A LGPD traz desafios, mas é importante e necessária (Crédito: Scott Graham/ Unsplash)

O recente vazamento de dados, envolvendo mais de 223 milhões de CPFs, chamou a atenção dos brasileiros sobre a importância da segurança nas plataformas digitais. Aprovada em 2018, e em vigor desde setembro de 2020, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) já vem sendo implementada nas empresas e terá multas e punições a partir de agosto de 2021. 

Segundo Caio Cunha, presidente da WSI Master Brasil, é importante que ao solicitar alguma informação do cliente, as marcas especifiquem o que vai ser feito com as informações obtidas. “Quando os dados chegam, são armazenados em um banco de dados. Se o cliente não autorizar a empresa a mandar e-mails, por exemplo, não pode usar aquele dado para isso e tem que ser segmentado para outro fim. A lei abrange aspectos que vão desde o ato de atrair seu público pela internet para disponibilizar dados, que pela nova lei são tidos como confidenciais, coletar e reter esses dados para fins diversos, como campanhas de e-mail, envio de ofertas ou outros, até regras de manuseio desses dados pelos funcionários das empresas. E o proprietário dos dados tem direito de conceder ou não autorização, podendo, a qualquer hora, mudar de ideia e limitar o acesso, se assim desejar”, revela.

Caio Cunha, presidente da WSI Master Brasil (Crédito: Divulgação)

Ainda segundo o executivo, tanto o controlador, que na lei é o proprietário da empresa ou dos dados, quanto o processador – frequentemente uma terceira pessoa ou empresa, como no caso de consultorias de marketing digital, devem estar à disposição para esclarecer quaisquer solicitações do consumidor. “Quem manuseia essas informações são os funcionários, eles também têm que aderir à lei. Recomendamos sempre que nossos clientes falem com o departamento jurídico para cumprir com a lei e damos algumas orientações, mas não podemos responder pela lei na sua totalidade. Quando um cliente fornece informações, orientamos nossos funcionários, criamos uma política de educação sobre a lei para eles aderirem, principalmente, quando novos colaboradores entram na empresa. No que tange à marketing, com referência ao controle dos dados, nós atendemos”, ressalta Cunha. 

Impacto na análise de dados

Nos últimos anos, agências e anunciantes investiram em departamentos de business intelligence, analytics e big data para entender a trajetória dos consumidores. Porém, se as pessoas começarem a não autorizar o uso de seus dados, as empresas terão mais dificuldades em entender os seus comportamentos.

“A LGPD traz desafios, mas é importante e necessária. Como empresa já estamos nos adaptando, até porque como uma marca internacional já temos que respeitar a Lei Europeia. Será mais desafiador entender comportamentos, agrupar ou identificar grupos. Por outro lado, a necessidade de convencer as pessoas a dividirem seus dados é uma oportunidade para o mercado. Primeiro, porque nos faz pensar em onde queremos chegar, e mais clareza anda junto com melhores resultados. Além disso, quando precisamos olhar as pessoas no olho, explicar por que queremos aquela informação e ser transparentes sobre como vamos usá-la, temos a chance de construir uma relação de confiança desde o início”, comenta Renata d’Ávila, CSO da FCB Brasil.

Renata d’Ávila, CSO da FCB Brasil (Crédito: Divulgação)

A executiva ainda destaca que é preciso repensar a forma como são coletados os ‘first party data’ e como são construídos os pipelines de captação e processamento de informações. “Já vemos muitas empresas investindo na construção dessa relação. Também vemos o esforço das grandes plataformas para garantir essa visibilidade dos comportamentos através de estudos, novas metodologias e novos usos de tecnologia. Acho que 2020 mostrou que a pressão e necessidade aceleram a inovação, e esse será mais um capítulo de desenvolvimento da nossa indústria”, diz.

O presidente da agência VMLY&R, Fernando Taralli, relembrou que nas últimas semanas, Tim Cook, o CEO da Apple, foi muito contundente em sua visão sobre a proteção e gestão de dados. “Acreditamos que as empresas têm uma excelente oportunidade de gerar valor na obtenção de dados first-party, ou seja, de seus clientes e através das melhores práticas do CRM, usar o meio digital para aumentar LTV. Usaremos modelos estatísticos para gerar conhecimento através das amostras de dados compartilhados, já que o número de usuários compartilhando vai diminuir”, ressalta.

Fernando Taralli, CEO da VMLY&R (Crédito: Divulgação)

Em um primeiro momento, a LGPD pode parecer que trará um impacto negativo para as empresas, mas isso não é real. Na realidade, ela deve trazer novas oportunidades para que os profissionais possam trabalhar melhor as suas relações com os consumidores.  

“Sem dúvida, será mais difícil entender comportamentos. Mas o desafio não é de data apenas. É um desafio da relação, pois aqui a tecnologia, os dados e a postura de marca se cruzam de forma muito interessante. As pessoas só vão autorizar o uso de seus dados se realmente virem algo de relevante no relacionamento que uma marca estabelece com seus consumidores. Se for um relacionamento exclusivamente de ‘push and pull’, onde a marca grita ofertas o tempo todo ou estabelece um diálogo irrelevante e pouco interessante, provavelmente essa relação será subavaliada. Afinal, como em qualquer relação, por que eu permitiria mais intimidade se nada que vem dali me interessa? Faz tempo, falo a meus clientes, que não estamos em uma batalha por audiência e sim por atenção. A audiência você compra, programa, analisa resultados e reprograma. Mas a atenção depende da qualidade do diálogo com seus consumidores”, comenta Fernando Diniz, Chief Strategy Officer da DPZ&T.

Fernando Diniz, Chief Strategy Officer da DPZ&T (Crédito: Divulgação)

A managing director da Ogilvy Consulting, Alessandra Dal Bianco, ressalta que há pelo menos dois anos está trabalhando com os seus clientes nessa empreitada. “Contamos com um escritório de advocacia especializado, empresa do Grupo WPP que nos apoia em todas as iniciativas com treinamentos e trocas de melhores práticas”, diz.

A executiva ainda enfatiza que a escolha de parceiros de dados é um fator muito importante no processo. “Apoiamos nossos clientes através de uma análise rigorosa e comparativa de possíveis parceiros de dados. Devemos escolher provedores que garantam que os dados são legítimos, ou seja, que atendem aos requisitos de responsabilidade sobre a Lei Geral de Proteção de Dados e que devem contratualmente se responsabilizar por eles. As empresas devem exigir isso. Com clareza e responsabilidade, entendemos que as práticas da LGPD são um desafio contornável para aqueles que implementarem as melhores práticas, protegendo suas empresas e preservando a privacidade de seus clientes, que não irão se opor a informar seus dados em troca de benefícios e ótimos negócios com a sua empresa”, finaliza.  

Alessandra Dal Bianco, managing director da Ogilvy Consulting (Crédito: Divulgação)