou, a resolução foi definida em assembleia do Conanda, em que estavam presentes conselheiros eleitos pela sociedade civil e indicados pelos ministérios do governo federal – que de fato compõem o Conanda.
“A medida entra em vigor com a publicação no Diário Oficial e a fiscalização caberá aos órgãos do Estado, ao Ministério da Justiça. É um novo paradigma, um marco normativo e ético para as marcas no país”, afirmou o advogado, sem lembrar, no entanto, que os conselhos nacionais não possuem competência legislativa, segundo confirmou a própria assessoria do Conanda.
“O Conanda é um conselho, não tem poder de legislar. O ambiente para isso é o Congresso Nacional, onde a Abap atua, porque é lá que as leis são propostas, discutidas e aprovadas ou não, num ambiente democrático”, disse Orlando Marques, presidente da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap).
A entidade tem sido convocada sistematicamente para comparecer a audiências e tomar conhecimento de projetos de lei que dizem respeito à publicidade de produtos infantis.
Uma audiência pública, por sinal, está agendada para 15 de abril, em Brasília, para debater o Projeto de Lei nº 702/11, que altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, restringindo a veiculação de propaganda de produtos infantis. O evento é iniciativa do deputado Aureo Ribeiro, do SDD do Rio, autor de vários projetos que envolvem restrições à propaganda.
“Para nós está claro que os conselhos nacionais não têm competência legislativa. Eles podem recomendar, mas só vira lei se for uma Medida Provisória do Executivo enviada ao Congresso ou um Projeto de Lei aprovado pelo Congresso Nacional. Ou seja, essa resolução não é o final, mas eventualmente mais um começo de um processo como diversos outros semelhantes tramitando”, disse Rafael Sampaio, porta-voz da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA).
Da mesma forma, a Federação Nacional das Agências de Propaganda (Fenapro) afirma que publicidade deve ser tema legislado apenas no Congresso Nacional. “No primeiro bimestre de 2014, o Ministério Público do Trabalho convocou as agências para firmarem um compromisso de respeito às regras pertinentes ao trabalho infantil, com a solicitação de alvará judicial sempre que houver um menor presente em produção publicitária. E é desta forma que estamos operando”, concluiu o presidente da Fenapro, Gláucio Binder.
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) é um órgão ligado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, criado pela Lei n. 8.242, de 12 de outubro de 1991, e é o órgão responsável por tornar efetivos os direitos, princípios e diretrizes contidos no Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Conta, em sua composição, com 28 conselheiros, sendo 14 representantes do governo federal, indicados pelos ministros e 14 representantes de entidades da sociedade civil organizada no âmbito nacional e de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, eleitos a cada dois anos. O conselho é presidido pela socióloga Miriam José dos Santos, representante da Inspetoria São João Bosco Salesianos, uma instituição católica de assistência social.