José Galló: “Quando o mercado está favorável  para o consumo, arrasta todo mundo; porém, quanto está restrito, como  no cenário atual, permanece quem  tiver diferencial competitivo”

O CEO das Lojas Renner, José Galló, conta nesta entrevista o que está por trás dos resultados da maior varejista de moda do país em volume de vendas. Galló disse que a marca caminha para consolidação nacional. Atualmente, são 232 lojas, mais 58 da Camicado e 23 da startup YouCom. Até 2021, a expectativa, segundo ele, é ter 408 pontos de vendas da marca Renner; 125 da Camicado e há potencial para ter 300 lojas YouCom. Mas, apesar da previsão de ampliação das marcas do grupo, Galló acredita que o ano de 2015 será desafiante: “Vai ser um teste para todos nós varejistas”. A Renner adquiriu em 2011 a rede de utilidades domésticas, artigos de cama, mesa e banho e decoração, Camicado. Já a marca de moda jovem YouCom, substituiu, em julho de 2013, a Blue Steel.

Como estão a Lojas Renner hoje?

Estamos a caminho da consolidação nacional. Atualmente, são 232 lojas Renner no Brasil, mais 58 da Camicado e 23 da YouCom. Vamos acabar o ano com 245 lojas Renner. Somos uma marca muito bem-posicionada junto ao nosso target, das classes A menos e B e C mais.

Quais são as expectativas de crescimento?

Nós podemos crescer em número de lojas novas e também em share. Temos potencial para colocar mais venda por metro quadrado nas nossas lojas. Para 2021, a expectativa é ter 408 lojas Renner, 125 Camicado e há potencial para ter 300 lojas YouCom, a startup da empresa.

A nova marca YouCom está crescendo?

Esta marca tem potencial para mercados menores com possibilidade de operar em franquias e multimarcas. YouCom começou como Blue Steel. Para sermos uma cadeia nacional da YouCom, nós provavelmente usaremos o sistema de franquias nos pequenos e médios mercados, quando há volumes menores de vendas, pois isso não viabiliza uma operação própria pelos altos impostos que temos de pagar. O público-alvo da marca é o jovem adulto entre 18 e 35 anos e da mesma classe social da Renner. Os jovens gostam de lojas mais especializadas. Não somos concorrentes da Hering porque eles exploram um lifestyle mais casual e nós exploramos outro lifestyle. O nicho da YouCom está bastante vazio e o potencial é chegar a 300 lojas em 2021.

Qual é o posicionamento de cada uma das marcas dentro do grupo?

A Renner tem um forte foco em moda dirigida para o público feminino. A Camicado é líder no segmento casa e decoração e o público-alvo é o mesmo da Renner. Manter o mesmo core é muito importante quando se faz expansão. Já a YouCom é focada no jovem entre 18 e 35 anos e não tem concorrentes diretos.

Qual é a expectativa em relação à Camicado em termos de crescimento?

A marca praticamente não tem concorrente. É bastante forte, reconhecida e líder em lista de noivas. Assim como a Renner, a Camicado também é moda. Nós vemos cada vez mais cama, mesa e banho como moda. É impressionante como cresce o número de lojas de decoração e móveis. O país, quando atinge uma determinada renda per capita, passa a ter uma parte desse dinheiro voltado para itens de decoração. Somos o único player nacional e estamos melhorando o mix, aumentando o percentual de produtos importados. A margem dos produtos importados é maior.

Como o senhor está vendo o ano de 2015?

Será um ano de desafios, um teste para todos os varejistas. Em mercados mais restritos, tem de haver proposta de valor bastante diferenciada. Quando o mercado está favorável para o consumo, arrasta todo mundo. Porém, quando está restrito, como no cenário atual, permanece quem tiver diferencial competitivo. Esse valor se materializa em produto, prestação de serviço, qualidade dos produtos, loja e marca forte. Há uma seleção natural e, nos momentos de insegurança, o consumidor procura marcas fortes.

O que acontecerá com a Renner neste cenário econômico?

Houve grande crescimento de 2004 até 2014 no Brasil, independente de sua capacidade. Costumo brincar que, quando começam a aumentar as placas de aluga-se, é um indicador de que está havendo um processo seletivo.

Como o senhor avalia o momento atual do mercado de vestuário?

Vemos esse mercado muito fragmentado. 90% das empresas varejistas têm até 19 funcionários e acredito que ainda há muito espaço para crescimento do setor. Atualmente, a participação das cinco maiores empresas do segmento no país representa somente entre 12% e 13% e pode subir para 20% a 22% do total. Existe potencial para quase dobrar nossa participação. A informalidade no varejo do vestuário é muito alta no Brasil – fica entre 35% e 40% do setor. É uma situação danosa para o país porque reduz a produtividade do setor, representa a sonegação de impostos e evita que as companhias menores cresçam e se modernizem. Quem é pequeno não investe em equipamento nem em tecnologia.

Vocês estão deixando cada vez mais as lojas de rua para investir nos shoppings. Qual a estratégia?

Embora o foco seja nas lojas em shoppings, onde estão 94% dos pontos, avaliamos oportunidades de aumentar o número de lojas de rua para ocupar espaços de varejistas menores que deixarem o mercado em função da economia. A rede deve encerrar 2014 com 245 pontos de venda, e apenas 6% das unidades estão fora de shopping centers. Direcionamos nosso crescimento para os malls e todas as nossas lojas são alugadas, porque nosso negócio é moda e não mercado imobiliário.

Com tantas diferenças regionais, como a marca está crescendo nas diferentes regiões?

Ainda temos muito espaço para conquistar. A Renner do Sul tem mais de 30 anos, é adulta. Nós temos alto share of mind, que se adquire com o tempo. Na região Sudeste temos em torno de 28% de share e, no Nordeste, entre 18% e 19%. Significa que podemos crescer não somente através de novas lojas, mas ganhando share, algo adquirido com o tempo. Podemos colocar mais venda por metro quadrado nos mercados novos.

Vocês costumam contar as sacolas para medir o share?

Sim, nós contamos sacolas. Todas as quintas-feiras, das 4h até as 5h, nossos colaboradores contam quantas sacolas saíram das nossas lojas e das concorrentes. Fazemos isso desde 1999 e calculamos o share por loja. Lógico que não é estatisticamente preciso, mas mostra uma tendência. Mostra que nosso share é bastante relevante. No Sudeste, começamos a operar no ano de 2000 e hoje já temos mais share que nossos concorrentes. No Nordeste, os dois concorrentes têm share maior que o nosso, mas nos dois últimos anos tem havido aproximação.

Com tantas diferenças regionais no Brasil, como a Renner equaliza a comunicação?

Num certo sentido, as mulheres são todas iguais. A Renner quer ser cúmplice da mulher moderna, e todas as mulheres gostam de cumplicidade. Nosso comercial do Dia das Mães, por exemplo, foi pura emoção. Qual mulher, independente de classe social ou região, não é tocada por emoção?

Como a Renner cria suas coleções?

Temos 16 marcas próprias. Nossa forma de construir coleção é por lifestyle – a segmentação de mercado por estilo de vida. Escolhemos os 16 estilos mais representativos e cada um deles é representado por uma marca. Isso facilita a escolha das nossas consumidoras.

Além das lojas físicas, a Renner também está investindo no e-commerce. Como anda essa operação?

Nosso e-commerce vem crescendo na faixa de 35% a 40% ao ano e também é um canal de relacionamento. Temos várias formas de relacionamento, mas essa complementa, transformando relacionamento em transações comerciais. Iniciamos em 2010 e oferecemos todo nosso mix, com entregas em todo Brasil. Oferecemos ainda a possibilidade de troca nas lojas físicas, o que nos dá uma vantagem importante. Praticamente todos os e-commerces no mundo abrem uma ou duas lojas para mostrar que existem. Nós fazemos o oposto, nossas lojas dão suporte ao e-commerce, o que dá bastante credibilidade. Hoje, o e-commerce brasileiro está voltado para marcas mais altas ou para coisas básicas. Nós estamos no meio: moda com preços acessíveis e que pode criar uma sinergia muito boa.

A Renner trabalha com o fast fashion?

Nos recusamos a chamar de loja de departamentos. Somos um varejo que aumenta cada vez mais a sua velocidade. Trabalhamos para reduzir cada vez mais o tempo entre “pensou num produto e entregou na loja”. Hoje é em torno de 45 dias e queremos que se reduza para 30 dias. Temos que fazer isso para nos tornamos competitivos.

E a competição com os importados?

Hoje sabemos que o Brasil tem barreiras fortíssimas. Um produto que compramos por US$ 100 na Ásia chega ao centro de distribuição por US$ 190. No Chile, por exemplo, chega por US$ 120. Por isso tantos vão comprar em Miami. Nossas importações foram de US$ 2,9 bilhões. Já os gastos no exterior, em cartões de crédito, foram de US$ 23 bilhões, com 30% deste volume em roupas. São muitos impostos, taxas, custos de logística, e temos que lutar contra isso também.

Como é o relacionamento entre a Renner e a agência Paim?

Quando o relacionamento é bom, se materializa nas campanhas. Eu estou muito satisfeito. Aliás, não somente eu, mas o consumidor. O comercial do Dia das Mães teve 30 milhões de views na internet, apesar de ser um comercial de mídia de massa, então atingiu seu objetivo. Uma relação entre anunciante e agência aparece no produto final, nas peças de comunicação.

Quanto a Renner investe em comunicação?

Entre 2% e 3% do faturamento com as vendas.