Quem jamais se arrependeu, levante as mãos. Quem se arrependeu várias vezes, permaneça como está. No livro de Lilian Hellman, e maravilhoso filme, Julia, Jane Fonda + Vanessa Redgrave, a primeira palavra do livro, e do filme, é a mesma: pentimento. Sentimento que levava pintores arrependidos, a pintar nova obra sobre a original. E, anos depois, quando, por alguma razão, o quadro começava a descascar, via-se o fundo e descobria-se a obra ou manifestação original. E, assim, o pentimento de terem sufocado e escondido a própria obra…
Desde que os pioneiros, que ingressaram no Orkut por ocasião de seu lançamento, 24/01/2004, que chegou a ter mais de 30 milhões de usuários brasileiros, e foi descontinuado em 30/09/2014, ou dos que se iniciaram pelo Facebook, de 28 de outubro de 2003 – portanto, diferentemente do que muitos alardeiam, três meses antes do Orkut, com a denominação de Facemash, mas já sob a liderança e inspiração do universitário bullinista e espírito de porco, Mark Zuckerberg, e seus sócios originais, o brasileiro Eduardo Saverin, mais Chris Hughes e Dustin Moskovitz, as duas maiores redes sociais até hoje… Enquanto o Orkut escalava e se arrebentava pelo mundo, o Facemash restringia-se aos alunos de Harvard e, mais adiante, aos de outras universidades americanas. Quem saiu com quem, quem comeu quem, e por aí ia ou foi… Diante do crescimento e sucesso do Facemash, Mark Zuckerberg trancou-se em seu alojamento na universidade de Harvard e, em janeiro de 2004, de próprio punho e computador, começou a escrever o código do sucessor do Facemash. Não mais para universitários, para o mundo, o The Facebook. Nunca mais ninguém parou para pensar e muito menos arrepender-se.
Assim, duas frases. Primeira: “escreveu, não leu, o pau comeu”. Mesmo que tempos depois o autor da manifestação tenha se arrependido. Mas, pelos cânones e costumes prevalecentes na internet até hoje, tudo por lá permanece e fica registrado, a menos que os arrependidos corram atrás e se esgoelem para conseguir apagar. Segunda: atribuída a Chico Xavier: “Você não pode voltar atrás e fazer um novo começo, mas você pode começar agora e fazer um novo fim…”. Mais alguns meses e, finalmente, seremos donos das nossas manifestações passadas. E a nosso critério, quando decidirmos, poderemos apagar ou mudar pensamentos expostos publicamente no ardor de nossa juventude, ou na pourralouquice de nossas irresponsabilidades. Quando? Quando a novíssima LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados, já aprovada e sancionada, entrar em campo pra valer. Enquanto isso… O comediante Kevin Hart, por unanimidade, fora escolhido para apresentar o Oscar…
Porém, alguém bisbilhotou seu passado nas redes e na internet e descobriu manifestações suas inequivocamente homofóbicas. Nick Vallelonga, cotado para o Oscar de melhor roteirista, acabou vencendo por Green Book, preferiu apagar seu perfil na rede antes que fosse linchado por suposta manifestação de racismo. O novo presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, era muito conhecido por seus amigos pelas piadas machistas recorrentes que publicava em suas páginas no “Feice”. Assim que foi escolhido, operação apaga. Woody Allen, até hoje, permanece com seu último filme, A Rainy Day in New York, trancado na gaveta da Amazon, que o produziu, pelas alegações que se multiplicaram nas redes sociais, a partir de apenas uma denúncia. De uma artista com traços indissimuláveis de desequilíbrio, Mia Farrow, que o acusa de ter molestado a filha adotiva dela e do maestro André Previn no início dos anos 1990. Assim, a novidade daqui para frente, quando a Lei Geral de Proteção de Dados valer, o “pentimento”, poderá ser exercido de forma natural e recorrente, sem a necessidade de medidas extremas, como a do presidente do Banco do Brasil a quem só restou deletar sua página no “Feice”. E você já começou a relacionar o que pretende apagar de suas caminhadas pelo digital…? Ou prefere enfrentar tudo o que escreveu e como se manifestou em momentos de fortes e intensas emoções?
Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)