Há 18 anos eu entrei numa agência pela primeira vez.
Como eu não conhecia ninguém, eu admirava todo mundo.
Achava todo mundo incrível. Criativo. Brilhante. Sem distinção a cargos, senioridade ou posição hierárquica. Era muito simples: se uma agência de propaganda te empregava, com certeza você era uma pessoa especial.
Eu não sabia absolutamente nada sobre as agências de propaganda. Mas era obcecado por propaganda – que eu via na TV, na Veja, na Placar e na Folha.
E tudo o que a W/Brasil, a DM9, a DPZ, a Almap, a F/Nazca e a Y&R faziam na época me fizeram ter essa visão tão elevada de todas as pessoas dentro de todas as agências.
Aos poucos eu fui observando que nem todo mundo era incrível, criativo e brilhante. Também fui aprendendo que o Washington, o Nizan, o Marcello, o Valdir, o Aragão, o Fábio, esses sim, de fato, eram. Foi o trabalho deles que fez com que eu quisesse fazer a mesma coisa: inspirar outras pessoas.
Querer inspirar outras pessoas é o que me faz ir para a agência todo dia de manhã. Em retribuição ao que o inspirador trabalho de outras pessoas me fez e faz sentir.
“Eu trabalhava numa bakery e fui mandado embora. Quando isso aconteceu eu fiquei obcecado pela ideia de fazer o melhor pão do mundo. Para fazer o melhor pão, eu precisava do melhor trigo, foi aí que mudei para um sitio que a minha avó tinha no norte do estado de NY, para plantar o melhor trigo para fazer o melhor pão. Foi aí que descobri que, para plantar o melhor trigo, precisava do melhor adubo, então comecei a criar cabras. E para ter as melhores cabras para ter o melhor adubo para ter o melhor trigo para fazer o melhor pão, eu precisava alimentá-las com os melhores vegetais. E isso me fez criar uma horta.”
Esse é o começo da carreira do chef americano Dan Barber, do Blue Hill, uma história muito inspiradora contada numa série original Netflix muito inspiradora chamada Chef’s Table. São seis episódios. Todos fantásticos.
Damon Lindeloff criou Lost há uma década. E ano passado ele criou The Leftovers, uma série da HBO que faz pouco sucesso, mas é incrível.
Parte da premissa inverossímil de que 2% da população mundial simplesmente desaparece, deixando os outros 98% completamente perdidos, buscando explicação para o que aconteceu. Os diálogos, a profundidade dos personagens, a história e a fotografia são incríveis.
Hudson Valley, NY.
NY é a cidade mais inspiradora em que eu já estive. O Brooklyn é o coração – e o cérebro – da cidade. Há alguns anos os melhores restaurantes, bares, lojas e museus de NYC estão no Brooklyn. E por isso o interesse pelo borough aumentou e, com isso, também aumentou e muito o preço dos imóveis. Muitos artistas, escritores, designers, chefs, fotógrafos, marceneiros etc. estão saindo de NYC e mudando para o Hudson Valley, que fica a cerca de duas horas da cidade e beira o Rio Hudson, onde cidades como Beacon, Millerton, Millbrook, Hudson, Copake e outras hoje têm galerias de arte, lojas de móveis artesanais, destilarias de pequena produção e restaurantes excelentes. Tudo feito com um nível de craft altíssimo, com atenção ao design e cuidado com todos os detalhes.
Séries de TV, comida, lojas e a história de vida de outras pessoas. O que me inspira, na maioria das vezes, não se transforma em trabalho. Mas se transforma em vontade de trabalhar.
Boa segunda-feira.
Icaro Doria, CCO da DDB NY, especial para o PROPMARK