Não me lembro de outro “enfant gâté” tão superlativo no mercado financeiro do país. E olha que acompanho esse mercado desde a Lei da Reforma Bancária e a Lei do Mercado de Capitais. Com todas as honras e merecimentos chegou lá. Nesta semana passou a integrar a lista dos 20 bilionários brasileiros da revista Forbes, com um patrimônio avaliado em US$ 3 bi, e à frente dos irmãos Joesley e Wesley, US$ 2,6 bi; e Abilio Diniz, US$ 2,3 bi. “Às 11h48 do dia 29 de outubro de 2013, a revista Exame, que hoje pertence ao Pactual, publica entrevista concedida a Carolina França. Da entrevista o momento em que ele, Guilherme Benchimol, e seu sócio, Marcelo Maisonnave, romperam com a dúvida tautológica – as pessoas não investem porque não sabem ou não sabem por que não investem” – e decidiram ensinar novos e futuros investidores.

Filho de cardiologista, Guilherme estudou economia, foi trabalhar numa corretora e em 2001, na crise, quase foi demitido. Conheceu o dono de uma corretora em Porto Alegre, aceitou um convite de trabalho e mudou-se para a cidade. Lá conheceu Marcelo Maisonnave e decidiram sair. Alugaram um pequeno escritório, convidaram dois estagiários, Tiago e Ana Clara, que embarcaram na aventura. Tiago saiu, e Ana virou sócia da empresa. A XP Investimentos não decolava. Pensando em desistir, amigos de Marcelo pediram aulas para aprender como investir em ações. Primeira turma 20 pessoas; segunda, 30; que iam convertendo-se em clientes. Do Rio Grande do Sul para Santa Catarina, para o Paraná e chegando a São Paulo. 2007, 30 filiais. No meio tempo, os dois sócios e amigos constituíram famílias, tiveram filhos e Marcelo decidiu sair. Em seu livro, que acaba de lançar, explica: “O modelo da XP não é o modelo mais atual, baseado em transparência em um jeito novo de investir, sem conflitos de interesse…”.

Em 11 de maio de 2017, o Itaú compra 49,9% do capital da XP por R$ 5,7 bi. O mesmo Guilherme, que na publicidade da TV chamava os clientes dos bancos de – no mínimo ingênuos, ou trouxas – recomendando a todos que “desbancarizassem”, assim como os gerentes desses bancos, que parassem de trabalhar para os bancos e passassem a trabalhar para eles mesmos, e, claro, na XP… O apóstolo da “desbancarização”, bancarizou! E mesmo depois da sociedade com o Itaú não parava de desancar os bancos: “não conheço nenhum gerente de banco que seja feliz…”. Não foi por falta de aviso. Antes da compra dos 49,9% do XP, todos os que foram consultados pelas famílias acionistas do Itaú recomendavam cuidado com a impulsividade e o gênio de Guilherme. E sempre se referiam à história do sapo e do escorpião… Mas foi um ótimo negócio. O Itaú multiplicou algumas vezes o investimento que fez. Mesmo tendo a lua de mel entre os sócios durado apenas poucas semanas. O que é um ótimo negócio?…

No meio do caminho, vendo seus agentes serem assediados pelo Pactual, o XP decidiu criar obstáculos para que saíssem. Foi denunciado no Cade por seu concorrente por “atos com o claro objetivo de impedir que os agentes autônomos migrassem para outras plataformas, prejudicando a desejada e salutar concorrência.” Rigorosamente o mesmo que fez com os grandes bancos e durantes anos… Finalmente, cansado de ser tripudiado pelo sócio XP, e precisando dar uma resposta para seu capital humano, o Itaú decidiu sair no braço via propaganda. Guilherme ensandeceu e subiu o tom na resposta. Há duas semanas não se fala em outro assunto em sucessivas reuniões do Itaú. Nas principais famílias de acionistas – Vilella, Moreira Salles e Setubal, o sentimento é de indignação. Bombeiros de plantão tentam apagar o incêndio. Enquanto outras pessoas se lembram da história do sapo e do escorpião, ou do provérbio espanhol, “cria cuervos y te sacarán los ojos”. É muito dinheiro e acabarão se acalmando. Mas, desta vez; trincou sem chances de colar, novamente. Fica a lição. Por melhor que seja um negócio, em termos financeiros, vale a pena ser sócio de pessoas com propósitos e princípios mais que diferentes antagônicos?’

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)