Pois é, meu filho, o que lhe dizer sobre a dor que você está sentindo?
Confesso que a primeira vontade é lhe contar que eu sei exatamente o que lhe passa pela cabeça. Ainda me lembro perfeitamente do tempo que uma briga de namorados doía dessa forma. Por mais que não lhe pareça, um dia eu também já quis morrer e tive a mais absoluta certeza de que a vida não valia a pena a cada crise de amor.
Tenho até muita vontade de lhe garantir que, por mais intenso que seja seu sofrimento, daqui a pouco você vai esquecer dele. Mas este é o tipo de experiência que não se transfere, que cada um precisa aprender como conseguir sobreviver a cada golpe sujo da vida por sua própria conta.
Nem ombro amigo de pai resolve, eu sei, até porque pai é pai e amigo é amigo, e existem abismos intransponíveis entre um pai e um filho numa hora dessas. Acredite que se eu pudesse transferiria essa tristeza para mim, que já tenho tantas e estou mais acostumado.
Mas, tal como certos convites, este tipo de ferida é pessoal e intransferível. Sou incapaz de encontrar palavras que possam servir realmente de consolo. Aliás, nestas horas, quando é preciso saber dizer coisas que amenizem tristezas, sou verdadeiramente um desastre.
Uma vez, quando eu lembrei ao meu sócio Marcelo Martinez, numa circunstância mais ou menos parecida, que as grandes dores pelo menos ajudam a crescer, ele me perguntou: “E quem disse que eu estou querendo crescer?”.
Fiquei sem resposta, como agora, pouco mais podendo fazer do que oferecer minha solidariedade que, por sinal, não vale coisa nenhuma. Também estou perplexo com a velocidade do tempo. Até ontem, até ontem à tarde, segundo me parece, tudo que eu precisava fazer por você, para acabar seus sofrimentos, era prometer um presente, às vezes nem isso.
Já houve época em que bastava acender a luz do seu quarto, meu filho, para que tudo que lhe fazia mal fosse embora. Já tive muito mais importância em sua vida, fui muito mais poderoso contra seus fantasmas e passei algum tempo achando que as coisas poderiam ser sempre assim.
Eu fico um pouco feliz em perceber que você é dono de sua própria vida e de seus amores, mas também me cresce este sentimento de desimportância, um certo prenúncio de fim de tarefa. Não é fácil perder o poder mágico de transformar o rosto de um filho do pranto para o riso, num simples gesto de afeto.
A vida é complicada, garoto, e junto a uma porção de lições desagradáveis que você está tendo, vem também a dura descoberta de que seu pai está ficando cada vez mais dispensável. Matar o pai herói, dar-lhe dimensão humana e manter ternura, mesmo após a descoberta de suas fraquezas, mesquinharias e pequenez, é um ato de generosidade.
Uma prova de que sobrou amor. Sei que o que vou lhe dizer é inútil, não só agora, como deverá ser por muito tempo. Mas estou sentindo uma enorme saudade da imensa, da enlouquecida, da tremenda dor do rompimento com minha primeira namorada.