Uma das mais importantes e definitivas lições da administração moderna remonta há muitos séculos antes de Peter Drucker definir e eleger o marketing, em 1954, como sua ideologia. De responsabilidade de Santo Ambrósio, bispo de Milão. Quando Santo Agostinho chegou a Milão para ensinar retórica, Santo Ambrósio o alertou, “Agostinho, pode marcar suas aulas para sábado porque aqui, em Roma, a congregação não tem por hábito jejuar nesse dia”. E complementou, “quando em Roma, faça como os romanos”.
Natal. Terça-feira, 5 de dezembro de 2017. Festa! Grupo Leroy Merlin traz mais uma de suas marcas para o Brasil. Merece uma grande matéria da revista Pequenas Empresas Grandes Negócios. Na matéria a revista diz: “Imagine entrar numa loja como se estivesse chegando à sala da casa de um amigo e, de quebra, poder tomar um cafezinho passado na hora, aprender um novo ponto de tricô ou uma receita de bolo, e até levar para casa um kit para fazer cerveja artesanal… É exatamente essa a experiência que se tem ao chegar à loja da Zôdio, do grupo francês ADEO (Leroy Merlin), que abre suas portas nesta terça-feira, dia 5 de dezembro de 2017, na Marginal Tietê, cidade de São Paulo… A proposta da nova bandeira do grupo não é só vender produtos para casa, que são muitos – 18 mil –, mas atender às demandas dos clientes em diversos momentos da vida, ensinando como se faz muitas coisas, da culinária ao artesanato…”. A decisão de vir para o Brasil, segundo Gauthier Lenglart, diretor da Zôdio, estava respaldada em pesquisas: “Durante dois anos visitamos a casa de 500 famílias no Brasil e descobrimos que as brasileiras são mais artesanais do que as francesas. Também observamos que elas buscam renda extra com venda de bolos e artesanatos, por exemplo… pretendemos ter cinco lojas em quatro anos…”. Um ano e 11 meses depois, 7 de novembro de 2019, jornal Valor: “Zôdio, do mesmo grupo da Leroy Merlyn, fecha operação no Brasil”. E no corpo da notícia, “Procurada, a empresa confirmou a notícia, mas preferiu não entrar nos detalhes da decisão… uma fonte do setor atribui ao modelo ‘faça você mesmo’ não ter sido bem-recebido no Brasil”, e ainda sensivelmente agravado pela crise econômica que atravessa o país.” O que aconteceu? Pesquisa superficial, leitura e interpretação precária. Tudo o que a fotografia revelou, na aparência, foi o observado pela empresa, mas, faltou a sensibilidade para ler e ver além ou atrás da fotografia, de entender as verdadeiras razões e motivos que levariam, supostamente, milhares de mulheres e famílias a aderirem à proposta. Uma vez mais empresas do varejo europeu revelam enorme dificuldade em entenderem o que move consumidores e famílias brasileiras. Salvo raríssimas exceções, e até mesmo por uma questão cultural, os brasileiros jamais se adaptaram, na plenitude e em volume suficiente, ao verdadeiro conceito do Do It Yourself.
Para nós, brasileiros, o do it yourself é literal. Nós mesmos é que queremos comprar tudo do nosso jeito ainda que anarquicamente, e definirmos como será o nosso modelo e específico de fazer e produzir coisas por nós mesmos. Talvez, muito provavelmente, e para nós, brasileiros, o prazer, no mínimo em igualdade de condições, esteja na busca intensa e detalhada, e não já começar com a segunda parte, com tudo pronto esperando só pelo Do It, e sem o prazer, a alegria e a felicidade da busca, do ir atrás… Isso de ir numa loja e encontrar tudo, ou os kits prontos, não bate muito com nossos santos e cultura. Diferentemente, talvez, da milenar cultura europeia… Assim, e uma vez mais, a mesma lição contida na Lição de Santo Ambrósio. “When in Rome, do as the Romans do”. Franceses, quando no Brasil, tentem pensar e agir como os brasileiros pensam e agem. Caso contrário, continuará não dando certo.
Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)