Uma das coisas interessantes a respeito do SXSW é que no final você não pode fazer um resumo do evento. A quantidade e a diversidade de temas, sessões, pitches, painéis e oficinas tornam praticamente impossível que duas pessoas tenham experimentado o mesmo evento: o SXSW é absolutamente customizável e, ainda por cima, você vive o tempo todo a angústia de, no momento em que está sentado no Austin Convention Center, estar perdendo a “melhor” apresentação do festival, que deve estar ocorrendo em algum outro lugar. Por isso, não dá para resumir o evento.

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É muito simbólico que a abertura oficial do SXSW tenha tido a presença do presidente Barack Obama. Essa conversa inicial deu o tom das grandes contradições que a tecnologia e a inovação trazem para a mesa hoje. Como disse o presidente, a tecnologia disruptiva pode fazer o bem, mas em mãos erradas, na mão de terroristas, por exemplo, produz efeito contrário. É algo que os antropólogos já descobriram há muito tempo: a tecnologia é neutra, mas nós não. Somos nós quem, com os “tijolos” da tecnologia, decidiremos se construiremos pontes ou muros. Obama reuniu as melhores cabeças do Vale do Silício para modernizar o governo, o mesmo governo que disputa com a Apple a batalha do século: afinal até que ponto é desejável que um governo, qualquer governo, tenha amplo acesso à nossa privacidade? Contradições que o SXSW não se furtou a discutir.

O painel sobre Self Driven Technology, ou o carro autônomo do Google, reuniu uma das responsáveis pelo projeto na empresa e uma agente da Secretaria de Segurança de Tráfego. Novas contradições e reflexões. Para o Google, o carro autônomo significa acesso e segurança: milhões de pessoas que não sabem ou não podem dirigir terão acesso a esse modelo de deslocamento. Isso significa um oceano azul para a indústria automobilística, imagine o novo mercado que se abre! Para a indústria de seguros, é uma ameaça: as taxas de acidentes de trânsito tendem a ser mínimas. Por que fazer um seguro? Aliás, em um acidente, quem é o responsável? Jerry Kaplan, que falou sobre Robot Armagedon, acha que seu carro será inteligente quando, no trajeto para o trabalho, “decidir” que você precisa pegar uma praia. Muros ou pontes? Talvez, muros e pontes simultaneamente.

Um dos tópicos mais discutidos transversalmente em boa parte das sessões que assisti tratava dos limites e potencialidades da inteligência artificial. Para ficar no tema do carro do Google: o que fazer com os milhares de taxistas que perderão os seus empregos? Lugar-comum das respostas: toda revolução cria novos tipos de empregos, empregos que envolvam eficiência serão substituídos por inteligência artificial, empregos que envolvam criatividade, inventividade e relacionamento humano em nível profundo, como, por exemplo, enfermeiras, serão preservados e terão alto valor.

Um exemplo recorrente: em 1800, cerca de 90% da força de trabalho americana trabalhava na agricultura. Nos anos 2000, esse percentual caiu para 1,7%. Nada diferente do antigo e válido conceito do economista austríaco Joseph Schumpeter: destruição criativa. A tecnologia que criamos transforma o ambiente em que iremos viver. Creio que, em algum momento, falar com humanos do outro lado da linha acabe se tornando um privilégio, quase exótico, de alguns clientes abastados.

Mas inovação nem sempre tem a ver com uma tecnologia disruptiva, inovação tem a ver com a resolução de um problema de forma única, como antecipar desejos, com a criação de momentos mágicos, com o design de experiências. O caso da Story, uma loja que se reinventa totalmente a cada duas semanas, que se entende mais como um canal de mídia do que como uma loja. É um exemplo de como romper a monotonia do varejo inspirando-se no modelo das startups.

Uma das coisas mais interessantes do SXSW são os pitches, um formato no qual empreendedores têm alguns poucos minutos para convencer investidores a colocarem algum dinheiro em seu negócio. É absolutamente eletrizante e inspirador assistir às apresentações relâmpago.

E por falar em startups, esse foi o recado de Cris Roan, VP de business development da Mother. A agência tem reservado uma parte do seu resultado para investir em startups, entrando em diversos tipos de negócio, desde que estejam relacionados ao mundo da criatividade. Há algum tempo, empreender em propaganda significaria lançar mais uma nova agência. Acontece que as agências não compartilham a cultura das startups de tecnologia. Abre-se um novo e instigante campo para o empreendedorismo na comunicação.

Flavio Cordeiro é sócio e diretor da Binder