Desde 2005, Ernesto van Peborgh se dedica a estudar como as redes sociais podem contribuir com o desenvolvimento sustentável. O executivo, fundador da consultoria El Viaje de Odiseo, considera essas e outras plataformas de compartilhamento de conhecimento como ferramentas que podem dar a última chance à sociedade para que mude os rumos do consumo desenfreado e, consequentemente, seu próprio destino. A ideia é apresentada e explicada no livro “Redes: o despertar da consciência planetária” (DVS Editora), lançado na semana passada no Brasil.
Na obra, Peborgh analisa o encontro da web 2.0 e a urgente necessidade de mudança para um modelo de desenvolvimento sustentável, que ele define como “o que permite a espécie humana subsistir neste planeta e no futuro”. “O que eu proponho no livro é que os seres humanos hoje não têm a consciência e nem as ferramentas intelectuais para organizar nosso conhecimento a um nível global. Os meios sociais são nossa última oportunidade de levar nosso nível de consciência mais adiante”, explica.
O argumento de Peborgh tem como base as teorias de Robert K. Logan e Marshall McLuhan, em que os seres humanos inventam uma forma nova de comunicação toda vez que estão diante de novas situações complexas. Tais mudanças provocam transformações também no modo como a sociedade percebe o mundo e obriga o homem a pensar em uma maneira diferente de lidar com o conhecimento. Com a internet e, consequentemente, as redes sociais, o executivo sustenta que o homem está criando “uma rede de mentes conectadas, uma visão holística do mundo, mais transparente”. Isso leva a uma nova linha de pensamento semelhante à proposta por Nicolau Copérnico no século XVI – o homem adquiriu a consciência de que não é o centro do mundo, e sim “uma parte do metabolismo, da equação planetária”.
O resultado da união desses fatores vai ao encontro da teoria de Elinor Ostrom, vencedora do prêmio Nobel de Economia de 2009, para quem o ser humano, pela primeira vez, está construindo conhecimento coletivo disponível para todo mundo e em constante aprimoramento. “Os seres humanos estão criando um recurso que não se degrada com a utilização. Pelo contrário, se potencializa. Com os meios sociais, temos a oportunidade de criar esse novo capital, que é o conhecimento coletivo de todas as pessoas em um espaço comum. E isso é possível fazer dentro das empresas também”, argumenta Peborgh.
O discurso, porém, não fica apenas na teoria. O argentino cita uma série de casos em que jovens da chamada Geração Y que, com 20 e poucos anos – ou menos –, encontraram soluções para problemas tecnológicos, médicos e ambientais com base em informações encontradas com simples buscas no Google e na Wikipédia, o que ocorre graças ao salto de consciência que eles deram com a redes sociais. “A nova geração entende que o conhecimento está disponível e tem linguagem para acessá-la. Nós olhamos para cima e vemos um teto branco, enquanto eles veem esse conhecimento. Para que a sociedade toda dê esse salto de consciência é uma questão de tempo. O problema é: temos esse tempo?”, questiona.
Titanic
Peborgh chama a atenção para a urgência da mudança traçando um paralelo entre o planeta e o Titanic. Ele identifica dois problemas no caso do transatlântico, que naufragou em abril de 1912 após se chocar com um iceberg. O primeiro era a crença disseminada, porém infundada, de que a embarcação era indestrutível e, logo, jamais poderia afundar. O segundo residia na pressão imposta pelo dono do navio sobre o capitão, que deveria fazer a viagem de Southampton a Nova York levando um dia a menos do que o previsto, para que o fato virasse notícia mundialmente. Pressionado, o comandante ignorou os avisos sobre os icebergs na rota e a colisão aconteceu.
O casco do Titanic tinha nove compartimentos, dos quais cinco eram necessários para que o navio permanecesse flutuando. O problema é que a colisão fez com que cinco fossem danificados – um a mais do que o limite –, levando a embarcação ao naufrágio. A comparação de Peborgh tem como base os nove limites planetários do Stockholm Resilience Center. Três deles já foram rompidos – a perda da biodiversidade, as mudanças climáticas e as mudanças no ciclo do nitrogênio na atmosfera. Se a sociedade permanecer produzindo e consumindo na atual velocidade que está e ignorar os alertas ambientais, exatamente como fez o Titanic, outros limites podem ser ultrapassados.
“No livro, trato da oportunidade do surgimento desses novos meios para provocar rapidamente essas mudanças. Só rompemos três limites, mas nesse caminho ultrapassaremos outros. Não sabemos quantos compartimentos o nosso planeta pode perder”, completa.
Empresas
As redes sociais criaram essa rede de conhecimento comum em uma escala global, à qual qualquer pessoa conectada à internet tem acesso. O mesmo conceito, porém, pode ser aplicado em universos menores e mais restritos, como empresas. A El Viaje de Odiseo, fundada por Peborgh em 2005, aproveita essas ideias para desenvolver plataformas que captam o conhecimento e a criatividade dos funcionários para transformá-los em capital social usado para o desenvolvimento da companhia.
“Nosso trabalho é criar esses reservatórios de inovação e criatividade para as empresas. Criamos plataformas interativas que permitem captar o conhecimento tácito que está em cada um dos indivíduos e compartilhá-lo como um conhecimento coletivo disponível a todos. É um tipo de Wikipédia um pouco mais sofisticada, onde todo o conhecimento da empresa está disponível para todo mundo e em constante aperfeiçoamento”, explica.
Um sistema desse tipo foi implantado na Telefônica da Argentina e conta com 13 mil funcionários que participam ativamente dando ideias, opinando e compartilhando informações. “O objetivo é fazer com que as pessoas atuem como pontes, fazendo com que diferentes áreas da empresa troquem informações sobre assuntos diversos, gerando conhecimento que, compartilhado, pode ser usado pelos demais indivíduos para encontrar soluções, a exemplo do que os jovens fazem com o que está disponível na internet”, conclui Peborgh.