Profissionais do setor garantem que sons e músicas são cada vez mais usados por empresas para o consumidor memorizar produtos e serviços

A identidade sonora, ou sound branding ou ainda áudio branding, é o uso de sons e músicas para criar identificação de uma marca ou produto por meio da audição, funcionando como uma assinatura - o exemplo brasileiro mais famoso talvez seja o “plim plim”, da Rede Globo. “A identidade sonora é uma maneira inteligente de garantir uma memorização e associação afetiva da marca no dia a dia das pessoas. Somos impactados ao longo da vida por diversos tipos de sons e eles nos remetem a momentos específicos que tivemos. Um exemplo, para perceber o impacto de uma identidade, é saber que ao ouvir ‘plim plim’ um programa voltou do intervalo ou que um ‘tudum’ indica que vai começar uma produção original de um serviço de streaming”, sintetiza João Netto, diretor de criação da 3mais.

Guilherme Zomer, diretor da Filomena Studio, complementa resumindo que “áudio branding é o desenvolvimento de sons e músicas que representem e transmitam os valores e mensagens de uma empresa de maneira direta ou subliminar na comunicação, podendo ser aplicadas em vídeos, jingles, comerciais ou em experiências de usuários de formas variadas”.

“Para a criação de uma marca sonora, deve-se considerar sintetizar a identidade da empresa, traduzindo-a nas escolhas das notas, na intenção da melodia, no seu mood, na voz, na escolha dessa voz, timbres e texturas. Você pode nunca ter parado para pensar, mas para chegar neste resultado, que envolve aquele público consumidor, há todo um conceito por trás. Às vezes, é apenas um único som com um slogan”, situa Bia Ambrogi, presidente da Apro+Som, que complementa dizendo que “o music branding pode ser visto nos fonogramas criados e encomendados pela marca, como nos jingles e nas assinaturas sonoras. Os jingles contam uma história e as marcas sonoras fazem a assinatura e a identidade daquela empresa”.

Essa visão da presidente da Apro+Som é partilhada por Diego Guimarães, diretor de produção da S de Samba. “O sound branding é um conceito muito amplo e pouco usado em sua totalidade. Em verdade, é um conceito guarda-chuva que tem amplas possibilidades, mas, na maioria das vezes, utilizado apenas em um ou dois elementos. Trata-se de entender a identidade corporativa da empresa em sua totalidade e traduzir isso em uma identidade sonora para ser implementada em todos os pontos de contato do cliente, como filmes, rádio, celulares, pontos de venda, eventos, podcasts, assistentes voz etc.”, afirma Guimarães, que enumera os possíveis elementos de sound branding: Logo sonoro: geralmente curtos, memoráveis (Intel e Coca-Cola são alguns exemplos); Tema sonoro: temas melódicos que se repetem em diferentes usos; Trilhas: peças maiores de música derivadas do conceito de identidade sonora; Soundscape: atmosfera sonora ou paisagem sonora para ser usada em ambientes ou mídia como internet;
Voz: quando atrelamos uma determinada voz ao cliente e essa voz é usada constantemente na comunicação da empresa; Jingle: quando cantamos a mensagem do cliente.

“Outros possíveis usos seriam a criação de sons específicos para produtos, ou a criação de sons para experiências UX/UI”, complementa Guimarães, que resssalta ainda que “muitos sound brandings são criados, mas a minha percepção é de que só ‘pegam’ aqueles que martelam durante anos na nossa cabeça”. “Esses, sim, ficam inesquecíveis. Um sound branding que dura um ou dois anos e não está presente em todas as peças do cliente geralmente cai em desuso. O Mostra sua força Brasil é um exemplo de sound branding em forma de música que fizemos para o Banco Itaú e já se repete há algumas Copas.”

Fernanda Costa, sales associate da Satelite Audio, ressalta que “com o frenesi de informações visuais e sonoras a que somos expostos hoje em dia, um som reconhecido vira conexão emocional quase que instantaneamente: o cuco na casa da avó, o som do plim do forno enquanto você espera um bolo ficar pronto, ou até mesmo uma sirene na rua. Cada som desperta e nos conecta a um tipo de emoção”.

Five Notes
Giovani Marangoni, professor do curso de comunicação e publicidade da ESPM Rio, explica que as marcas estão o tempo todo procurando maneiras de serem lembradas e, para isso, buscam estímulos multissensoriais para chamar a atenção. “O mais comum e poderoso é o estímulo visual, porém o estímulo auditivo tem uma grande vantagem, que é justamente não precisar ter um foco do olhar, pois o som está 360 graus ao redor da pessoa. Isso é fundamental para as marcas, pois elas conseguem chamar a atenção mesmo que a gente não esteja olhando para o mesmo lugar.”

Para o professor da ESPM, os produtores de Sound Branding já entenderam o conceito da neurociência e utilizam uma tendência mundial chamada de Five Notes, que é utilizar as cinco notas musicais para criar marcas sonoras. “O cérebro de uma pessoa normal, mesmo que ela não seja necessariamente da música, consegue diagnosticar a distância de uma nota e outra, e estudos neurocientíficos afirmam que quanto mais próxima é a distância de uma nota a outra em uma melodia, mais involuntariamente o cérebro guarda. Isso explica a impressão de uma marca sonora na lembrança do consumidor, por mais que ele nem queira e sem a necessidade de uma atenção visual.”

Trenzinho do Caipira
Para Celso Piratininga Jr., sócio e CEO da Adag Comunicação, “toda marca deveria pensar em desenvolver uma identidade sonora exclusiva e estratégica, pois as possibilidades trazidas pelo sound branding são infinitas. Em um mundo visualmente estressado por multitelas e conteúdos com forte apelo, de toda natureza, os ouvidos passam a ter uma relevância cada vez maior como canal privilegiado de comunicação”.

Ele conta um case de sound branding de sucesso que a Adag desenvolveu para o Metrô de São Paulo. “O Metrô de São Paulo é uma grande marca e tem sido considerado pelo Datafolha, por anos seguidos, o melhor serviço público metropolitano e melhor modal de transporte público da cidade. Apesar de toda essa interação e de todo esse prestígio, a opinião dos passageiros sobre o Metrô não era tão boa quando o assunto em foco era a comunicação. As pesquisas realizadas regulamente pelo Metrô de São Paulo junto aos seus passageiros apontavam um déficit de qualidade em relação à maneira como informava e se comunicava nos ambientes das estações, plataformas e trens. Ou seja, uma percepção negativa. Com isso surgiu o projeto de sound branding do Metrô de São Paulo. A Adag criou, produziu e renovou, em conjunto com a produtora Lógico Music, do maestro Milton Miné, o conjunto das aproximadamente seiscentas mensagens sonoras emitidas/veiculadas em estações, plataformas e trens (mensagens denominadas P.A. – Public Address). E, para além desse conteúdo técnico, também criou a nova marca sonora do Metrô de São Paulo, inspirada em Villa-Lobos”.

(Crédito: Pawel Czerwinski na Unsplash)

Leia a matéria completa na edição de 20 de março