Depois de um Cannes Lions diferente, totalmente virtual, fica clara a sensação de que queremos, sim, a continuidade do festival, que completou este ano 67 anos de existência. Mas queremos que seja por inteiro.

No ano passado, também na quarta semana de junho, escrevi aqui nesta coluna sobre a minha frustração por ter acompanhado um Cannes Lions somente pelas telas. O título do meu artigo foi: Cannes Lions 2020: eu fui?.

Apesar de acompanhar o máximo possível remotamente, a experiência online está longe de se equiparar à presencial. E em 2020 teve ainda o agravante de acompanharmos somente as palestras online: não houve premiação. Já este ano houve a volta do evento com seu formato completo: premiação + conteúdo, mas ainda totalmente virtual.

Não faltaram recursos para tentar nos transportar virtualmente para a Riviera Francesa. Houve até uma plataforma de networking onde fazíamos nossos avatares se encontrarem com delegates de outros países. É louvável a tentativa da Ascential, empresa dona do festival, de tentar preservar a realização do Cannes Lions, mesmo nas condições adversas de um ano de pandemia.

Mas, como bem disse Phil Thomas, chairman do festival, em entrevista ao Estadão, “estamos todos ansiosos pela volta do evento presencial, em 2022”. Mas está certo de que nada será como antes. Depois de dois anos de experiências virtuais, muitos optarão por acompanhar o festival remotamente, como o fizeram este ano.

É possível que a muvuca na Croisette e nas imediações do Palais des Festivals não seja a mesma de anos anteriores. Mas temos de nos acostumar com esse novo formato dos eventos.

O hibridismo veio pra ficar. Quando não tivermos mais limitações para realizar eventos presenciais, não poderemos ignorar a experiência virtual paralela. Quem quiser respirar os ares da Riviera ao vivo e sentir o calor do verão na Côte D’Azur, no ano que vem, vai pagar o preço alto da experiência completa, presencial. Mas quem optar por algo mais em conta, vai poder continuar acompanhando o festival remotamente.

A decisão dos organizadores de criar um formato de membership, pelo qual você paga uma anuidade para receber conteúdo relevante, não só durante a terceira semana de junho, mas ao longo de todo o ano, é inevitável.

Conteúdo é rei e a grife Cannes Lions tem peso suficiente para suportar uma plataforma permanente de estudos, artigos, fatos e tendências da criatividade.

Mas o risco de diluir o conteúdo ao longo do ano é um possível esvaziamento do tradicional megaevento, esperado ansiosamente todos os anos por profissionais de marketing e da indústria criativa.

Será que mais de 10 mil pessoas (número de inscritos em anos anteriores) estarão dispostas a fazer um investimento de uns 5 mil euros (por baixo) para acompanhar ao vivo o festival no ano que vem?

Para os autores das aproximadamente 30 mil inscrições (este ano foram 29.074), a expectativa de levantar um Leão no palco do Lumière, no Palais des Festivals é priceless, mas é para poucos. A justificativa para estar presente ao festival extrapola a premiação.

Se o conteúdo será distribuído a conta gotas durante o ano, restará ainda o rico networking que o evento proporciona. Não à toa, o festival atrai cada vez mais profissionais de negócios. Nos corredores do Palais e nos diversos eventos e festas paralelas, muitos negócios e conexões produtivas são turbinados.

Quando estive no Cannes Lions a primeira vez – lá se vão mais de 20 anos – eu era um estranho no ninho, um profissional de atendimento e negócios de agência no meio de um mar de criativos.

Hoje, o festival se abre para anunciantes, empresários e profissionais de negócios, que se misturam aos tradicionais criativos, formando um rico caldeirão de expressões e negócios da indústria criativa. Que venha o Cannes Lions 2022! Mas que venha por inteiro.

Alexis Thuller Pagliarini é presidente-executivo da Ampro (Associação de Marketing Promocional) (alexis@ampro.com.br)