Está aberta a temporada de caça aos eleitores. Dezenas de milhares de candidatos estão nas ruas e, principalmente, nas redes sociais em busca de votos. Com restrições fortíssimas ao trabalho de rua, quem concorre a uma vaga nas Câmaras Municipais ou pretende chegar à Prefeitura está contando principalmente com o poder de alcance das redes sociais. É na telinha do computador que o eleitor vai se informar sobre quem são e o que pensam os candidatos de sua cidade. Uma experiência ainda não vivida por ninguém, seja candidato ou eleitor. A internet já vinha ocupando o espaço das outras ferramentas eleitorais, mas com a pandemia do coronavírus o papel da internet cresceu a ponto de se situar, hoje, como o mais influente dos meios para atingir o eleitorado.

O santinho de papel, a faixa, o abraço, as visitas, os comícios são meros complementos ao poder das redes. É lá, entre milhares de outros apelos, que os candidatos vão tentar atrair a atenção e ganhar votos. Mesmo em situações onde são possíveis outros meios de atingimento, as redes sociais exercem um papel definitivo, como reforço às convicções ou de influência aos indecisos. Mas, vivo repetindo, sou velho. Já passei por todo tipo de campanha. Já organizei showmícios que atraiam dezenas de milhares de pessoas, como já destruí meu estômago bebendo centenas de xícaras de café servidas nas casas de eleitores. Acho que já tenho nas costas muitas centenas de horas criando e produzindo materiais para os horários de propaganda eleitoral em rádio e televisão. Hoje, com o freio de estacionamento meio puxado, pretendo trabalhar menos, atendendo um número menor de candidatos e me restringindo a consultorias que exigem menos tempo.

Mas não nego que tenho saudade das velhas campanhas nas ruas, no corpo a corpo. Vai ver que tenho mais saudade de mim mesmo, que conseguia passar muitas noites sem dormir, comendo sanduíches e ainda assim me sentir bem disposto. Histórias como a do Fausto Wolff, um jornalista conhecido no Rio de Janeiro, engraçadíssimo, cultíssimo, amigo de todo mundo. Pois Fausto, tentando ser eleito vereador, panfletava na Avenida Atlântica, entregando aos passantes um santinho com sua plataforma, trocando meia dúzia de palavras. Pois lá vinha o Fausto andando quando cruzou com um provável eleitor. Deu-lhe o santinho, pediu apoio e teve de ouvir uma cantilena do cidadão, reclamando dos políticos, de todo mundo. Como voto é voto, Fausto se muniu de paciência e deu trela, tentando argumentar. Mas o cara, verdadeiro mala, não parava.

Juntou gente para ouvir, o que aumentou a sanha reclamativa. Encheu tanto o saco que chegou uma hora que Fausto tirou o santinho da mão do eleitor e sentenciou: “quer saber de uma coisa? Enfie seu voto no cu!”. Perdeu a paciência, o voto e mais tarde a eleição. Outro momento histórico de sinceridade foi quando uma emissora de rádio, se não me engano de Campos, entrevistou candidatos a vereador, fazendo todo dia apenas uma pergunta. Teve uma vez que a pergunta era: “Qual é o seu sonho?”. Dá para imaginar a coleção de besteiras e lugares comuns: “um mundo sem guerra”, “paz para todos”, “a vitória do amor”. Até que chegou a vez do Ferrugem, figura conhecidíssima, que respondeu: “Eu sonho que estou voando, principalmente quando vou dormir de cara cheia”.

Aliás, outra rádio campista entrevistou o então presidente da Academia Brasileira de Letras Austregésilo de Athayde e o repórter três vezes chamou dr. Athayde de Astrogildo. Doutor Austregésilo foi tocando, para não humilhar o entrevistador. Até que para encerrar o radialista disse “agora uma última pergunta ao grande intelectual Astrogildo de Ataúde”. Neste momento, do alto de sua condição de presidente da ABL e imortal de carteirinha, dr. Austregésilo pega o microfone e diz: “Astrogildo tudo bem… mas Ataúde é a puta que lhe pariu!” Ouviu-se a risada até de Machado de Assis.

Lula Vieira é publicitário, diretor do Grupo Mesa e da Approach Comunicação, radialista, escritor, editor e professor
(lulavieira.luvi@gmail.com)