A primeira frase do briefing era excitante e assustadora: “Criar uma campanha memorável para Tide, algo melhor do que a premiada ‘Bradshaw Stain’ do ano passado.” É, o sarrafo começava na lua
Os meses seguintes foram meio como trabalhar na Serra Pelada: nós e alguns outros criativos garimpando pesado dia e noite para chegar naquela ideia preciosa. Historicamente, as campanhas de Tide sempre giravam em torno de manchas e como removê-las. Portanto, as ideias que se afastavam dessa estrutura não estavam seguindo em frente internamente. No fim de outubro, depois de mais de 2 meses e vários rounds, junto com nosso CCO, Javier Campopiano, o ECD Paul Bichler e outros criativos, fechamos a ideia, que fugia um pouco do que Tide havia feito no passado, mas parecia ser algo que tinha potencial: qualquer comercial com roupa limpa é na verdade um comercial de Tide.
Através desse pensamento simples, tínhamos a ambição de tentar nos apropriar de todos os comerciais do Super Bowl.
Para nossa sorte, o cliente adorou a ideia e, a partir daí, viramos uma só equipe focada em chegar na melhor execução possível para esse programa, pensando não apenas no filme de 30 segundos, mas sim no formato que era necessário pra comunicar a ideia do melhor jeito. Então, enquanto de um lado criávamos minuciosamente cada cena, cada palavra, cada gesto, do outro lado, o atendimento e o cliente faziam de tudo para buscar parcerias dentro e fora da P&G para viabilizar, por exemplo, o famoso protagonista de Old Spice e o comercial do ano passado de Mr. Clean, além da parceria com a NBC para colocar Tide inclusive dentro do jogo.
Faltava ainda nosso protagonista. Depois de muitas negociações, David Harbour foi definido, o que era perfeito considerando o sucesso recente de “Stranger Things” e o fato de ele nunca ter feito propaganda antes. Os diretores escolhidos foram o coletivo Traktor, da Rattling Stick, os mesmos que fizeram no ano anterior “Bradshaw Stain”, e a direção de fotografia ficou com Hoyte van Hoytema, o mesmo de “Interstelar”, “Ela” e “Dunkirk”. Tudo foi filmado em cerca de uma semana em Los Angeles, em diversas localizações. Algumas cenas captadas em chroma key e recriadas pela The Mill, em pós.
Começava então o quebra-cabeça da edição. Os filmes tinham de ficar simples e claros, sem perder a graça, porque a mensagem precisava ser rapidamente entendida pelo grande público, levando em conta que no Super Bowl, apesar de milhões de pessoas estarem assistindo ao jogo simplesmente pelos comerciais, a maioria está bebendo, curtindo, e não necessariamente 100% atenta ao break.
Filmes finalizados, cópias entregues um dia antes do jogo, todos felizes e confiantes com a campanha, mas a verdade é que ninguém sabia se de fato ela iria funcionar.
Até que o jogo começou. A tensão e a ansiedade no war room com toda a equipe era tão grande que parecia que era a gente entrando em campo. Logo que terminou nosso primeiro comercial, para o alívio de todos, ele já começou a bombar nas redes sociais, com todo mundo comentando e se perguntando se todo comercial que passava era de Tide. Esse momento deixou a equipe eufórica porque não apenas as pessoas tinham captado claramente a mensagem, mas porque agora vinha a parte mais inesperada. Quando entrou o segundo comercial, com Isaiah Mustafa, de “Old Spice”, e David no cavalo, a coisa explodiu. #tidead foi rapidinho pra segunda colocação no trending topic do Twitter, ficando atrás só de #superbowl. No terceiro break, soltamos mais dois: a paródia de Mr. Clean e Budweiser. Depois, no quarto break, o filme final, imitando comercial de remédio. A essa altura a “it’s a tide ad” já tinha virado centenas de memes e viralizou de forma que ninguém jamais tinha imaginado.
Na manhã seguinte, mais uma surpresa: a campanha havia conquistado o Super Clio, o prêmio de melhor comercial do Super Bowl, um sinal claro de que ela tinha agradado não só as pessoas, mas o mercado. Então, viria o D&AD. Apesar de sabermos que a campanha tinha potencial, esse festival é sempre uma incógnita porque o critério é muito alto. A exigência com a relevância da ideia, originalidade, e especialmente o cuidado com o craft em absolutamente tudo é implacável. Quando soubemos que a campanha tinha conquistado dois Lápis amarelos e dois grafites já era uma notícia incrível. Quando veio o Black Pencil, foi algo inexplicável, afinal, talvez seja o prêmio de propaganda mais difícil do mundo, que muitas campanhas altamente brilhantes não ganharam. Para nós, um dos maiores aprendizados que ficaram foi que quando o time da agência se une de verdade ao time do cliente num mesmo objetivo de fazer algo incrível, o trabalho duplica o potencial, abrindo caminho para uma campanha digna de um Black Pencil.